segunda-feira, 24 de julho de 2023

O IDEAL CRISTÃO

Por Eugénio Lisboa

The Christian ideal has not been tried and found wanting;
it has been found difficult and left untried.
G. K. Chesterton

A epígrafe de Chesterton, traduzida para português, reza assim: 
“O ideal cristão não foi experimentado e considerado inadequado; foi considerado difícil e por isso nunca experimentado.”
Chesterton era um assumido católico, por isso devia saber do que estava a falar, ao fazer uma das mais subversivas denúncias de total separação entre cristianismo e catolicismo. Por outras palavras, a Igreja Católica teria mostrado sempre aversão a ensaiar o despojamento total do cristianismo. Seria mesmo um desvio acentuadamente profano, materialista, sumptuário, com os seus bispos, cardeais, cardeais patriarcas, papas e descomunais catedrais – de grande beleza sensual – a ofenderem frontalmente a simplicidade e humildade que vestiu Francisco de Assis.

Foi este o sentido agreste que José Régio deu ao título de uma das suas sátiras mais contundentes contra o materialismo inquietante da igreja católica: o NON EST HIC, do seu belo poema, pescado directamente na tradição cristã, quer dizer isto mesmo: NÃO ESTÁ AQUI, nesta igreja, o Cristo que deixou à humanidade um legado que a igreja católica rejeitou. 

A Igreja Católica da época bem entendeu a denúncia do grande poeta, que faz eco à de G. K. Chesterton: CRISTO NÃO ESTÁ AQUI, ou O SEU LEGADO NUNCA FOI APROVEITADO. 

Importantes intelectuais católicos que, até à publicação de A CHAGA DO LADO, tinham posto Régio nos cornos da lua, passaram a denegri-lhe a obra, a partir desse livro, que tão poucos leram como deve ser: uma das mais destemidas afrontas feitas ao Estado Novo, com os seus capitalistas protegidos e abençoados por uma igreja que voltaria a crucificar Cristo, se este ressuscitasse.

Vale sempre a pena ler a dilacerante cena do Grande Inquisidor, no romance OS IRMÃOS KARAMAZOV, de Dostoiewsky. Também vale a pena voltar a Tolstoi. Todos dizem admirar muito estes dois gigantes, sem repararem no que há, nas suas formidáveis obras, de radical condenação dos mais óbvios desvios do que Cristo recomendou. 

Pareceu-me bem lembrar estas coisas, agora que se aproxima o grande espalhafato e confusão das Jornadas Mundiais da Juventude católica. Os fundadores do cristianismo indicaram que uma simples pedra servia bem de igreja. Os milhões que agora se vão gastar serviriam melhor para amaciar tanta pobreza que anda por aí. 

Régio tinha razão: NON EST HIC.

Eugénio Lisboa

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