quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

EM MEMÓRIA DE ORLANDO RIBEIRO


Publicamos, com a devida vénia, texto recebido do geólogo e divulgador científico Galopim de Carvalho (autor do blogue Sopas de Pedra) em homenagem ao grande geógrafo português Orlando Ribeiro, cujo centenário do nascimento se assinala hoje:

Nasceu em Lisboa, faz hoje, dia 16 de Fevereiro de 2011, 100 anos, e deixou-nos, vai para 14, em Novembro de 1997. A memória que eu e muitos outros temos dele é ainda muito fresca, tal a marca que deixou em nós.

Geógrafo tradicional, de elevada craveira, dentro e fora do país, nos domínios da geografia física (geomorfologia) e da geografia humana, com uma notável preparação geológica, Orlando Ribeiro foi um humanista igualmente reconhecido a nível nacional e internacional. Renovador da Geografia em Portugal, o Prof. Orlando (era assim que o tratávamos), foi senhor de muitos saberes em outras áreas, como as da História, da Antropologia, da Etnografia e da Geologia, saberes que expunha numa linguagem falada e escrita de invulgar correcção, não raras vezes poética.

De parceria com o seu colega e amigo Pierre Birot, de l’Institut de Geographie de Paris, foi pioneiro numa metodologia de investigação geomorfológica, substancialmente assente no cabal conhecimento dos sedimentos resultantes da erosão do relevo. E foi nesta linha inovadora que me concedeu o privilégio de aceitar ser meu orientador nas dissertações de doutoramento que apresentei e defendi nas Universidades de Paris e de Lisboa, factos decisivos na escolha da via de investigação que caracterizou o essencial da minha actividade com geólogo e como docente.

Como era hábito deste ilustre Mestre, para além das frutuosas e pedagógicas discussões que travava com os seus orientandos, nas visitas que com eles fazia ao terreno, lia com eles o manuscrito, em fase final das respectivas dissertações e aí, uma vez mais, voltava a discutir, dava sugestões, fazia correcções de forma e de conteúdo, e ensinava a escrever em bom português. E foi isso que ele fez comigo, o único não geógrafo entre os muitos que orientou.

Este meu relacionamento com o Prof. Orlando aconteceu porque eu era colega do seu filho António (hoje, o igualmente ilustre Prof. António Ribeiro), na licenciatura em Ciências Geológicas, e ambos fizéramos, com ele, proveitosas saídas de campo, onde a geomorfologia, a geologia e geografia humana se harmonizavam no rigor e na beleza, por vezes poética, do seu discurso. Aconteceu, ainda, porque éramos vizinhos. Das traseiras da sua casa falava-se para as traseiras da minha. Assim, para além da relação mestre/discípulo, fomos amigos chegados ao longo de cerca 40 anos.

A. M. Galopim de Carvalho

1 comentário:

Anónimo disse...

Circulava por essa altura em que Orlando Ribeiro abandonou, por indesejável, a Facuidade de Letras de Coimbra o desabafo do Prof. Doutor Engenheiro Leite Pinto, então Ministro da Educação Nacional, comentando que uma Universidade que deixa sair um docente com a craveira científica e cultural de um Orlando Ribeiro... deveria ser extinta! Ouvi-o da sua boca. JCN

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