sexta-feira, 23 de abril de 2010

A nuvem


Como vem sendo habitual, destacamos do "Destak" de hoje a crónica semanal de José Luís Pio de Abreu:

Paira sobre a Europa uma nuvem que ninguém quer ver. Não é a primeira vez. Quando Hitler subiu ao poder, até tinha apoio popular. As elites germânicas – e também as europeias – estavam mais preocupadas com brigas paroquiais, enquanto as pessoas desesperavam com a instabilidade política e a crise económica.

Não viram a nuvem. A anexação da Áustria foi pacífica, e pouca gente se importou com isso. Até os judeus ricos pensavam que o mal só acontecia aos pobres. Quando Hitler invadiu a Polónia, já era tarde. Depois, foi o que se viu.

A nuvem do século XXI já invadiu a Grécia, um pequeno mas simbólico país que, pelos vistos, interessa a pouca gente. A Europa, liderada pelo governo de direita alemão, parece insensível. Talvez o mal só atinja os pobres gregos, definitivamente entregues nas mãos dos especuladores financeiros. Até podem sair do Euro. Se o fizerem, porém, arrastarão, um a um, os outros países.

Os europeus vivem hoje apinhados em meios urbanos e dependem da organização pública para a satisfação das mais básicas necessidades. O fim do Euro traria uma instabilidade de consequências imprevisíveis mas seguramente calamitosas. Com a calamidade à porta, ninguém se importa, por enquanto, preferindo discutir as mais variadas irrelevâncias.

Mas esta história também não é nova. Quando os Otomanos já entravam em Constantinopla, os parlamentares bizantinos, reunidos em concílio, discutiam o sexo dos anjos.

José Luís Pio de Abreu

3 comentários:

Nuno Silva disse...

Desculpem-me o acesso de positivismo filosófico mas, onde está a folha de cálculo com as contas que mostram que o nosso país, nas suas condições reais actuais, ganha (ou perde) em estar ou não no Euro? Numa década, o que ganhamos? E o que perdemos? Por falta de formação de base não estará a maioria de nós e dos nossos fracos líderes incapaz de utilizar bem as taxas de juro de Euro e, por isso, a gastar deslumbradamente em vez de investir parcimoniosamente? Onde estão todas estas respostas, assentes em outras tantas análises (com contas e não com meras opiniões pessoais), que permitem a tantos encher o peito e tonitruar que «sair o Euro será uma desgraça»? Se souberem de dados, por favor indiquem-me onde estão, porque me interessam sobremaneira. Se não houver dados, então a nuvem á maior que o previsto. Obrigado.

joão boaventura disse...

Já por várias vezes, e sempre que oportuno, tenho aqui reescrito qual a visão da formação europeia pelo falecido e histórico Lenine: "A Europa não se fará, e, se se fizer, será dominada pela Alemanha".

A Alemanha no fim da 1.ª Guerra Mundial (1914-18), foi humilhada pelo Tratado de Versailles (cedência de alguns territórios fronteiriços, perda das colónias africanas, redução do exército, reconhecimento da independência da Áustria, 33 milhões de reparações a pagar aos vencedores).

Hitler não perdoou, rasgou o tratado, aos poucos, e quis recuperar o prestígio germânico, desencadeando a 2.ª Guerra Mundial (1936-45). Perdeu, e já não assistiu a nova humilhação: fragmentação administrativa da Alemanha em quatro áreas entregues aos vencedores (França, Inglaterra, EUA, União Soviética), e reparações na importância de 20 biliões de dólares. O Tribunal de Nuremberga completou a humilhação. E o povo não esqueceu.

Para completar a penitência, o sector soviético transformou-se na República Democrática Alemã (Alemanha Oriental), enquanto os outros três (americano, britânico, francês) se juntaram e formaram a República Federal da Alemanha (Alemanha Ocidental).

Em 1990, com o "Tratado do Dois mais Quatro" (dois Estados alemães mais quatro Estados vencedores), em 12 de Setembro de 1990, é dada plena independência ao Estado Alemão Reunificado.

Decorridos 2 decénios, com a União Europeia a construir o seu caminho para o omega, verificamos que a Alemanha continua apolínea, e os países periféricos persistem dionisíacos.

Dito de outra forma, a Alemanha-formiga, pojante economicamente, começa a cansar-se de ajudar a pobreza franciscana das cigarras-sulistas da Europa, e Merkel não o escondeu perante a crise grega. Levantou a voz da Alemanha renascida das cinzas e da humilhação, e mostra algum pudor em ajudar quem não trabalha, ou pretende viver do vitalício apoio comunitário.

Acresce que a Alemanha continua a pensar que a União Europeia é autoritária, como forma de justificar as posições que vai tomando contra muitas medidas, para ir tomando o pulso, e fazer prevalece a sua posição. Perdeu duas guerras convencionais mas vai ganhar a guerra económica, a guerra social, e a guerra de como formar a Europa à sua imagem e semelhança.

Até que ponto as previsões de Lenine, que morreu em 1924, e apenas assistiu à humilhação da Alemanha pelo Tratado de Versailles, podem corresponder à realidade ? Vamos estando atentos aos sinais positivos do norte e aos sinais negativos do sul, e talvez assistir a uma União dos Países Europeus Periféricos, que são 4, e que, como o 12 da EU, também é um número perfeito.

madalena madeira disse...

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