terça-feira, 20 de abril de 2010

A LEI DA ESCOLA SEGUNDO O EDUQUÊS


Texto de Guilherme Valente que acaba de sair no jornal "Público":

1. Contra o silêncio e a indiferença, é preciso dizer que as duas mortes agora acontecidas são extremos dramáticos, picos na violência que cresce em muitas das escolas públicas. Mas nem estes casos extremos obrigaram o eduquês a mudar o discurso:

No caso do docente de Sintra, a DREL terá colocado psicólogos na turma em causa «com medo de que haja um sentimento de culpa». E não deveria haver? Não é esse o único sentimento aceitável, o mínimo que na circunstância se deve esperar? Não deve esse sentimento ser mesmo suscitado em todos aqueles jovens e nos responsáveis da escola e do ministério? Ou a escola deixou de ser, de repente, a tão badalada «comunidade educativa»?

«Trata-se de jovens que são na sua generalidade bons alunos e que não podem transportar na sua vida uma situação de culpa que os pode vir a condicionar pela negativa», disseram.

Nem mesmo a morte obriga o eduquês a pôr a mão na consciência. Ou será que estas mortes devem ser atribuídas à natureza?

2. Também Daniel Sampaio (DS), escreveu o inimaginável sobre o assunto (Pública do dia 14 de Março).

Apesar de conhecermos as suas ideias, lemos com perplexidade o que seguramente terá indignado a generalidade dos pais que diariamente são obrigados a deixar os filhos nas escolas públicas e dos professores que nelas resistem ao intolerável.

«Querer uma escola controlada pela polícia [quem é que alguma vez defendeu isso?] em que ninguém possa desobedecer ou contestar as regras, é acabar de vez [pasme-se!] com esse território de liberdade segura que caracteriza o nosso sistema educativo (…)». (Sublinhados meus).

Mas vale a pena continuar a citar DS:

«É que há em todas as escolas comportamentos que podem ser considerados violentos, mas que não são bullying [cabe ao especialista, portanto, dizer se é dor a dor que deveras sinto – meu Deus!]: a escola reproduz a sociedade [a escola do eduquês sim, até agrava mesmo o pior da sociedade; a boa escola que queremos, pelo contrário, enfrentaria o que na sociedade não é desejável] e esta não é serena [serena?], por isso são frequentes as piadas, as troças e até um insulto passageiro ou um empurrão, sem que isso seja muito grave.»

Passaria por humor, não fosse experiência de medo de tantos jovens, a preocupação de tantos pais, o receio de tantos professores, relatados todos os dias pela comunicação social. Gostaria de saber em que escola estudaram os filhos de DS.

A mansa palavra de (omitir?) clínica não consegue esconder o gelado alheamento da realidade. E, a seguir, DS prescreve a receita fácil para o caos… que também ele próprio, porventura sem se aperceber, tem ajudado a instalar.

Eu sei que o psicólogo é DS, mas desta vez sou eu a fazer o diagnóstico: continuamos perante uma estranha dificuldade do homem inteligente que é em ver a realidade. Quanto à cura, sinceramente, gostaria de não perder a esperança de boas notícias.

4. Estes textos chocantes, nas circunstâncias quase pornográficos, são, como tantos outros do mesmo teor, exemplos reveladores: o eduquês gosta da indisciplina, e, assim, vai encorajando a sua manifestação.

E assim vão fazendo o seu tricot teórico os mais ou menos discretos companheiros de jornada do eduquês, ajudando, voluntária ou ingenuamente, a impor a escola má que todos os dias atira para a ignorância, a desqualificação, o abandono e a exclusão gerações e gerações de crianças dos estratos sociais mais desfavorecidos, agravando assustadoramente as desigualdades, privando-as do ascensor cultural e social único que um bom ensino público - condição da sociedade civil - seria para elas.

Quem disse ser preciso muito tempo para se verificar o resultado do que se faz na educação?

Acolhidas e cultivadas na escola do eduquês, a ignorância e a violência explodem na sociedade. Mas não era isso o que o eduquês pretendia?

Guilherme Valente

5 comentários:

Unknown disse...

Não querendo ferir susceptibilidades, a verdade é que nestes casos, em que O psicólogo é utilizado como recurso para resolver os problemas, ou melhor para suavizar as situações, fá-lo sempre aplicando os seus modelos 'à realidade'. Não se estuda a pessoa, não se enquadra num percurso de vida, numa história individual e intransmissível, mas sim, segundo teorias e tabelas pré-definidas.
Melhor, para cada problema existe uma teoria-aplicada. Caso não exista nenhuma teoria (padrão) a aplicar - então o jovem é delinquente, é violento, é pobre coitadinho e nunca recebeu educação.
(Foi apenas um desabafo).
A verdade, é que o caos está instalado sim, pela confusão com que a Instituição escola é vista, olhada, discutida e criticada. Por pais, docentes, educadores, alunos, por todos e mais algum, mesmo sem conhecimento de causa.
Passou-se de uma desresponsabilização dos pais para uma obrigatoriedade da escola, em ensinar, formar e educar. Não a educação, que deveria pressupor a cidadania e o respeito mútuo, mas a educação que "falhou" antes.
Porquê?
Porque os pais não prestaram atenção suficiente aos seus filhos? Os pais não tiveram tempo de educá-los, esperando assim que a escola se encarregasse desse papel?
Por seu lado, a escola, espera que as crianças estejam motivadas e desenvolvidas o suficiente para integrar O meio escolar.
Uma «guerra» de batatas quentes.
Um excesso de especialistas em diversas áreas? Que nunca chegam a nenhum consenso sobre o «percurso escolar» do aluno?
Não sou especialista, em nenhuma área da educação... é apenas um comentário.

