“ Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades” – ditado popular.
Uma vez mais, através de uma recente e polémica entrevista publicada na Revista Lusófona da Educação, cumpriu-se o ditado em epígrafe. E deu-se cidadania portuguesa à máxima latina que em Portugal encontrou residência: Vox populi, vox Dei. Com a ressalva, apenas, de se substituir a palavra “comadres” pelos nomes dos camaradas José Sócrates e Ana Benavente, secretária de Estado da Educação no consulado de António Guterres (1995-2001).
Neste meu jeito de acreditar piamente que “a voz do povo é a voz de Deus”, ocorre-me agora um outro aforismo: “Diz o roto ao nu: por que não te vestes tu?” Mutatis mutandi: dirigindo-se publicamente a Sócrates, acusa Benavente o autoritarismo do PS liderado por Sócrates de ultrapassar o “centralismo democrático” de Lenine. Ora, quem sou eu para a desdizer ou apenas tomar partido neste pomo de discórdia que saltou para a opinião pública com um estrondo que pode ficar nos tímpanos dos leitores e na memória crítica dos portugueses?
Posso, porém, testemunhar (já o fiz em escritos anteriores) os processos pouco ou nada democráticos de Ana Benavente quando sobraçava a pasta de secretária de Estado da Educação, então sob a égide do cordato ministro da Educação Guilherme d’Oliveira Martins. Assim, quando constava nos bastidores que, para além do já discutível acesso ao 2.º ciclo do ensino básico, seria alargada a docência do 3.º ciclo a licenciados pelas Escolas Superiores de Educação, sendo eu, ao tempo, presidente da Assembleia Geral do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados, a respectiva direcção nacional pediu uma audiência a Ana Benavente tendo por base saber a veracidade ou não desta intenção. Fazendo ela jus à proverbial ambiguidade dos políticos quase se fechou num mutismo cúmplice. Voltei à carga, chamando a sua atenção para o facto de a Lei de Bases do Sistema Educativo contemplar essa docência apenas a diplomas outorgados pelos muros universitários. Assumindo um ar agastado, pouco democrático, retorquiu: “Mas a lei muda-se de um dia para o outro!"
Ou seja, fiquei a saber que contra factos não há argumentos por parte de quem se fez vestal de um altar assente no dogma de a qualidade do ensino estar na razão inversa da exigência formativa dos respectivos docentes. E isto foi mais grave pelo facto de, na altura, o número de docentes com diplomas universitários, com destino ao magistério, ser excedentário relativamente à respectiva procura tornando-os, assim, alvo do espectro do desemprego.
Aqui chegado, tenho para mim que um dos males deste país reside precisamente na ligeireza com que se fazem e desfazem reformas, se promulgam e derrogam leis (em demente autofagia!), quer elas sejam boas ou más, justas ou injustas, em prosa escorreita ou em deficiente redacção (António Almeida Santos, alta figura do PS, denunciou: “As novas leis portuguesas chumbavam na instrução primária”).
Não se desse o facto de se tratar de um violento libelo acusatório de Ana Benavente, eu até poderia tomar como simples grito de alma a sua evocação da “falta de ética democrática e republicana [do PS] na vida pública e na governação’". Mas assim, mais me parece uma zanga de dirigentes políticos desavindos que, a exemplo dos alcatruzes da nora, se alternam no poder dentro do mesmo partido dando razão ao escritor brasileiro Millôr Fernandes quando definiu a diferença entre democracia e ditadura: “Democracia é quando eu mando em você; ditadura é quando você manda em mim”.
O que deveria ser uma mera questão interna do PS foi por vontade de Ana Benavente publicitado de modo a que ela desempenhasse o papel de prima-dona num palco em que tinha ficado na mais negra penumbra. Depois do baixar do pano deste triste e pecaminoso espectáculo, permanece, isso sim, uma denúncia que merece ser ajuizada pelos portugueses em todos os seus contornos que ultrapassam as personagens de Sócrates e Benavente para pôr em causa o próprio partido político a que ambos pertencem, num Estado que se diz democrático! Mas não basta apregoar esta palavra mágica para que ela se transforme numa realidade. Haja em vista a antiga Alemanha de Leste, apelidada de República Democrática Alemã até à queda do Muro de Berlim.
Uma vez mais, através de uma recente e polémica entrevista publicada na Revista Lusófona da Educação, cumpriu-se o ditado em epígrafe. E deu-se cidadania portuguesa à máxima latina que em Portugal encontrou residência: Vox populi, vox Dei. Com a ressalva, apenas, de se substituir a palavra “comadres” pelos nomes dos camaradas José Sócrates e Ana Benavente, secretária de Estado da Educação no consulado de António Guterres (1995-2001).
