quarta-feira, 2 de maio de 2018

Amanhã: "Sagração da Primavera" no TAGV em Coimbra, com entrada livre


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Minhas respostas a Marina Ferreira, do jornal académico A CABRA, sobre a conferência - concerto de amanhã em Coimbra sobre a "Sagração da Primavera" de Stravinsky:

- Em que consistirá a sua intervenção:

Antes de a Orquestra Metropolitana de Lisboa (grupo de percussão) tocar, a 3 de Maio, 15 horas, no TAGV a "Sagração da Primavera" do compositor de origem russa Igor Stravinsky darei uma breve palestra, em que, para além de apresentar o autor e a obra, colocando-a no quadro da época em que foi escrita (início do século XX), falarei das relações entre música e ciência.

Chamarei a atenção para o facto de a obra, considerada a música mais revolucionária do século, ter sido estreada em Paris no ano de 1913, precisamente no mesmo ano em que foi publicado o modelo atómico de Niels Bohr, um dos desenvolvimentos mais revolucionários da física do século passado. No ballet "Sagração da Primavera" interpretado pelos famosos "Ballets Russos" havia uma música e uma coreografia modernas, que muitos acharam estranhas, tão estranhas que houve quase um motim de um certo sector do público  na estreia. Na teoria atómica de Bohr, que era um avanço da teoria quântica, também havia motivos para estranheza: os electrões do  átomo só podiam ocupar certas órbitas e as emissões ou absorções de luz só aconteciam quando havia saltos entre as órbitas. Mas, "primeiro estranha, depois entranha-se" (a expressão noutro contexto é de Fernando Pessoa). A música de Stravinsky acabou por triunfar assim como o modelo de Bohr, que com algumas modificações ainda hoje persiste.

- De que modo a ciência e a música se unem neste concerto-conferência?


Tanto na música como na ciência aconteceram mudanças profundas no início do século XX. E de resto nas artes não foi só na música: foi também o aparecimento de novas correntes artísticas nas artes visuais, como o cubismo, o futurismo e o surrealismo. Do mesmo modo, as mudanças na ciência não foram só a teoria quântica: foi também quase na mesma altura que Einstein criou a sua famosa teoria da relatividade, que veio substituir a mecânica clássica. Tal como noutras ocasiões da história, houve em vários domínios uma explosão de criatividade, um salto grande na imaginação. Sim, tanto na artes como na ciência é preciso imaginação. Mas há diferenças entre arte  e ciência. A primazia do ritmo relativamente à melodia e as surpreendentes mudanças rítmicas na obra de Stravinky resultam da sua imaginação. Já na ciência os "ritmos" atómicos são naturais: não são uma criação  da mente de Bohr. Mas Bohr precisou, sem dúvida, de imaginação para lá chegar.

- Qual é o público-alvo do concerto-conferência?


O concerto é aberto e gratuito. Mas espera-se que ao TAGV venham sobretudo jovens, quer da Universidade quer do Politécnico, que queiram conhecer melhor tanto a arte como a ciência. Que queiram ouvir a peça musical mais famosa do reportório erudito no século passado. A própria Orquestra é formada, em boa parte, por jovens, de modo que é um concerto de jovens para jovens. Venham ver a capacidade artística dos jovens da Orquestra, que misturados com profissionais, conseguem dar uma nova expressão  a uma música composta originalmente para orquestra, mas que aqui vai ser tocada apenas com instrumentos de percussão. Os sons vão ser todos resultados de batidas, o que reforça a estrutura rítmica da obra..

-  Quais são as suas expectativas relativamente adesão do evento?


Este concerto faz parte de um tour da Orquestra Metropolitana de Lisboa por várias instituições do país. Encheu na Universidade de Trás os Montes e Alto Douro, no Politécnico de Viseu e no Politécnico de Viana do Castelo. O ciclo intitula-se o "O Tempo e os Tempos da Sagração." Agora a Primavera vai passar por Coimbra: espera-se que a sala encha porque o público jovem de Coimbra gosta de música e este concerto é especial para eles.

2 comentários:

Petruska disse...

Estreia do bailado – 29 de maio de 1913, no Théâtre des Champs-Elysées.
O sacrifício de uma jovem, num ritual pagão. Ritmos violentos e atonalidade. Público chocado.

Stravinski explicou no Chronicle o que sentiu nessa noite:
“Tenho-me coibido de descrever o escândalo que provocou e que já foi demasiado discutido. A complexidade da minha partitura exigira um grande número de ensaios, que Monteux dirigiu com competência e atenção usuais. Quanto ao espetáculo em si, não estou em posição de avalia, pois saí da sala mal se ouviram os primeiros compassos do prelúdio, que logo evocaram risos trocistas . Senti-me revoltado . Essas demonstrações, inicialmente isoladas, não tardaram a generalizar-se, provocando contra-manifestações, que depressa degeneraram num terrível tumulto. Estive ao lado de Nijinski nos bastidores durante todo o espetáculo. Ele estava sentado numa cadeira a gritar “16, 17, 18” pois tinha um método próprio para contar o ritmo. Como é natural, os próprios bailarinos não conseguiam ouvir nada devido à balbúrdia na sala e ao som dos seus próprios passos de dança. Tive de agarrar Nijinski pela roupa porque ele estava furioso e prestes a irromper pelo palco dentro a qualquer minuto e a armar um escândalo. Diaghilev não parava de gritar ordens aos eletricistas para acenderem e apagarem as luzes, na esperança de pôr cobro ao barulho desse modo. É só disto que me lembro sobre o primeiro espetáculo. Por estranho que possa parecer, durante o ensaio geral, para o qual convidámos, como era habitual, actores, pintores, músicos, escritores e os representantes mais cultos da sociedade, tudo decorrera pacificamente, pelo que estava muito longe de esperar semelhante tumulto.

Boucourechliev, André, trad. De Martin Cooper, Stravinski, Victor Gollanez Ltd, 1987

“Quem compreende melhor a minha música são as crianças e os animais”, Igor citado em "The Observer", 1961

Macabre disse...

https://youtu.be/w0Tvj83xqDw

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