Domingo, 3 de Janeiro, oito da noite, regresso de fim de semana prolongado. Repórteres da TVI espalhados pelas bermas das estradas da nação, posicionados para a habitual reportagem do boneco com o microfone à frente de uma fila de luzes pachorrentas. Pequeno problema: os portugueses desiludiram. Berma após berma o mesmo cenário desolador para a reportagem da TVI: o trânsito flui normalmente, como confirmam na habitual linguagem rebuscada os diligentes militares da GNR (aliás para grande desgosto dos empenhados repórteres, que ainda tentam sugerir expressões mais ambíguas do que "normalidade").
Mas é isto razão para não fazer a abertura do Jornal Nacional com um cardume de repórteres na berma? Ná... Depois da constatação consternada da "aparente normalidade", seguem-se as especulações sobre as eventuais causas para o bizarro fenómeno ("os portugueses terão repartido a hora de viagem ao longo do dia"), terminando com os insubstituíveis conselhos dos oficiais da GNR para "os condutores que iniciam a viagem agora": precaução, cinto de segurança atrás e à frente, não consumir álcool, evitar a velocidade excessiva. Acrescentaria ainda, se conduzir não veja televisão.
E o Jornal Nacional continua com o "mau tempo", outro tema fascinante que interessa sempre aos portugueses: caiu o tecto de uma casa que tinha o tecto a cair nos Açores, como aliás informam sem surpresa os seus ocupantes.
Para além destes temas prosaicos, há outros um pouco mais complicáveis que também podem servir para fazer "notícias": suplementos alimentares revolucionários, novos tratamentos alternativos ("terapia quântica", "desintoxicação"), benefícios da beterraba na prevenção do cancro do dedo grande do pé, malefícios das radiações da televisão de LCD no crescimento de pêlos na barriga. Tudo baseados em "estudos" que ninguém sabe muito bem quais são nem está interessado em saber, que fazem muito frequentemente excelentes não-notícias. Só que estes casos nem sempre são tão ridiculamente evidentes, porque não se vê a estrada desimpedida com carros a circularem a boa velocidade em fundo. Mas o absurdo é frequentemente comparável, assumindo os jornalistas o papel de amplificadores acríticos das maiores patetices. A este propósito (das patetices e respectiva amplificação) estou a ler a "Ciência da Treta" de Ben Goldacre, mencionado neste blogue, que recomendo vivamente.
Por vezes a vontade do jornalista fazer uma notícia interessante sobrepõe-se ao interesse da notícia. No caso da ciência, muitas vezes significa transformá-la em curiosidades ou truques de algibeira, independentente da qualidade, relevância ou representatividade dos eventuais estudos mencionados. Claro que também há bons jornalistas que fazem um trabalho sério.
3 comentários:
Há um outro fenómeno recente na informação escrita que me deixa com os cabelos em pé: contar as palavras nos discursos mais ou menos oficiais. O julgamento crítico do cidadão comum sobre o discurso de aceitação do Nobel por Obama está formado: ele sabe quantas vezes o presidente disse a palavra guerra, foi essa a notícia. Já não é necessário ler aquelas dezenas de enfadonhas linhas, quanto mais estar atento às entrelinhas. Cavaco também já foi submetido a esse escrutínio. Que suculentas conversas dão esses números à mesa do café.E cuidado: na próxima campanha eleitoral vamos ter os spin doctors a fazer o cálculo prévio no word, que isto ainda vai valer votos.
A TVI é perita em não noticias e em Noticias inventadas, em polémicas que não existem que são por si criadas para serem notícia, dou exemplos como a pseudo polémica das blusas existentes da loja da imã de Ronaldo, na madeira que incitavam ao consumo de droga, coisa que nem os transeuntes entrevistados no momento se tinham apercebido, outra o pseudo vídeo pornográfico da actriz Fernanda Serrano, que mais não era uma sósia, quantos portugueses sabiam do vídeo, a TVI criou a polémica, levou os portugueses a verem o vídeo e no final foi a TVI que vexou subtilmente a actriz e ninguém parece ter dado por isso..
Critica-se muitas vezes a RTP por tudo e por nada, mas a TVI é a escola de pseudo alunos de jornalismo repetentes!
O que se faz naquela estação não é jornalismo, é lixo, ainda bem que correram com a Manuela Moura Guedes, que aquilo não era nada!
Quanto às reportagens sobre curas e malefícios baseados em estudos realizados na universidade xpto do pais wxz, sem comentários..
Não era um cardume de repórteres, era uma matilha repórteres.
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