quarta-feira, 17 de outubro de 2012

“O NÚMERO DE OURO”

Recensão primeiramente publicada na imprensa regional portuguesa.

O que é que têm em comum a bela distribuição das pétalas de uma rosa, as esplendorosas conchas em espiral dos moluscos, o famoso quadro de Salvador Dali “o Sacramento da Última Ceia”, a reprodução dos coelhos e a forma das galáxias? O “número de ouro”.

O “número de ouro”, igual a 1,6180339887…(uma dizima infinita não periódica) é comummente identificado pela letra grega fi (ϕ), a primeira letra do nome Fídias, escultor grego (c. 490 a c. 430 a.C.) cujas esculturas terão sido supostamente influenciadas pela proporção indicada pelo “número de ouro”.

Esta ligação entre a matemática e as artes é muito mais comum e antiga do que normalmente temos presente, remontando seguramente à civilização jónica. O “número de ouro” tem fascinado não só artistas plásticos mas também biólogos, físicos, astrónomos, músicos, historiadores, arquitectos, psicólogos, filósofos, místicos, entre outros. De facto, o "mistério" da frequência com que este número aparece ao longo da vida inspirou e influenciou pensadores de todas as disciplinas como nenhum outro na história da matemática.

O “Número de Ouro” é também o título no novo volume (n.º 195) da incontornável colecção “Ciência Aberta, da editora Gradiva que o acaba de publicar. Com a autoria do astrofísico Mario Livio (do Instituto de Ciência do Telescópio Espacial Hubble), “O Número de Ouro – a história de Φ , o número mais assombroso do mundo”, recebeu o Prémio Internacional Pitágoras - Peano - para melhor livro de divulgação matemática. Este livro é de facto fascinante e está escrito de uma forma muito cativante.

Mario Livio vai muito para além de descrever as propriedades matemáticas, geométricas, associadas ao número de ouro. Ao longo de nove capítulos (1 - Prelúdio a um número; 2 - A frequência e o pentagrama; 3 - Debaixo de uma pirâmide a apontar para as estrelas?; 4 - O segundo tesouro; 5 - Filho afortunado; 6 - A divina proporção; 7 - A liberdade poética também é um direito dos pintores; 8 - Dos mosaicos aos céus; 9 - Deus será matemático?), o autor guia-nos através da história da matemática e da humanidade, numa linguagem sóbria e fluída, contida no entusiasmo que o número desperta constantemente.

Mario Livio desmistifica e desmonta inúmeras associações, forçadas, erradas, documentadas em fontes dúbias ou mesmo inexistentes, e que existem na literatura sobre a presença do “número de ouro” em várias obras de arte e arquitectónicas da história da humanidade. Através de uma análise rigorosa às fontes e aos argumentos que vários autores usaram ao longo da história do “número de ouro”, o autor deste livro eleva-nos ao interesse genuíno sobre este número de forma arrebatadora e despojada de falsa ciência.

O astrofísico escreve no primeiro capítulo do livro (Prelúdio a um número) que o objectivo de nos ajudar a obter alguns conhecimentos sobre as bases daquilo a chama a “numerologia de ouro” assim como o de transmitir o lado humano que sempre esteve presente na história deste número, norteou a sua escrita.

Para Roger Penrose, emérito matemático da Universidade de Oxford, este livro é “um trampolim maravilhoso para o extraordinário mundo da matemática e da sua relação com o mundo físico tal como encarado da Antiguidade aos tempos modernos”. 

Ao sabor de inúmeras histórias, e à “boleia” do “número de ouro”, Mario Livio consegue transmitir de forma simples inúmeros conceitos e elementos que são fundamentos de várias áreas da matemática. Ao descrever as propriedades implícitas no “número de ouro”, faz um apelo à nossa atenção para mundo à nossa volta e usa a matemática para salientar a sua beleza e o fascínio, o espanto, que as coisas misteriosas sempre despertaram na mente humana. 

Recomendável, ou mesmo imprescindível, para mostrar o quanto a matemática é útil para o conhecimento do cosmos e como ela está presente na sua beleza.

António Piedade

Ficha bibliográfica:
O Número de Ouro - A história de Fi, o número mais assombroso do mundo
Autor: Mario Livio
Editora: Gradiva
Colecção: Ciência Aberta
Páginas: 392
Ano de edição: 2012
ISBN: 978-989-616-496-6
Capa: Brochado (capa mole)

6 comentários:

José Batista disse...

Ah, eu bem esperava por António Piedade.
Agora veja lá se, depois deste texto, fica muito tempo "ausente".

António Piedade disse...

Caro José Batista
Mais uma vez muito obrigado pelas suas palavras generosas.
Encherei a ausência com escrita assim que possível.
Um abraço
António Piedade

Augusto J. F. Oliveira disse...

Seria bastante conveniente a menção do nome do tradutor
(quem é, o que faz) e, se possível, um comentário sobre a qualidade
da tradução.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Gosto! Realmente gosto, quando encontra-se a palavra certa para expressar, traduzir e refletir sobre a dimensão ou, de outros, assim a bem queira da importante acolhida a ciência. É, que certamente o nível exigido atualmente para formação, reveste em primoroso princípio os cientistas, preparando-os acerca deste milênio.

Ontem teve a oportunidade de moderar sobre a América e propriamente questões do Ocidente em TV aberta, aqui no Brasil o escritor Vargas Llosa. E, fora de certa forma, conceitual; chamara a atenção e prodigioso da abertura (enfrentamento) que tivera a respeito da Royal Academia, defendendo-a através de esclarecimento e princípios, pois o escritor instigara a arte em advertência.

É claro, algo seria necessário, face a presença de valor. Esta entrevista de ontem, demarca a notoriedade e importância de assuntos que nem passam a margem do desconhecido.

Ildefonso Dias disse...

Professor Augusto J. F. Oliveira, não me apercebi que o senhor era um leitor do blog DRN.

Para mim isso é motivo de enorme satisfacão.
O Senhor foi assistente dos grandes mestres Santos Guerreiro e José Sebastião e Silva.
Peco-lhe por isso que, sempre que possa, deixe-nos aqui o seu testemunho desses exemplos maiores que eles foram. O país bem precisa de bons exemplos.

Obrigado.

António Piedade disse...

Por lapso não indiquei o nome do tradutor: João Nuno Torres. Revisão do texto por Helena Ramos.

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