O atual debate sobre os ensinos privado e público tem que se analisar com realismo e pressupõe uma opção, que ainda não se fez. Competindo ao Estado a formação de todos os jovens, e havendo uma rede pública de escolas, parece não lhe competir subsidiar o ensino privado. Assim, embora em muitos casos seja moralmente condenável, os colégios, que foram usados quando foi preciso, e aliviaram o Estado do encargo, poderão ser agora descartáveis visto haver escolas públicas disponíveis.
Acontece, porém, que há alguns factos a ter em conta. Por um lado, muitos colégios foram ganhando alunos pela fama de os preparar melhor, e por outro a sociedade tem vindo a perceber a importância de uma boa formação de base e por isso os tem preferido. Um dos nossos problemas está na baixa preparação de boa parte dos portugueses. E não faltando docentes universitários a queixar-se da deficiente formação com que lhes chegam muitos alunos, alguém andou a brincar com estas coisas.
O problema é pois mais complexo e este desinvestimento no ensino privado poderá ter maus resultados. Porque, paralelamente à progressiva preferência pelo ensino privado, houve a inversa desvalorização do ensino público. Um longo trabalho de igualização dos professores e uma frente sindicalista a promover os menos preparados (e por isso mais combativos), através de uma luta sempre muito salarial e carreirista e nunca científico-pedagógica, fez com que os melhores fossem sendo desvalorizados e desmotivados. Um último golpe foi dada pela ministra Maria de Lurdes Rodrigues que, com a preocupação de inverter estatísticas que nos envergonhavam, transformou as escolas em campos de produção estatístico-burocrática, e fez com que muitos dos melhores e mais experientes se afastassem, desgostosos.
O que temos agora, portanto, é um ensino público desvalorizado, apesar dos muitos excelentes professores que tinha, e tem, e um ensino privado que é quase sempre o preferido pelos que podem escolher. E assim, a impossibilidade de vir a optar por ele, por razões económicas, redundará numa forma de elitismo e conservadorismo social. A conceção de um Estado que dá formação a todos mas não valoriza os melhores produz massas medianas que não ajudam o país na competição com os mais evoluídos. O resultado pode pois ser perverso.
Talvez o Estado, em vez de persistir numa escola tipo napoleónico, com tendência a mediocrizar, devesse antes subsidiar cada aluno deixando aos pais a escolha da escola e a estas a necessidade de sobreviver pela qualidade. Seria mais justo para as escolas e mais vantajoso para a coletividade. Porque assim, enquanto uns procuram fazer o melhor com os alunos, os outros não precisam tanto disso porque têm a almofada estatal. Todos sabemos no que isso dá. São pois duas lógicas em confronto, mas a que impera na sociedade e na economia não é a lógica da competição? Talvez não seja a melhor, mas deverá o sistema de ensino andar ao arrepio da sociedade, travando-a?
João Boavida
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
De que escolas precisamos?
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
35.º (E ÚLTIMO) POSTAL DE NATAL DE JORGE PAIVA: "AMBIENTE E DESILUSÃO"
Sem mais, reproduzo as fotografias e as palavras que compõem o último postal de Natal do Biólogo Jorge Paiva, Professor e Investigador na Un...
-
Perguntaram-me da revista Visão Júnior: "Porque é que o lume é azul? Gostava mesmo de saber porque, quando a minha mãe está a cozinh...
-
Usa-se muitas vezes a expressão «argumento de autoridade» como sinónimo de «mau argumento de autoridade». Todavia, nem todos os argumentos d...
-
A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à in...
7 comentários:
"devesse antes subsidiar cada aluno deixando aos pais a escolha da escola e a estas a necessidade de sobreviver pela qualidade."
Claro. Cada aluno no 1.º ciclo público custará 2500 euros. Qual é o colégio que por este preço garante ensino, AEC´s, etc.?
Por que não o mesmo nas universidades, um cheque aos pais?
Desconheço a receita ideal para tão complexo problema, mas o que aqui é dito não deve ser descartado com tanta facilidade e fraca argumentação.
