Na senda de iluministas, racionalistas, humanistas, republicanos, democratas (a designação depende da época e do contexto intelectual), Helena Cidade Moura acreditou firmemente que a educação transformava a condição humana. Transformava-a no sentido da consciencialização e, em sequência, do exercício da liberdade.
Tal como João de Deus, entendeu que o ponto de partida era necessariamente a aprendizagem da leitura e da escrita. Porém, a batalha da alfabetização, que assumiu ao longo de décadas, entendeu-a "apenas" como um caminho que se abre e conduz à cultura erudita, a que todos, sem excepção, têm direito.
A sua morte recente poderia ter constituído um pretexto para nos determos nesta ideia tão simples, (aparentemente) óbvia, mas que é uma das grandes conquistas da Humanidade. Até porque, como todas as conquistas, não possui garantia de eternidade.
Saberão os leitores que não foi isso que aconteceu: cumpriram-se os votos de pesar e, de consciência tranquila, por aí nos ficámos. Merecia mais Helena Cidade Moura, que ainda há pouco tempo, entre a desilusão e a persistência disse, em entrevista, o que se segue:
- De que maneiras podem os autores clássicos entrar no quotidiano dos portugueses?
- A falta de cultura na generalidade da sociedade portuguesa é uma coisa gritante. Este trabalho que estamos a desenvolver no âmbito da alfabetização de adultos tem como tema "sem cultura não há desenvolvimento", para as pessoas perceberem que é precioso cultivarem-se para terem necessidade do desenvolvimento. Neste momento, nós estamos paralisados de intenções sociais. Cada um trata da sua vida o melhor que pode e acaba por aí a sua intervenção na sociedade e isto é uma maneira de ser muito difícil de remediar. Por isso, tenho a convicção que projetos como este desempenharão um papel importante no gosto pela leitura também dos clássicos.
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3 comentários:
A educação é uma condição necessária, mas infelizmente não é uma condição suficiente. Por exemplo: o nazismo surgiu na Alemanha, um país culto, e muitos nazis tinham um elevado nível educacional e gostos inteletualmente refinadíssimos (Kant, Bach, Goethe, etc.).
Haverá algo que possa ser essa condição suficiente?
Estimado leitor Carlos Pires
A apreensão que enuncia é um dos frutos mais inquietantes do nazismo. E, alertados que ficámos, percebemos que não é exclusivo dele. Após séculos a cantarem-se os inquestionáveis benefícios da educação na formação da bondade e da felicidade, eis que nos deparamos com essa verdade incómoda: a educação não é condição suficiente, ou a educação que inventámos não é condição suficiente. Sobre o assunto, transcrevi um texto de quem tem pensado no assunto:
http://dererummundi.blogspot.pt/2010/06/os-ideologos-sao-perigosos.html
Cordialmente,
Helena Damião
Professora Helena Damião;
O seu post mostra-nos como muitas vezes se confunde cultura com civilização; e isto esta tão arreigado nas pessoas que individualidades como Helena Cidade Moura também cometem esse erro; deixo para esclarecimento, uma transcrição da conferencia A Cultura Integral do Individuo do Professor Bento de Jesus Caraça;
“(…) Não deve também confundir-se cultura com civilização.
O grau de civilização de um povo mede-se pela quantidade e qualidade dos meios que a
sociedade põe à disposição do indivíduo para lhe tornar a existência fácil; pelo grau de
desenvolvimento dos seus meios de produção e distribuição; pelo nível de progresso dos
seus meios de produção e distribuição; pelo nível de progresso científico e utilização que
dele se faz para as relações da vida económica.
O seu grau de cultura mede-se pelo conceito que ele forma do que seja a vida e da
facilidade que ao indivíduo se deve dar para a viver; pelo modo como nele se compreende e
proporciona o consumo; pela maneira e fins para que são utilizados os progressos da ciência;
pelo modo como entende a organização das relações sociais e pelo lugar que nelas ocupa o
homem.
Assim, um povo pode ser civilizado e não ser culto e vice-versa. Não pode, por
exemplo, comparar-se o nível desenvolvido de civilização do povo americano actual com o
incipiente do povo ateniense do período áureo, como não podem também comparar-se os
seus respectivos graus de cultura, muito superior o deste ao daquele (1). Entre um Péricles e
um Hoover medeia uma distância enorme, aquela mesma que separa o povo que aplicava a
lei do ostracismo para evitar que um indivíduo influente pudesse exercer coacção sobre a
liberdade dos cidadãos, daquele outro povo em que há anos foi possível que um grupo de
homens metesse outro homem, porque era revolucionário, dentro de uma gaiola e o andasse
mostrando de terra em terra, a tanto por cabeça.
”
(1) Fala-se, evidentemente, do tipo médio da classe superior num ou noutro caso. se nos reportarmos às classes inferiores, não sei se haverá grande
diferença entre a condição de um negro das plantações de algodão e a de um escravo grego, fosse ele escravo de um Aristóteles...
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