quarta-feira, 23 de maio de 2018

Parecer do Conselho de Escolas relativo ao projecto de decreto‐lei que estabelece o currículo do ensino básico e secundário

Por solicitação do Ministro da Educação, o Conselho das Escolas elaborou um parecer relativo ao projecto de decreto‐lei que “estabelece o currículo do ensino básico e secundário, os princípios orientadores da sua conceção, operacionalização e avaliação das aprendizagens". Tal normativo substituirá o Decreto‐Lei n.º 139/2012, de 5 de Julho, que vai fazer quatro anos de vigência.

Nesse parecer, aprovado em 10 de Maio, e em síntese, o Conselho das Escolas esclarece a sua posição em oito pontos:
1. O novo modelo de organização e gestão curricular não assegura às Escolas a autonomia e as possibilidades de flexibilidade do currículo que se anunciam. Tal como tem acontecido nas últimas décadas, as iniciativas de flexibilidade e autonomia das Escolas continuarão a  depender, em muito, dos recursos disponíveis e das normas que  regulam a sua gestão. As Escolas continuarão manietadas e dependentes dos meios que outros, momento a momento, decidirem conceder‐lhes.  
2. Para as Escolas ganharem a autonomia e a flexibilidade curricular, referidas ao longo de todo o projeto em apreciação, não seria necessário proceder a uma revisão curricular, nem sequer a uma  alteração legislativa, bastaria um ato administrativo que permitisse às  Escolas criarem os “domínios de autonomia curricular” e gerirem 25% do currículo, como aliás aconteceu com a publicação do Despacho n.º 5908/2017, de 5 de julho (PAFC). 
3. Na verdade, o atual quadro legislativo (Decreto‐Lei n.º 139/2012), as suas disposições de organização e gestão curricular e as matrizes  curriculares em vigor não impedem que as Escolas possam gerir o currículo com a flexibilidade  que agora se preconiza, tal como não impediram que, em 2017/2018, mais de duzentas Escolas o pudessem fazer. 
4. As Escolas nunca poderão almejar a qualquer reforço da respetiva autonomia curricular sem o concomitante reforço de autonomia administrativa e de gestão de recursos humanos, materiais e financeiros. 
5. As matrizes curriculares do ensino básico prescrevem um acréscimo de novas componentes/disciplinas, de que resultará uma maior e  desnecessária fragmentação do currículo. Desnecessária, note‐se, porque as aprendizagens a realizar nestas novas disciplinas poderiam  concretizar‐se nas que existem atualmente, nomeadamente no Apoio  ao Estudo, na Oferta de Escola e na Oferta Complementar, sem necessidade de introduzir tal segmentação. 
6. A redução da burocracia, a necessária clareza conceptual das  normas de organização curricular, o respeito pelas Escolas e a defesa  da sua autonomia  aconselham a supressão do articulado da Secção II (art.º 18.º a 22.º). 
7. Este projeto de revisão curricular decalca as matrizes, muitas das normas e dos mecanismos previstos no Despacho n.º 5908/2017, de 5 de julho (PAFC), que está a ser aplicado num significativo número  de Escolas do país. O Conselho das Escolas entende que a eventual generalização de uma revisão curricular que tem como base o PAFC, nunca deverá ocorrer sem que o regime experimental deste projeto esteja devidamente concluído e, consequentemente, tenha sido  avaliado o seu impacto.  
8. Contrariamente ao PAFC ‐ cujo valor enquanto mecanismo de  reforço da flexibilidade e da autonomia curricular, reside, precisamente, no facto de ser um projeto de adesão voluntária e, em alguns casos, entusiasta de muitas Escolas ‐ o projeto curricular em  apreciação será, ab initio, a expressão contrária do que se advoga, uma vez que interfere em muitas áreas e decisões tomadas no âmbito da autonomia e dos Projetos Educativos em curso, sem que se vislumbre qualquer necessidade ou benefício para o sistema educativo.

1 comentário:

Anónimo disse...

Perante isto, os responsáveis da Sociedade Portuguesa de Física não podem continuar mudos e quedos. Os matemáticos dizem:
"...O projecto de decreto-lei visado nesta consulta pública, no seu todo, acentua essa desvalorização, a) ao modificar o currículo em vigor por outro em que se desinveste no conhecimento, reduzindo-o a um mínimo insuficiente para levar os alunos a patamares de autonomia na ação e no desenvolvimento do raciocínio; e ao colocar continuamente a tónica na prática, no aplicável e no concreto...".
Compete à Física, e demais ciências naturais, colocar "a tónica na prática, no aplicável e no concreto". Se os senhores matemáticos não concordam, então deixem os físicos lecionar matemática, disciplina na qual temos muito melhor preparação matemática do que a dos matemáticos em Física!
Quanto aos senhores governantes, assumam, de uma vez por todas que, no ensino que pretendem implantar à martelada, os diplomas valem muito mais do que quaisquer conhecimentos, por poucos que sejam, que se possam aprender na escola, e mandem os professores para casa, incluindo os de Portugês e Matemática, que não são mais do que os outros!

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião   Cristiana Gaspar, Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação,...