sexta-feira, 4 de maio de 2012

A formação superior de George Steiner

Lembra muito bem, em comentário, o nosso leitor António Bettencourt que George Steiner teve formação superior em física e matemática. A sua educação errática e a sua deambulação universitária, onde as ciências e as humanidades se entrecruzam, é contada em diversos livros. Um deles é Quatro entrevistas com George Steiner, da autoria de Ramin Jahanbegloo (2000), editado pela Fenda (páginas 44-50).
Fui para Yale. Graças aos meu dois diplomas do secundário pude entrar directamente para o segundo ano (…) o ambiente da universidade fazia-me sentir um tédio mortal; eu continuava a sonhar com Paris, e disse, por isso, ao meu pai que não aguentava. Ele respondeu-me que tinha de me esforçar por aguentar porque ele não podia arranjar-me outro sítio para estudar e eu precisava de esperar um ano inteiro antes de poder ir para Paris.  
Acontece que eu tinha lido um artigo sobre a Universidade de Chicago, onde um grande reformador chamado Hutchins acabava de lançar uma experiência interessante. Hutchins também pensava que o sistema americano não valia grande coisa e que era preciso descobrir uma solução que permitisse aos estudantes mais dotados não perderem o seu tempo. A regra queria que cada aluno seguisse os cursos e fizesse as provas de exame de catorze disciplinas obrigatórias. Uma nota de dezoito em vinte dispensava o aluno de seguir o curso. Escrevi a Hutchins, nos finais do mês de Outubro. Ele deve ter-se sentido divertido com um rapaz que hesitava entre Yale e Paris e cuja carta rezava: «Dê-me mais uma oportunidade, aqui aborreço-me de morte.» 
Pediu-me depois que fizesse as catorze provas de exame e eu tive dezoito em vinte disciplinas diferentes, ainda que um zero tenha preniado os meus resultados em matemática, em física, em química e em biologia. O que era uma consequência do facto de ter tido um fim de secundário consagrado ao grego e ao latim. Foi então que me foi oferecida a oportunidade mais extraordinária que se possa conceber: exigiram-me que seguisse o programa científico. Apaixonei-me literalmente pelas matérias que Hutchins tinha pedido ao Prémio Nobel de Física que se encarregasse das aulas de introdução (…) Urey foi meu professor de Química. Assim passei a antever um futuro de cientista e, nesse futuro, a minha carreira. Licenciei-me num ano em vez de quatro, o que de resto não é nem era muito habitual. Nesse ano fomos três a consegui-lo (…) 
Depois do exame, fui ver o meu conselheiro de estudos. Entro no gabinete dele cheio da arrogância dos meus dezoito anos. Ele respondeu-me: «Ouça, você teve muito boas notas, mas essas notas não querem dizer nada. Vê-se logo à primeira vista que aprendeu as suas matemáticas de cor, que o seu trabalho não tem um átomo de profundidade. Atirar-se para os braços das ciências exactas seria preparar-se para um desastre.» (…) Aquilo que um conselheiro de estudos entendia por ciências era a física nuclear que exigia uma parendizagem profunda das matemáticas (…) E disse-me a frase terrível: «O se é físico ou se ficam a limpar as lentes.» Propôs-me então que estudasse biologia, o que não implicava uma preparação matemática tão intensa. 
Eu estava no auge do desespero, chamava a mim póprio idiota, duvidava do meu valor e imaginava o fim do mundo. Com a morte na alma decidi ir para a Universidade de Chicago (…) Acabei por optar por um programa duplo, que incluía também filosofia e letras, sem na realidade saber para onde iria parar (…) Obtive uma bolsa para Harvard. 
Creio que foi um erro da minha parte, devia ter ficado em Chicago, mas era muito snob (…) Comecei a preparar a minha tese de doutoramento em literatura (…) e foi assim que redigi aquilo que a seguir foi publicado sob o título A morte da tragédia.

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