A educação é, desde os primórdios da humanidade, uma realidade. Como refere Delfim Santos (1973, p. 42), “o primado, clara ou não claramente expresso, pertence à educação”. E, acrescenta, a educação está presente “em todas as formas de civilização que a história regista, por mais rudimentares que elas sejam”.
Por isso, podemos falar da educação como necessidade vital. Ou seja, como condição da sobrevivência, tanto dos indivíduos como da espécie. Mas também como condição de evolução, pois capacidades novas surgem nos indivíduos à medida que vão sendo capazes de ultrapassar dificuldades que até um determinado ponto não conseguiam. A educação está igualmente ligada aos fenómenos culturais, constituindo condição da própria sobrevivência, coesão e dinâmica de qualquer sociedade.
E é óbvio que a dimensão social não exclui a componente pessoal, porque, de facto, “cada homem realiza a sua própria e intransferível experiência vital»", a qual, sendo “intransferível, necessita de ser articulada com a experiência vital dos outros homens, para que a vida social seja possível” (Delfim Santos, 1973, p. 442).
A existência de cada ser humano é, de facto, um itinerário particular que se articula com uma infinidade de outros itinerários particulares, constituindo uma teia, vasta e insuperável, que permite compreender desde onde e até que ponto a educação é um factor constitutivo dos indivíduos e das sociedades e que os próprios indivíduos e sociedades constituem.
Esta ideia, algo complexa, é essencial para compreender a "necessidade educativa", que as mentalidades atuais não parecem entender em toda a sua extensão.
A tendência em reduzi la a uma preparação técnica e profissionalizante limita o reconhecimento do direito e do dever de educar (e de ser educado) e limita a compreensão do carácter imperativo – pessoal e social – que efetivamente tem, teve e é indispensável que continue a ter.
De facto, no presente mais recente desloca-se o "dever de educar" para as margens do constitutivo da pessoa e da sociedade e, em alternativa (que o não é) destacam-se aspetos secundários do poder, do ter, do desejar, do conseguir e do parecer, enfim, dum prodigioso enredo de produção, onde a densidade ontológica se desvanece, esvaziando pessoas e sociedades.
Esquece-se que os atributos que imprimem identidade a umas e a outras necessitam da interiorização, sem a qual são as próprias pessoas e as sociedades que perdem conteúdo e possibilidade.
É preciso percebermos isto – o que, por via do educativo, somos e podemos ser, individual e colectivamente – para percebermos a raiz antropológica da educação.
Raiz que está tão dentro de nós, que, talvez por isso mesmo, as mais das vezes não damos conta dela.
João Boavida
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