Anónimo disse...

E vale a pena continuar a citar Daniel Sampaio, numa entrevista dada ao ionline http://www.ionline.pt/conteudo/54730-daniel-sampaio-ninguem-se-suicida-so-ser-vitima-bullying a 10 de Abril:

"ionline: Nos EUA, nove jovens estão a ser investigados no caso de uma adolescente que se suicidou-se por ser vítima de bullying.

Daniel Sampaio: Isso nunca é bem assim. A pessoa nunca se suicida só porque é vítima de bullying. Há múltiplas causas que num determinado momento se somam. Por exemplo, temos a escola de Fitares e o professor que se suicidou, vítima - escreveram indecentemente os seus colegas do "Público" - da turma do 9.oB. Não se pode escrever isto. Primeiro porque houve pessoas da turma do 9.oB que não tiveram nada a ver com isso. Depois, o professor - que de certeza que sofria muita pressão dos alunos, ao ponto de escrever isso no computador - era doente psiquiátrico, estava em depressão, tinha 50 e tal anos e vivia com os pais."

O argumento de "múltiplas causas" para o suicídio, desculpabiliza tudo e todos - o princípio da culpa difusa em que ninguém se sente culpado. Mas DS ainda aponta que o professor "era doente psiquiátrico, estava em depressão, tinha 50 e tal anos e vivia com os pais".

É espantoso o trabalho de branqueamento do trágico acontecimento por parte deste Sr. psicólogo ou pedopsiquiatra ou lá o que quer que o canudo lhe tenha conferido como estatuto.

Cruz Gaspar

Fartinho da Silva disse...

É a "escola" pública que temos e que teimosamente os situacionistas continuam a defender!

Graças a esta "escola" formaram-se gerações completamente incapazes de fazer pela vida e de enfrentarem a dura realidade da economia global e da sociedade ultra competitiva que temos hoje.

Graças a estes defensores do status quo, todos os dias temos empresas a dispensar trabalhadores na mesma semana em que são contratados pela simples razão de os mesmos serem incapazes de escrever um resumo de um qualquer produto ou serviço sem que alguém corrija os erros ortográficos e semânticos que aparecem em todos os parágrafos.

Graças às patetices e pieguices, porque é disto que se trata, que esta gente defendeu e continua a defender como modelo para a "escola" pública, "inclusiva", "democrática" e "coiso" e tal, temos uma sociedade que não é competitiva, temos uma economia que não se mexe, temos um estado à deriva e temos uma quase inevitável falência do estado social à nossa espera.

Para esta gente, o importante é assegurar os seus tachos e/ou a sua vaidade pessoal nem que para isso se condenem gerações inteiras ao analfabetismo funcional e agora até ao analfabetismo no sentido literal.

Todo e qualquer jornalista que se preze tem a obrigação deontológica de perguntar a todos os defensores do "eduquês", onde os mesmos têm os filhos ou os netos a estudar. Esta pergunta é fundamental. É que normalmente, esta gente, defende estas ideias completa e absolutamente ultrapassadas para os filhos e netos dos... OUTROS!

Esta gente, que se diz de esquerda, foi capaz de criar uma "escola" pública que é o principal factor de exclusão social do país. Esta gente, que se diz de esquerda, conseguiu criar uma "escola" pública que começa a ser frequentada apenas por aqueles que não possuem recursos financeiros e/ou culturais para inscrever os seus filhos nos poucos colégios de qualidade existentes neste país.

É o Portugal pós-moderno... e num claro plano inclinado.

Rui Diniz Monteiro disse...

Arno Gruen (A Loucura da Normalidade, ed. Assírio e Alvim) chamava a atenção para esta estranha e malfadada perversão que leva pessoas ditas "normais" e "inteligentes" a defenderem intransigentemente os agressores ou, faltando-lhes a "lata" para o fazerem às claras, a defenderem as condições necessárias para que estes continuem, impunes e à vontade, a maltratar os mais fracos.
Estas mesmas pessoas que revelam uma total incapacidade para empatizarem e para se porem do lado das vítimas e dos desprotegidos.
É esta gente, profundamente doente, mas que pelo seu número parece normal, que tem ocupado o poder nos últimos anos. Infelizmente para tantos e tantos miúdos...

José Batista da Ascenção disse...

Apraz-me dizer:
Obrigado a Guilherme Valente;
Obrigado às entidades que lhe publicam as opiniões que emite sobre o ensino;
Obrigado aos comentaristas.
Um dia, não sei quando, este país há-de fazer alguma coisa de jeito na (da) sua escola pública.

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