Fez esta figura mediática socialista a acusação que serve de título a um artigo de Nuno Simas no Público (07/02/2011): “Autoritarismo do PS de Sócrates ultrapassa ‘centralismo democrático’ de Lenine”, tendo por pano de fundo argumentativo “os sete pecados mortais do PS” (id.; ibid.) , a saber:
1. “Adoptou ‘políticas neoliberais e, portanto, abandonou a matriz ideológica socialista’;
2. ‘Autoritarismo interno e ausência de debate, empobrecendo o papel do PS no país’;
3. ‘Imposição de medidas governativas como inevitáveis e sem alternativa, o que traduz dependências internacionais não assumidas nem claificadas para o presente e o futuro’;
4. ‘Marketing político banal e constante, de par com uma superficialidade nas bandeiras de modernização da sociedade portuguesa’;
5. ‘Falta de ética democrática e republicana na vida pública e na governação’;
6. ‘Sacrifício de políticas sociais construídas pelo próprio PS em fases anteriores’;
7. ‘Falta de credibilidade, quer por incompetência quer por hipocrisia, dando o dito por não dito em demasiadas situações de pesadas consequências”.
Neste meu jeito de acreditar piamente que “a voz do povo é a voz de Deus”, ocorre-me agora um outro aforismo: “Diz o roto ao nu: por que não te vestes tu?” Mutatis mutandi: dirigindo-se publicamente a Sócrates, acusa Benavente o autoritarismo do PS liderado por Sócrates de ultrapassar o “centralismo democrático” de Lenine. Ora, quem sou eu para a desdizer ou apenas tomar partido neste pomo de discórdia que saltou para a opinião pública com um estrondo que pode ficar nos tímpanos dos leitores e na memória crítica dos portugueses?
Posso, porém, testemunhar (já o fiz em escritos anteriores) os processos pouco ou nada democráticos de Ana Benavente quando sobraçava a pasta de secretária de Estado da Educação, então sob a égide do cordato ministro da Educação Guilherme d’Oliveira Martins. Assim, quando constava nos bastidores que, para além do já discutível acesso ao 2.º ciclo do ensino básico, seria alargada a docência do 3.º ciclo a licenciados pelas Escolas Superiores de Educação, sendo eu, ao tempo, presidente da Assembleia Geral do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados, a respectiva direcção nacional pediu uma audiência a Ana Benavente tendo por base saber a veracidade ou não desta intenção. Fazendo ela jus à proverbial ambiguidade dos políticos quase se fechou num mutismo cúmplice. Voltei à carga, chamando a sua atenção para o facto de a Lei de Bases do Sistema Educativo contemplar essa docência apenas a diplomas outorgados pelos muros universitários. Assumindo um ar agastado, pouco democrático, retorquiu: “Mas a lei muda-se de um dia para o outro!"
Ou seja, fiquei a saber que contra factos não há argumentos por parte de quem se fez vestal de um altar assente no dogma de a qualidade do ensino estar na razão inversa da exigência formativa dos respectivos docentes. E isto foi mais grave pelo facto de, na altura, o número de docentes com diplomas universitários, com destino ao magistério, ser excedentário relativamente à respectiva procura tornando-os, assim, alvo do espectro do desemprego.
Aqui chegado, tenho para mim que um dos males deste país reside precisamente na ligeireza com que se fazem e desfazem reformas, se promulgam e derrogam leis (em demente autofagia!), quer elas sejam boas ou más, justas ou injustas, em prosa escorreita ou em deficiente redacção (António Almeida Santos, alta figura do PS, denunciou: “As novas leis portuguesas chumbavam na instrução primária”).
Não se desse o facto de se tratar de um violento libelo acusatório de Ana Benavente, eu até poderia tomar como simples grito de alma a sua evocação da “falta de ética democrática e republicana [do PS] na vida pública e na governação’". Mas assim, mais me parece uma zanga de dirigentes políticos desavindos que, a exemplo dos alcatruzes da nora, se alternam no poder dentro do mesmo partido dando razão ao escritor brasileiro Millôr Fernandes quando definiu a diferença entre democracia e ditadura: “Democracia é quando eu mando em você; ditadura é quando você manda em mim”.
A terminar, pedindo de empréstimo uma frase de Eça, de todo este triste espectáculo público entre pares do PS “não me ficou a impressão de uma ideia, mas só a lembrança de uma atitude”. Ou, melhor dito, de um incontido despeito por maior que tenha sido a razão que o motivou!
