"As crianças finlandesas de hoje estarão entre os profissionais mais bem preparados do mundo de amanhã". Assim começa uma recente notícia on-line em língua espanhola que sistematiza muito claramente os "ingredientes" do "milagre educativo" que tem acontecido no país nórdico cujos resultados obtidos no Programa Internacional de Avaliação dos Alunos (PISA) têm sido objecto de admiração mundial.
O "milagre", de milagre nada tem: muito "simplesmente", a Finlândia percebeu que deveria usar o pensamento e a investigação pedagógica disponível.
Estabeleceu uma clara filosofia para a educação formal, valoriza o conhecimento e, de modo consonante, adopta medidas de teor prático. E, por esta ordem, pois os responsáveis pela educação deste país perceberam que não é pelas medidas que se começa, mas pela definição de princípios norteadores.
A filosofia educativa, com a qual pode ou não concordar-se, traduz-se em duas ideias: (1) nenhum aluno pode ser deixado para trás, devendo fazer-se tudo o que é possível para que todos aprendam o mais possível; (2) a educação é fundamental para o bem-estar social e para o desenvolvimento do país.
Para cumprir estas duas ideias, entendeu-se que o conhecimento científico e técnico, artístico, humanístico... (a que se atribui valor) deve ser veiculado pela escola ou aí trabalhado.
As medidas, muitas delas decorrentes de dados da investigação pedagógica digna de crédito, surgem de seguida: (1) havendo processos maturacionais a considerar na aprendizagem, começar muito cedo a escolaridade não constitui qualquer vantagem; (2) a aprendizagem requer um ambiente escolar acolhedor e seguro sob o ponto de vista afectivo, pelo que o mesmo professor acompanha os alunos ao longo dos primeiros seis anos de escolaridade; (3) a quantidade de tempo passado na escola não se traduz em resultados de aprendizagem, pelo que o tempo de trabalho é destinado a trabalho, ainda que deva ser agradável; (4) o ensino, constitui um factor determinante na aprendizagem, pelo que os professores são devidamente seleccionados e preparados para serem excelentes; (5) a coerência educativa é levada a sério, pelo que a relação entre a escola, a família e a comunidade, mediada pelo conhecimento, é devidamente operacionalizada.
É certo que as sociedades do Norte e do Sul da Europa têm características distintas, mas também é certo que há uma década e meia a escola finlandesa não era exactamente igual à de hoje. É uma escola que se tem construído com ponderação e com atenção ao saber das ciências da educação.
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3 comentários:
Mas o título explica tudo. Pensar em soluções de futuro, não em ideias para o agora. Uma ponderação na educação, uma mudança de sistema educativo leva anos a interiorizar. O caso português é crítico, pois de quatro em quatro anos mudamos o nosso sistema, consoante toca a música eleitoral, assim dançamos todos, nunca conseguimos perceber se o sistema iria funcionar.
O sistema finlandês vem sendo preparado para o futuro, para que um dia atingissem a excelência, não é algo que se fez de um dia para o outro, existe um objetivo que as cores políticas não interferiram, apenas conduziram uma ideia que fora ponderada e debatida.
Comentário de Guilherme Valente:
No seu texto, Helena Damião enumera (bem) razões do sucesso da instrução na Finlândia (evidências que temos referido insistentemente).
Mas termina o seu texto com uma conclusão surpreendente, absolutamente absurda. Peço-lhe, por isso, que a explique, que nos diga qual o contributo das "ciências" da educação para o êxito da escola finlandesa, para as características, há muito fixadas, que indica como determinantes para esse sucesso.
Um êxito que, bem pelo contrário, resulta, com toda a evidência de um saber há muito sabido, assentando na mais elementar sensatez. Ou seja, que é o inverso de tudo, de toda a trapalhada obscurantista insaciável de experiências tontas que os nossos "cientistas" (a designação seria ridícula se não fosse trágica) da educação impuseram durante todos estes anos à escola portuguesa, conduzindo à hecatombe educativa que se sabe.
Guilherme Valente
De facto, senhor Guilherme Valente, as medidas tomadas não devem ter vindo da investigação pedagógica proveniente das ciências da educação. Deverão ter vindo, com certeza, da investigação pedagógica efetuada pelas ciências das pescas ou da agricultura...
Já todos compreendemos que tem um ódio visceral e irracional a tudo o que tenha a ver com pedagogia ou ciências da educação. No entanto, creio que talvez seja tempo de colocar a mão na consciência e mentalizar-se que no mundo da educação, tal como em todas as áreas da ciência, há bons e maus cientistas. Ao colocar todos no mesmo saco e ao os insultar constantemente está a prestar um péssimo serviço às escolas pois contribuí para a estagnação pedagógica que se vive neste país, em que a maior parte dos professores que criticam ferozmente tudo o que é novidade são aqueles que menos querem fazer e que são um péssimo exemplo para os alunos (com as devidas exceções, claro). E eu, ao contrário do senhor, sei do que estou a falar porque sou professor, já estive em várias escolas e leio muito sobre educação, o que me dá a capacidade, juntamente com a minha experiência profissional, de distinguir o que é boa ciência da educação do que é má ciência da educação.
Deste modo, talvez fosse tempo de aprender a moderar a agressividade do discurso, tomando uma atitude mais argumentativa que permitisse uma real e respeitosa troca de ideias. De facto, já por várias vezes tentei encetar uma discussão desta natureza colocando questões de um modo respeitoso para tentar compreender o pensamento do senhor e de outros membros deste blogue, e sempre que o fiz não obtive qualquer resposta.
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