E aí está ele nos desfiles de Carnaval!

Há muito tempo que, em Portugal, as editoras que produzem manuais escolares ultrapassaram a sua vocação de... produzir manuais escolares. Têm anexado a esta inúmeras outras vocações, que aqui vou omitir pois apenas me interessa registar uma que, apesar de não ser recente, eu desconhecia: patrocinar desfiles de Carnaval.

Como alguns leitores sabem, sobretudo no 1.º ciclo do ensino básico, para tornar esses recursos mais "atractivos", "divertidos", "agradáveis"... cada editora usa uma espécie de mascote em forma de boneco, que imprime identidade aos seus manuais das várias disciplinas e anos de escolaridade.

Essa espécie de mascote está nas capas e em cada página, acompanhando a aprendizagem, dialogando com as crianças, apresentando-lhes desafios, propondo-lhes pesquisas... São exemplos o Papelito, a Joaninha, o Alfa...

Detenhamo-nos no Alfa, por se ter entendido que não podia ficar restrito ao seu suporte de origem (o papel e o digital), passeando-se entre a casa e a escola, era preciso pô-lo na rua. E aí está ele nos desfiles de Carnaval!

Mas, para tanto, têm as escolas e os professores de querer colaborar. E querem.

Depois desta decisão avança-se para a internet, descarregam-se as máscaras, imprimem-se, recortam-se, eventualmente, pintam-se. Vestem-se aos alunos e levam-se, alinhadinhos, ao cortejo, registam-se os seus melhores momentos em vídeo e disponibilizam-se os filmes no youtube, tira-se-lhes fotografias e põem-se as melhores no facebook para se tentar a sorte em concurso. Os pais ficam contentes por verem as suas crianças, todas iguazinhas, a cantar uma quadra deste género:
                 O divertido Alfa chegou
                 E a todos encantou
                 Vamos com ele partilhar
                 Aprender, rir, sonhar

E, todos gostarão ainda mais de ver o resultado no ecrã do computador. A sociedade acha bem, pois os tempos não são para se achar mal este tipo de coisas tão animadas...

Assim, destoará se eu disser que tudo isto é publicidade, não é educação escolar; que a escola tem por obrigação desmistificar a publicidade, não veiculá-la acriticamente; que as crianças não podem ser instrumentalizadas desta maneira. E, mais, que a identidade e a imagem das crianças não pode circular por esse mundo, sem mais nem menos.

Nisto tudo, não são as empresas que estão erradas, a sua estratégia é comercial, de consolidação e alargamento do mercado; são as escolas que estão erradas, pois têm o dever acrescido de educar e de, nessa medida, filtrarem o que e realmente relevante e devem fazer chegar às crianças.

Nota: A minha "investigação" circunscreveu-se a uma só editora, pelo que não sei se esta estratégia carnavalesca é mais ampla do que aqui dou a entender.