12 comentários:
“Aforismo”. A palavra certa é “aforismo”, nome masculino. “Aforisma” não existe enquanto substantivo. “Aforismo” poderá ser, talvez, uma conjugação do verbo “aforismar”, aceite por alguns dicionários.
Prezado autor do comentário sobre a palavra"aforisma":
Antes de tudo, grato pela atenção cuidada dispensada ao meu "post". Apresso-me a fazer a devida correcção de uma palavra que é, de facto, um substantivo masculino.
Como substantivo do género feminino o seu significado é completamente diferente e, como tal, desajustado do contexto em que foi por mim utilizado. Cumprimentos cordiais.
Para lá das polémicas do PS, do socialismo, de Sócrates e de Ana Benavente, será que me podem dar uma pista porque é incorrecto, atendendo ao género, dizer-se POETIZA, mas devendo optar-se apenas por POETA, e porque continua a dizer-se ESCRITORA, e não apenas ESCRITOR, seguindo a mesma ordem de ideias.
Aquando da primeira vitória de José Sócrates à frente do partido socialista fiz, enquanto anónimo cidadão, chegar à página do partido, via "mail", a intenção de votar socialista, caso tivesse a certeza de que Ana Benavente não integraria nunca o governo, mormente em qualquer sector ligado à educação.
Mal sabia eu que outros haviam de praticar "tão diligentemente" o que fora a sua eficiência e adequação naquele sector...
Mais uma que mais valia ficar calada (para) o resto da vida.
Mas, como cheira a fim de ciclo, lá estão os alpercateiros do costume a chegarem-se à linha da frente.
Admito, porém, que a próxima "travessia do deserto" lhes seja morosa.
Assim a(s) alternativa(s) compensasse(m)...
Caro Rui Baptista,
Mais uma vez em cheio. Concordo inteiramente consigo.
Caro Fernando Torres:
Não sou um especialista em linguística. Apenas, um simples amante (aquele que ama) de uma forma de escrever, tão correcta quão possível, influenciada, segundo penso, por escritores portugueses do século XIX, com realce para Eça.
Habituado que estou, desde a minha juventude, em consultar livros e dicionários, julgo que uma visita ao “Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa” (Tomo XiV, p. 6427) muito o ajudará a desfazer dúvidas sobre este assunto.
Assim: poeta, “escritor que compõe poesia”; poetisa, “pessoa do sexo feminino que faz poesia”. Por outro lado, poetiza é um termo antigo, de etimologia latina, alíás como poeta e poetisa, do século XVIII (caído em desuso) que definia o cantor lírico, o trovador, o vate, o versejador, etc.
Daqui pode-se concluir, entendo eu, que o termo actual para definir uma escritora que faz poemas é o de poetisa.
Vejamos então como o 7 é polissémico, e de como Ana Benavente lhe acrescentou nova interpretação.
Muita da pouca vergonha que são as escolas públicas hoje em dia e, para ser franco, também algumas privadas, deve-se, em grande medida, a políticas desta senhora e dos que a acompanharam no Ministério que se diz da Educação.
Por este ministério têm passado dois tipos de governantes: os que estão-se "nas tintas" para o ensino e as escolas e poderiam estar no Ministério da Educação, do Ambiente, da Agricultura ou no das "Inaugurações, Corta-Fitas e do gasta à vontade que o contribuinte paga, se não for o de cá, há-de ser o da Alemanha" que que a diferença seria nula (e assim se percebe como eles saltam de ministério para ministério, dada a sua competência) e aqueles que são os "especialistas" da educação e esses é que são verdadeiramente perigosos porque esses convencidos que sabem do que falam, mesmo que não entrem numa escola básica ou secundária há algumas décadas, a trabalho entenda-se, não para actividades mais ou menos recreativas, fazem reformas que se sucedem baseadas em teorias que misturam a psicologia, a filosofia, a política e a sociologia e curiosamente os resultados estão à vista de todos.
Meu Caro João:
Da transcrição que faz no seu comentário, retive que “o número 7 é com certeza o mais presente em toda a filosofia e literatura sagrada desde tempos imemoriais, até aos nossos dias”.
Ficou o nome de Ana Benavente (tristemente) conhecido com secretária de Estado da Educação. Passou agora ela a fazer parte dessa evidência histórica com o seu texto, badalado pelo país inteiro, em que apresenta os sete pecados mortais do PS e, em pesca de arrasto, de José Sócrates.
Apenas uma dúvida! Como qualificar o seu texto? Filosófico? Literário? Sagrado? Ou, simplesmente, o canto do cisne de quem foi posta na prateleira de pessoas não gratas do 1.º Ministro?
