Minha nota ínsita na "História do Futuro" do Padre António Vieira, que acaba de sair no Círculo de Leitores:
A
teoria dos céus fluido opõe-se à teoria aristotélico-ptolomaica das esferas
sólidas, onde se situariam os planetas do sistema solar, o próprio Sol e as
estrelas fixas. Em Portugal a ideia dos céus fluidos foi introduzida pelo
jesuíta italiano Cristophoro Borri (1583-1632), que esteve no Oriente e ensinou
em colégios de Coimbra e Lisboa depois de ter saído de Itália, advertido pelo
Geral da Companhia. Borri, um dos introdutores do telescópio entre nós,
baseou-se na observação de cometas (como o cometa que observou na Cochinchina,
hoje Vietname, em 1618) e no aparecimento de novas estrelas (como a Nova Stella observada em 1572 pelo
dinamarquês Tycho Brahe e que hoje sabemos ser uma supernova) para contrariar a
tese antiga de que os céus eram imutáveis e incorruptíveis. De facto, Borri deve-se
ter inspirado em Tycho Brahe, para escrever: “Na opinião dos Antigos, que imaginavam tantos céus
sólidos, não é possível que os cometas
penetrem tantos céus. Na nossa opinião, não é difícil, porque concebemos ser o
céu, não um corpo sólido, mas fluido” (in Compendium de Nova Mundi Constitutione, 1624). Depois de Borri, jesuítas portugueses como Soares
Lusitano e Baltasar Teles em Évora, também simpatizaram com a ideia dos céus
fluidos. Por outro lado, o francês René Descartes, no seu livro Traité du Monde et de la Lumière, escrito
entre 1629
and 1633 mas só publicado em 1664, atribuiu os movimentos planetários a
vórtices celestes, um conceito semelhante ao dos céus fluidos. Não admira por isso que o jesuíta Vieira, na sua História do Futuro, escrita a meio do
século XVII, fale dos céus fluidos como uma ideia recente. Faz, porém, notar
que se trata também de uma ideia antiga. Tem razão, pois, por exemplo, o
filósofo grego pré-socrático Anaxímenes de Mileto (c. 588- 524 a.C.) considerava o ar o elemento essencial e imaginava os
astros como discos flutuantes em fluxos de ar.
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