Na sequência de texto anterior, apresento neste post os planos-de-aula-prontos-a-usar-pelos-professores, da responsabilidade do Instituto Nacional de Estatística (que, tanto quanto sei, não é uma entidade com credenciais pedagógicas nem tem qualquer legitimidade para determinar o que os alunos devem aprender na escola) com o total apoio do Ministério da Educação.
Para a aula do 1.º Ciclo recomendam-se “duas ligações curriculares” – “Estudo do Meio” e Área de Projecto” –, e estabelecem-se três objectivos que, apesar de conterem erros, parecem ser dirigidos ao professor: dar a conhecer aos alunos dos diversos graus de ensino: o que são, para que servem e como se fazem os Censos; mobilizar os pais e familiares dos alunos para a participação nos Censos 2011; incentivar os alunos para ajudar os pais na resposta aos Censos 2011 pela Internet.
De seguida, vêm os conteúdos, mas agora já dirigidos aos alunos: explica-se-lhes muito claramente o que são os Censos, para que servem, quem os faz, e como se fazem.
Logo a seguir, em cor diferente, apresenta-se-lhes uma mensagem envolvente: “Nestes Censos vais ter um papel decisivo: Incentiva e ajuda os teus familiares a responder pela internet. Quantas mais respostas tivermos pela internet mais rápido iremos ficar a saber quantos somos, o que fazemos e como vivemos!” E a rematar: “Tu também contas!"
Muda o registo para o professor e surge a tarefa que ele deve prontamente executar: dar a preencher aos alunos a ficha “O Meu Censo” e, de seguida, apurar os seguintes resultados da turma: Quantos são os rapazes e as raparigas? Quantos têm 6, 7, 8, 9 ou 10 anos? Quantos nasceram em determinado local? Quantos têm irmãos?
Em anexo está a ficha com "bonecos" coloridos, onde cada menino deve escrever o seu nome completo, a idade, o sexo, a morada, o local de nascimento, quantas pessoas vivem na sua casa e se tem ou não irmãos.
Para a aula dos 2.º e 3.º Ciclo recomendam-se outras “ligações curriculares” – História e Geografia de Portugal; Geografia, História, Matemática; Área de Projecto; Formação Cívica – mas os objectivos são os mesmos.
Os conteúdos, mais extensos, incluem uma abordagem histórica que começa antes de Cristo e termina em Portugal, em 2001.
A mesma mensagem para envolver os alunos e, passando-se por cima do professor, apresenta-lhes as tarefas com desenhos e outras representações gráficas que é normal em manuais e exames, pressupondo que eles só conseguem resolver problemas muito concretos. Convido o leitor a dar uma vista de olhos porque… só visto!
Não resisto, no entanto a deixar um exemplo:
O Presidente da Câmara de VilaCensos pretende construir uma nova infraestrutura num bairro da vila, onde foram demolidos prédios velhos. Este espaço deverá ser utilizado pelas pessoas que moram nessa zona. O Presidente está indeciso entre construir um parque ou um centro comercial. Se o número de crianças e de idosos for superior a 50% do total da população a opção será construir um parque. Caso contrário, os adultos estarão em maioria e o Presidente irá construir um centro comercial. Ajuda o Presidente da Câmara de VilaCensos a tomar a decisão do que construir no espaço identificado na Figura 1, calculando o número de crianças, adultos e idosos que vivem na vizinhança, nas casas A a J.
Para a aula do Secundário recomendam-se as “ligações curriculares” de História, Geografia, História e Economia, mas a estrutura do conteúdo mantém-se, complexificando-se ligeiramente em relação à aula anterior.
De notar que, neste ciclo os alunos deixam de ser tratados por “tu” para serem tratados por “você”. Afinal, é outro patamar… o que se percebe nas tarefas (que… para uma aula... bem, não estou a ver como se poderão concretizar, mas talvez o dito Instituto possa explicar), que são:
- um teste de conhecimentos:
- um inquérito nas suas várias fases: definição das questões, recolha de dados, tratamento dos dados e apresentação dos resultados. Sugere-se como temática do inquérito “Planos de Futuro”, relacionada com o futuro escolar e profissional dos alunos das turmas do secundário da escola e
- um pequeno estudo sobre os Censos em Portugal de 1864 a 2001. Para tal, aceda ao site http://censos.ine.pt/ , onde pode consultar também a informação recolhida e apurada nos Censos já realizados. Seleccione um ou mais indicadores e analise a evolução desses indicadores ao longo do tempo. Por exemplo, considere a variável população residente; comece por registar numa tabela os dados relativos à população portuguesa residente em Portugal, no período de 1864 a 2001; represente graficamente os dados e analise a evolução da população ao longo deste período de tempo. No final, elabore um relatório com as principais conclusões desse estudo.
A conclusão desta extensa descrição parece ser: com tão esmerados planos, os professores não têm qualquer trabalho acrescido, bastando que os apliquem e, assim, contribuam para o sucesso dos Censos 2011! Ma será assim?
(continua)
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