quarta-feira, 28 de abril de 2010
Hospital Virtual
Nova crónica de António Piedade, saída antes no "Diário de Coimbra":
O ensino à distância, ou não presencial, não é uma novidade fruto da internet. De facto, o envio de conteúdo com objectivos pedagógicos de um emissor, normalmente um professor ou um detentor de conhecimento (sábio?), para um aprendiz, é algo muito antigo e comum à própria vida.
Muito antes de termos sido capturados pela rede da World Wide Web, já ensinávamos /aprendíamos através de navegantes ou galopantes cartas manuscritas, de livros que chegavam fumegantes em comboios vaporosos. Alguns de nós deve lembrar-se da telescola e das aulas televisionadas da Universidade Aberta, nas quais professores utilizavam novos suportes multimédia para ensinar “hertzianamente”, desde sala de aula até para o sofá lá de casa. Também foram comuns, em tempos idos, os cursos por correspondência. Nestes, o aluno recebia por correio material pedagógico que utilizava para estudar, a que se seguia o envio de um exame feito sozinho, num apelo à honestidade e probidade intelectual para o próprio avaliar se tinha aprendido.
Actualmente, a World Wide Web veio encurtar tempos e iludir distâncias, permitindo uma interactividade quase, se não mesmo, em tempo real, entre professores e alunos afastados quilométricas distâncias. Actualmente, são inúmeras as aulas, cursos, seminários (“WebSeminars”) transmitidas em tempo real (a instantaneidade só depende da largura de banda disponível) que enchem o ciberespaço pedagógico.
Talvez este seja uma dos aspectos democratizantes da World Wide Web no que ao acesso ao conhecimento diz respeito: disponibiliza-se conhecimento e capacidade validada pedagogicamente para o transmitir, com a didáctica possível e ajustada a esta nova realidade, por um professor em qualquer parte instalado e a este conhecimento têm acesso os alunos, aprendizes curiosos, interessados e ou aceites, consoante o modelo estabelecido.
Até aqui, quase nada de novo. Só foi mudando o veículo de transmissão da informação: do suor dos cavalos diligentes às sucessivas reflexões na fibra óptica transoceânica.
Mas desde que o universo cibernáutico deu “à luz” o território “bítico” conhecido por “Second Life” algo tem vindo a mudar neste paradigma. Há cerca de dois -três anos, a prestigiada universidade inglesa Imperial College de Londres, mais precisamente a sua Faculdade de Medicina, começou a investir seriamente no desenvolvimento e implementação de um Hospital Universitário Virtual (aqui), para permitir uma experiência clínica mais “intensa e envolvente”, quer quantitativa, quer qualitativa, entre os futuros médicos e um infindável número de doentes virtuais, mas representantes fiéis de situações clínicas reais (aqui). Numa réplica fidedigna da Faculdade de Medicina e Hospital Universitário, os estudantes (de medicina e de enfermagem) interagem com doentes virtuais em cenários que reproduzem os reais, o que lhes permite fazer uma ponte entre a experiencia virtual e a realidade física onde irão exercer medicina, com pessoas que só morrem uma vez.
Mas este não é o único hospital virtual no Second Life como se pode verificar aqui .
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2 comentários:
Eu não conheço doentes virtuais. Em mais de 30 anos de prática médica nunca encontrei um doente virtual. Isto deve ser uma alucinação pedagógica. Admito até que a Faculdade de Medicina do Imperial College esteja a implementar este projecto como um suplemento meramente humorístico da actividade académica normal. Ou então antecipa a derrocada definitiva do ensino médico no Reino Unido,que se prenuncia há pelo menos duas décadas.
Daniel de Sousa
Está de facto a decorrer uma avaliação na Faculdade de Medicina do Imperial College (cujas conclusões estão no prelo Toro-Troconis, M., Meeran, K., Higham, J., Mellström, U., Partridge, M. (2010). Design and delivery of game-based learning for virtual patients in Second Life®: initial findings. In Peachey, A., Gillen, J., Livingstone, D., & Robbins, S. (Eds), Researching Learning in Virtual Worlds UK: Springer, in press), sobre as desvantagens e os benefícios efectivos para a aquisição de competências clínicas (relação médico - paciente) adquiridas através da experiência de ensino/aprendizagem/treino/simulação no second Life.
Parece que o Imperial College investiu cerca de 700 milhões de libras neste projecto e, naturalmente, os gestores precisam de saber que o esforço financeiro em "construir e manter" instalações virtuais se traduz num incremento na qualidade da relação médico/cliente.
A ver vamos. Mas, não tenha muitas dúvidas: estamos na fronteira ou a viver uma transição paradigmática no ensino médico.
Cumprimentos
António Piedade
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