quinta-feira, 29 de abril de 2010

"Caos nas salas de aulas": Escola 3

Texto na continuação de dois antes aqui publicados.

Nesta escola a professora, que através da BBC realizou o documentário Classroom Chaos, confronta-se com duas medidas terríveis de combate à indisciplina: arame farpado e polícia no recinto escolar. No excerto que, a seguir se transcreve, não se refere, no entanto, que muitas escolas londrinas, recorrem também a medidas que já nos são familiares: câmaras de filmar e detectores de metais.

Esta é a via pela qual estamos a enveredar no Ocidente: transformamos as crianças e os jovens em prisioneiros de cadeias de alta segurança, que, paradoxalmente, deixamos que funcionem de modo anárquico. Não podemos deixar de perceber que as crianças e os jovens ficam entregues uns aos outros, vingando a força e, em muitos casos, a crueldade, mas, ainda assim, não cuidamos que conheçam e cumpram as regras de convivência social mais elementares. Até quando continuaremos a repetir o slogan “ideologicamente correcto” mas falacioso, de que eles se auto-orientam e descobrem, por si mesmos, essa regras?

As linhas que se podem ler de seguida conduzem-nos a interrogação em que temos insitido neste blogue: onde nos conduzirá a nossa demissão de educar e de ensinar?

"Estou a caminho da minha próxima escola. Reparem, o que posso esperar de uma escola cercada por muros com arame farpado? Esta escola é de grande dimensão, com 1200 alunos, e fui chamada para duas aulas de Estudo e Comunicação com uma turma de alunos de 15 anos, numa sala de informática bem equipada. Neste emprego, todos os dias há uma surpresa nova, e hoje não foi excepção.

Professora: Então rapazes? Não devem trazer bebidas para a sala de aula! Sabem disso.

Eles conhecem as regras de uma sala de aula, estão escritas em todo o lado: nada de comida na sala. Mas, mesmo assim, abrem descaradamente os pacotes de batatas fritas, como se quisessem chamar a atenção.

Professora: Já te pedi para guardares a comida, e não estava a brincar.

Fica-se com a impressão de que estão a desafiar-nos, do estilo “vamos ver até onde vai, stôra”.

Professora: Endireitem os monitores e acabem com a palhaçada. Não vão entrar no eBay, nem ver o sítio do Arsenal…
Aluno: Não vamos fazer nada disso.
Professora: Não vamos fazer isso. Se apanhar alguém a fazer isso, vai logo para a rua.
Aluno: Stôra, porque não se senta e aproveita para ‘tirar uma soneca’?
Professora: Não me vou sentar nem ‘tirar uma soneca, porque quero ter a certeza de que aprendem.
Aluno: Que m… é esta?
Professora: Desculpa, o que é que disseste?... Até parece que estamos na cabeleireira. Não te importas de parar de mexer no cabelo?
Aluna: Um segundo… ela está mesmo mal!
Professora: O que está a fazer nesse sítio?

Reparei que tinha escrito “sexo anal” na página do Google.

Aluno: Sim, acabei de escrever “sexo anal”, não é? Sim, porque eu…

Professora: Sabes uma coisa? Vais já lá para fora! Já pedi para te virem buscar e para te levarem para outra sala.

Alguns minutos mais tarde, um agente da autoridade entra na sala de aula, perguntando se pode dar-me uma palavrinha. Fiquei a saber que era um agente da Polícia Municipal. Queria confirmar comigo o tal incidente. Pareceu-me um bocado excessivo chamar-se a Polícia por causa de alguns rapazes daquela turma. Afinal, ele era o agente residente daquela escola. Nunca tinha ouvido falar em tal coisa. Era novidade para mim. Na realidade, em Abril de 2005, há 260 agentes de serviço, a tempo inteiro, nas escolas inglesas. Não é chocante? Só passei um dia naquela escola e tive problemas com quase todas as turmas.

Escola 3: A avaliação disciplinar é boa. Os alunos mais novos não sabem ser disciplinados (Março de 2004).

(CONTINUA)

3 comentários:

joão boaventura disse...

Talvez se vislumbrem na 1.ª edição do disponível volume, de leitura imediata, Best School, editado o ano passado, e onde se explica “how to use the tipping point to design a best school na action research discovery".

Entretanto James Gleick, pela editora Gradiva, edição de 1939, publicou "Caos. A construção de uma nova ciência", possivelmente a caologia, mas desconheço em que grau de adiantado esclarecimento se encontra, para poder fornecer as respostas desejadas nesta matéria.

A indisciplina numa sala de aula não é mais do que um jogo, em que o aluno experimenta o professor, e se este cede, aquele ganha. Quando fui professor no Liceu Camões, o reitor tinha esta teoria: "O mais teimoso é que ganha". E tinha dito tudo.

O que se passa hoje nas escolas é a teoria dos jogos onde os alunos ganham. Todos eles são cópias do Mourinho.

joão boaventura disse...

Também entre nós há quem se tenha debruçado sobre o caos.

Para entender o mundo que passa à nossa frente, como um filme, não será despiciendo folhear.

Eduardo Loureço
O Esplendor do Caos
Gradiva, 2007 (5.ª edição, a que tenho)

Unknown disse...

Só se aprende aquilo que desperta interesse... sabemos aquilo de que gostamos!

Logo, de que modo é possível atrair a atenção e tornar apelativo o ensino das tais matérias obrigatórias?

E claro que há muito mais do que a teimosia, esse é aliás um sintoma de que se está a seguir pelo caminho errado.

A indisciplina, a violência ou o caos no ensino são apenas o sintoma... meaning, this is NOT the way!

Deveras, paradoxalmente esse caos é até um óptimo sinal, pois só assim se pode mesmo forçar o fim de um sistema moribundo e cadavérico... já não há desfibrilhador que o salve!

Ora então, por que razão não se fala mais das experiências BEM sucedidas, meaning... o que tem a Ponte ou o método Waldorf (e outros) de tão melhor?!

Avaliar o quê e para quê, se SÓ o próprio aluno é senhor do seu saber? Ainda assim, finalmente já algo começa a penetrar na escuridão de um ensino que permaneceu durante tanto tempo imóvel e sem se renovar... está na hora de o matar!!! :)

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