Neste mundo de Cristo, embora correndo o risco improvável de me enganar, não vejo José Sócrates como pessoa de dar a outra face!
Meus Caros José Batista da Ascenção e Fartinho da Silva (por ordem da publicação dos respectivos comentários):
Mais uma vez se fizeram combatentes (em cujas fileiras me arregimento honrado pela companhia) de uma campanha em defesa da Educação em que, muitas vezes, o clarim da razão ecoa na planície dos indeferentes. Sejam eles detendores de rédeas governativas, sem eles soldados cansados de lutar numa campanha de que se não descortina o final em prol de uma mesma causa.
Mas como diz o provérbio, "água mole em pedra dura..."!
Caro Anónimo (9.Fev.; 23:07):
É sempre com a alma retemperada de esperança que me deparo com comentários como os seus. Do seu comentário transcrevo o início ao pôr o dedo na ferida de um problema que agita o mar tumultuoso de reivindicações actuais: “Muita da pouca vergonha que são as escolas públicas hoje em dia e, para ser franco, também algumas privadas, deve-se, em grande medida, a políticas desta senhora e dos que a acompanharam no Ministério que se diz da Educação”.
Mas, verdade seja dita, a transcrição que faço incide na referência “à pouca vergonha que são as escolas públicas e, para ser franco, também, algumas privadas”. E esta sua franqueza é tanto mais louvável por hoje se ter caído no perverso maniqueísmo de assacar todo o mal às escolas públicas e o bem a todas as escolas privadas no esquecimento de haver escolas secundárias oficiais (antigos liceus) que são verdadeiros baluartes de um ensino sério e profícuo lutando desesperadamente por inverter a má preparação anterior de alunos que lhes franqueiam as portas. E, por acréscimo, dando razão às universidades de prestígio que se queixam de idêntico mal.
Vivemos um tempo que neste verdadeiro “marketing” de louvor se esquece que há escolas privadas de qualidade duvidosa que se enchem por ser chique ter os filhos a estudar (de graça) nesses estabelecimentos de ensino fazendo concorrência a colégios privados não convencionados que pela sua real qualidade fazem com que alguns pais continuem a fazer (e eles bem sabem porque o fazem!)sacrifícios de equilíbrio financeiro em prol da formação dos seus filhos.
Mas pior do que isso, assiste-se hoje ao perigo da degradação e do desemprego (espectro que não atinge apenas os docentes dos colégios) dos professores do ensino oficial, pela baixa de natalidade da população portuguesa, e à injustiça gritante que leva ao esquecimento de antigos liceus de elevadíssimo prestígio que muitas das actuais escolas secundárias sua herdeiras fazem verdadeiros milagres em manter, pese embora os condicionalismos actuais em que se confunde a democratização do ensino com a sua mediocratização.
Mas esta é apenas a ponta de um icebergue que não deve ser perspectivado, mais uma vez o digo, facciosamente de forma maniqueísta. Como tudo na vida, há escolas oficiais boas e más e há colégios convencionados de impoluta qualidade e outros não. Esta a razão deste meu comentário em defesa de um ensino oficial com excelentes e briosos professores e resultados que muito os honram! E que, por isso, merecem que a sociedade lhes seja reconhecida.
Caro Rui
O meu comentário não é classificável em nenhum campo, apenas um divagatório sobre as verdades e inverdades do número sacro-profano 7, vasculhado no sótão das coisas passadas consagradas e cujo repositório ficou enriquecido pela Ana Benavente com a variante de outros 7 pecados capitais. O 7 aparece não riscado porque antigamente, quando se discutiam quais deveriam ser os pecados, ao chegar ao sétimo que dizia “não cobiçarás mulher alheia”, os sábios mandaram riscar, mas hoje, dada a dificuldade da sua consagração…
Aproveito a oportunidade para apresentar o contraditório às verdades insofismáveis da Ana Benavente na voz do não menos insofismável Assis que rejeita acusações de autoritarismo no PS, no local mais apropriado A Bola, pois é aí que se discute de que lado está a bola, já que o acesso à Revista Lusófona de Educação lhe deve estar vedado.
Trata-se assim de um combate desigual entre as pessoas, os tipos de publicações e os assuntos, i.é, educadora v. político, revista v. jornal, e educação v. política.
Se me permite, sugeria que em vez da fotografia da Ana Benavente, o substituísse pelo quadro de Ieronimus Bosch Os sete pecados capitais, por me parecer mais adequado à categoria do De Rerum Natura.
Um abraço
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