terça-feira, 1 de maio de 2018

Dia do trabalhador ou dia do "precariado"?

Donskis"Há aqui um vácuo moral criado por uma 
tecnologia que se sobrepôs à política (...) 
BaumanTanto quanto sei, foi o professor e economista 
Guy Standing que (acertando em cheio) cunhou o termo 
"precariado" para substituir, ao mesmo tempo, os conceito 
de "proletariado" e "classe média", porque ambos ultrapassaram 
em muito o seu prazo de validade, tornando-se verdadeira e 
plenamente «termos zombies». como os classificaria Ulrich Beck"

Zygmunt Bauman e Leonidas Donskis, 2016, pp. 15 e 84


No passado dia 22 de Abril, o jornalista Pedro Curvelo, dava conta no jornal online Negócios de um relatório do Banco Mundial (ver aqui) recentemente disponibilizado e ainda em forma de documento de trabalho. O seu título é "The changing nature of work" ("A mudança da natureza do trabalho") e reporta-se ao próximo ano de 2019.

O título do artigo de Pedro Curvelo é suficientemente chamativo para despertar curiosidade: "Banco Mundial propõe baixar salários mínimos para enfrentar robôs". Escreveu ele:
O Banco Mundial propõe a redução dos salários mínimos e mais facilidades na contratação e despedimentos como forma de minimizar a ameaça que a automatização da economia constitui para o mercado de trabalho. 
Tendo em conta que substituir trabalhadores por máquinas reduz custos (...) uma boa forma de combater o "avanço dos robôs" seria reduzir os salários mínimos e flexibilizar as leis laborais, facilitando os despedimentos (...) o Banco Mundial sublinha que a ameaça das tecnologias para o emprego é "largamente exagerada" (...). O documento admite que a automatização irá provocar perda de postos de trabalho nalguns sectores, mas sublinha que irá criar outros empregos, destacando a necessidade de requalificação dos trabalhadores afectados. Uma das soluções para minimizar o impacto da automatização e uso de robôs no mercado laboral passa por limitar os aumentos, ou mesmo reduzir ou extinguir, os salários mínimos (...). Os pressupostos para a existência de um salário mínimo – garantir um rendimento para um nível de vida com um mínimo de dignidade – podem ser assegurados através de mais apoios dos Estados aos mais carenciados, argumentam. O documento frisa que elevados salários mínimos geram mais custos e reduzem os níveis de emprego (...) os empregadores deverão ter maior liberdade para a contratação e despedimento de trabalhadores, com leis laborais mais flexíveis, e a redução das indemnizações por despedimento.
Consultei o relatório e, sim, isto está lá e está muito mais. Está, por exemplo, amplamente desenvolvido o conceito de "capital humano" e como pode ser criado e optimizado. A linguagem é arrebatadora, qualquer trabalhador, muito qualificado ou sem qualificação especial, se deixa enredar nas palavras, por isso num futuro não muito distante talvez o Primeiro de Maio passe a ser o "dia do precariado" em vez do "dia do trabalhador".

Bauman, Z. & Donskis, L. (2016). Cegueira moral. Lisboa: Relógio D`Água.

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