Numa empresa privada, os chefes são sempre os tipos que ninguém grama porque têm ascendente para dar ordens. Mas esses chefes a quem fazemos caretas pelas costas, mesmo que gostem mais do João do que do António e não o escondam, têm um objectivo claro: a produtividade do negócio ou o desenvolvimento do projecto, enfim, seja lá o que for. E com esta premissa inquestionável, mesmo não gramando muito o António, esse mesmo chefe vai dar-lhe as condições necessárias para que ele produza e a empresa/negócio ou o que for seja competitiva e progrida.
Ora no ensino público, os senhores directores e afins não têm nada a perder, os seus investimentos, os seus lucros não dependem do bom funcionamento empresarial nem da competência dos seus funcionários. Assim, estão-se completamente "cagando" para criar condições necessárias, básicas e vitais para que as aprendizagens dos alunos aconteçam. O trabalho que se valoriza actualmente na maioria das escolas é unicamente burocrático e estatístico.
Eu sou daqueles poucos professores a quem a stuação actual dá vómitos e que continuam no ensino público exclusivamente por falta de alternativa. Uma questão de sobrevivência. Como tal, tenho muita dificuldade em ser aceite pelos meus pares, embora, depois de ter levado com uma avaliação de Regular (com duas ameaças de processo disciplinar pelo meio), me esforce por participar um bocadinho nas baboseiras das conversas (aquilo não são conversas, mas adiante) das salas de professores e passar o mais despercebido possível, rindo-me um bocadinho de vez em quando... mas é muito difícil, pois eles farejam a diferença com grande perícia e lixam-nos à custa dela. Não me atrevo jamais a dizer que estou a ler um livro de Dostoievsky, ou a ler poesia, ou que fui a uma conferência interessante sobre ciência, ou que passei uma tarde de sábado a investigar um tema, ou que tenho uma dúvida sobre... mas é que nem pensar nisso!!! Os alunos apreciam-me e dizem coisas do género, -aprendi mais consigo numa semana do que num ano inteiro com o professor do ano passado... - que agradável, mas, o problema é que este tipo de observações não podem chegar aos ouvidos dos nossos avaliadores, uns trastes frustrados que nos fazem a vida negra desprezando-nos, ignorando qualquer opinião nossa a nível profissional e, mais preverso, enchendo-nos de trabalho até à exaustão, exaustão essa directamente proporcional às respectivas expressões de prazer. As minorias são sempre vulneráveis e nem todos têm a mesma habilidade de camuflagem, importante característica nos dias que correm.
Estou numa escola pública em que há alunos de SASE sem os cadernos de exercícios que fazem parte dos manuais de línguas. O Director não permite que esses exercícios sejam fotocopiados, mas oferece o transporte para visitas de estudo organizados pelos joões de quem ele gosta (se for o António a organizar a visita de estudo, nada feito). Portanto, há alunos nas salas de aula que se desconcentram pelo simples facto de não terem direito a material escolar básico. Só um exemplo, há muitos mais inacreditáveis.
As escolas deviam ser dirigidas por pessoas com cursos de gestão de empresas e formação válida em recursos humanos, nunca por colegas da mesma escola. É urgente optar pela competência de quem dirige seja o que for. A avaliação dos professores, com a qual me regozijei no início por a achar imprescindível, é uma anormalidade, um atentado contra qualquer aspiração profissional séria.
HR
2500 por aluno turmas de 20 seriam 50mil
um professor custaria 15mil
mais um funcionário por três turmas
mais 100 a 200mil numa estrutura
é exequível
em vez de persistir numa escola tipo napoleónico, com tendência a mediocrizar,
o problema é a existência de estruturas que têm de ser mantidas
escolas com 1 professor para 5alunos
há muitas no ensino público
o caso de muitos desses professores não darem aulas é outro problema
escolas com 100 profs para 500 alunos
e escolas com 100 para 1300 coexistem no mesmo concelho e ambas públicas
e alunos que vão rodando por escolas até atingirem o término
Emidio Navarro em Almada com recepção de repetentes de 5 ou 6 escolas
são as velhas escolas técnicas que renascem
agora quem vai despedir 5000 membros de antigos conselhos directivos que só se especializaram na papelada e relações públicas???
