quinta-feira, 5 de outubro de 2023

RECEITAS SIMPLES E BARATAS PARA SE TRAVAR A CATÁSTROFE CLIMÁTICA

Por Eugénio Lisboa

Até há pouco tempo, contemporâneos de Newton e mesmo autoridades posteriores ao grande cientista inglês, faziam interessantes propostas para nos livrarmos do perigo de trovoadas, tempestades e outros malefícios. Nada de sustos nem complicações: a ciência só serve para complicar e empatar. 

Vou dar dois exemplos que brilham pela simplicidade terapêutica. 

Sobre trovoadas, por exemplo, Monsenhor Camus, bispo de Belley (1582-1653), falava-nos delas, nestes termos aconchegadamente tranquilizadores: 
“Os sinos dissipam as trovoadas e afastam os demónios, que se imiscuem nesses meteoros e impressões aéreas, para prejudicarem os humanos. A experiência faz ver que o diabo é inimigo dos bons odores, vilão como é, não se dando bem a não ser com maus cheiros e sujidade; também odeia a harmonia, a música e todo o som que seja bom e agradável. O som dos sinos perfumados é, portanto, naturalmente útil contra demónios e trovoadas.”
Eis, pois, uma fórmula aliciantemente simples, para nos livrarmos de perigos celestes, sem grande dispêndio de dinheiro e sem termos de reduzir o carbono emitido para a atmosfera: sinos e um bocadinho de perfume. Não há como a sabedoria dos padres da Igreja. Outro bispo, já mais perto de nós, Monsenhor Gaume, da segunda metade do século XIX, oferece-nos outra receita eficaz e adoravelmente discreta e barata: 
"Tais são as trovoadas, as tempestades, as epidemias dos homens, dos animais, das plantas. Nós sabemos, de ciência certa, que a água benta é um excelente preservativo contra esses diferentes fenómenos de que a natureza misteriosa e o carácter particularmente maléfico indicam , suficientemente, serem, com demasiada frequência, obra do diabo.” 
Afinal, uns borrifos de água benta resolverão, sem grande espalhafato, a catástrofe climática que alegadamente se aproxima. Há magníficos e saborosos DICTIONNAIRES DES BÊTISES que nos oferecem estas e outras preciosas receitas, para não nos deixarmos assustar pelas palavras levianas do Engenheiro António Guterres e do Papa Francisco, o qual se deixou envenenar pelos avisos de assessores científicos, proferindo avisos desnecessariamente alarmantes (estes, curiosamente, plasmados na mesma edição do PÚBLICO, em que J. Miguel Tavares nos põe de sobreaviso contra os sempre possíveis descarrilamentos da ciência…) 

Eugénio Lisboa

3 comentários:

AMCD disse...

O J. Miguel Tavares, no Público, usa ardilosamente, e porque lhe convém (para jogar com as palavras), o conceito obscuro de "Apocalipse", das profecia de São João, confundindo profecia com previsão científica. Esta baseia-se na experiência e na observação empírica de processos e fenómenos e não na crença irracional de uma profecia. Profecias desmentidas e previsões baseadas na ciência não são necessariamente a mesma coisa. J. Miguel Tavares, chega, dessa forma, a insultar a nossa inteligência. Estamos no limiar de um colapso, se é que já não estamos nessa situação. Não é a religião que o afirma, é a ciência que o corrobora. Entretanto, cá vamos nós, cantando e rindo, estupidamente optimistas, como se a resolução do problema estivesse logo ali, ao virar da esquina, ou como se o capitalismo nos fosse salvar. O J. Miguel Tavares que se fie na Virgem e não faça nada e cá estaremos para assistir ao ridículo.

Anónimo disse...

Depois da identificação dos erros, logros e despudores dos antigos representantes da(s) Igreja(s), poderia o Prof. Eugénio ajudar-nos a identificar o bluff, a manipulação e a mistificação dos atuais?!

Helena Damião disse...

Estive ontem, prezado AMCD, mais atenta ao discurso de JMT e vi, precisamente, o que diz: confusão entre dados científicos, isentos e confiáveis, e crenças, apocalíptica e o negacionista. É certo que nem todos os dados que se apresentam como científicos são científicos, mas, no caso, temos razões substanciais para os considerarmos como tal. E, mesmo que a certeza em relação ao problema fosse remota, se apenas houve uma desconfiança, a atitude mais prudente seria de ficarmos muitíssimo apreensivos.
O argumento de JMT também não colhe pelo facto de as reais alterações do clima que põem em causa a vida na terra (que ele considera potenciais) não afectarem substancialmente a nossa geração (o que já acontece) e a próxima ou a que venha a seguir a esta. O nosso olhar deve ser para o infinito. Como Hans Jonas referiu precisamos de querer (é de uma vontade que se trata) deixar um mundo para as múltiplas gerações que virão para além de nós. Um mundo, como Hannah Arendt disse, que sirva de casa aos humanos.
Em abono de JMT: entendo que ele "apenas" tem traduzido em público, com uma expressão descontraída, o pensamento colectivo, que desemboca em práticas insustentáveis para continuação da vida na terra, e o poder político, que teria a obrigação máxima, de procurar reverter a situação, não mostra coragem suficiente para o fazer.
Cumprimentos, MHDamião

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