ou obrigá-los a fazer algo?
a rotação é rara porque a maior parte dos professores não quer tais funções
uma escola pública tem professores de todos os tipos há muitos extremamente bons e outros péssimos e todos do quadro das escolas
as privadas também não são o céu
e dar escolhas
filho não gostas desta escola vais para esta
isso também se faz...hoje logo
porque não meter os miudos todos numa escola chinesa custa menos de 2500 ao ano
e saiam mais preparados
ou russa...ou moldava
ahn...pensem nisso
Ó Professor Boavida, sem querer ser chocarreiro, diria que a resposta ao título do seu texto talvez seja da competência de uma empresa chamada... "Parque Escolar"!
Pelo menos vi um dia destes o Senhor Primeiro Ministro falar sobre as novas escolas atrás de um suporte das suas folhas de texto que fazia reclame (escrito) àquela empresa.
Assim a modos como os treinadores de futebol quando são obrigados a dizer umas palavritas aos aficcionados da bola...
Caro João Boavida,
Não sei se o Estado deve optar pelo caminho por si apontado, porque temo que os boys e girls encontrem imediatamente uma forma de controlar estas escolas através de um monopólio qualquer com uma entidade reguladora amiga qualquer para ganharem uns trocos engraçados através do Orçamento de Estado. Mas uma coisa sei, enquanto uma boa parte da sociedade não exigir uma escola a sério a grande maioria das escolas continuará a ser apenas e só um local muito lúdico, muito giro, muito socializante e onde não se aprende quase nada de quase coisa nenhuma. É tudo uma questão de mercado (escolas privadas) ou de votos (escolas públicas).
Já agora, os políticos dão aos eleitores aquilo que eles querem; e a verdade é que até agora têm querido não uma escola mais um centro de guarda e entretenimento de crianças e jovens. Isto também se passa nas escolas privadas, a grande maioria oferece aquilo que o mercado procura, ou seja um centro de guarda e entretenimento de crianças e jovens. Sendo assim, tenho muitas dúvidas que este enorme problema se resolva com uma única medida.
Caro João Boavida,
A escola não é um lugar "muito lúdico, muito giro, muito socializante" As escolas (maioria) são lugares velhos, sujos, cheiram mal, feios, apertadíssimos, as pernas dos alunos não cabem, quando chove as escolas parecem aviários por onde é preciso ter muita força de vontade para nos locomovermos. E é neste cenário que os alunos realmente socializam. Os alunos são a única coisa que vale a pena na escola. E as reacções dos que deles se queixam são consequência. Os alunos aprendem por imitação, somos nós que os ensinamos, que lhes damos as incondições para que eles aprendam e os exemplos éticos a seguir.
O que não invalida a legitimidade do seu comentário.
HR
«escolas com 1 professor para 5 alunos» - mas onde ficam essas escolas? Mas que contas são estas? Mas qual é o professor que tem 8 ou 5 alunos? Brincamos? Vamos a um exemplo prático: a escola onde trabalho que tem 1000 alunos e 100 professores. Quer isto dizer que cada professor tem 10 alunos? Eu tenho 100 - quatro turmas com uma média de 25 por turma. Mesmo que dividindo os alunos pelos professores dê 10 a cada um, todos so que sabem como funciona uma escola também sabem que nenhum professor tem só 10 alunos. Parem com as continhas que induzem em erro e foquem-se no que é MESMO IMPORTANTE! Isto, por exemplo:
«As escolas (maioria) são lugares velhos, sujos, cheiram mal, feios, apertadíssimos, as pernas dos alunos não cabem, quando chove as escolas parecem aviários por onde é preciso ter muita força de vontade para nos locomovermos. E é neste cenário que os alunos realmente socializam. Os alunos são a única coisa que vale a pena na escola. E as reacções dos que deles se queixam são consequência.»
Enviar um comentário