sábado, 15 de setembro de 2012

Eça de Queiroz, a Política, os Políticos e os Imbecis


“Para a política o homem é um meio; para a moral é um fim. A revolução do futuro será o triunfo da moral sobre a política” (Ernest Renan, 1823-1892).

Numa altura em que a fazenda pública vai despudoradamente à bolsa dos contribuinte portugueses que transportam em ombros em chaga o andor de sacrifícios fiscais sem conta, eu não poderia deixar  de registar  a falta de tacto político do Primeiro  Ministro,  Dr. Pedro Passos Coelho, ao anunciar publicamente, no pretérito dia 7 deste mês,  um porvir  ainda mais desgraçado que espera o cidadão já de si deprimido por um final  de férias passado sem subsídio em soleiras das portas da própria casa. Pior do que isso, sabendo que vai enfrentar um novo ciclo de trabalho em que a jorna mal chega (ou não chega mesmo!) para enfrentar magérrimas despesas diárias.

Explico, agora e em detalhe, o porquê daquilo que tenho por falta de tacto político por parte do Dr. Passos Coelho. Quanto a mim, encontro fundamento na sua “conversa em família” em
 antevéspera do  Domingo em que se realizava  o encerramento da “Festa do Avante” (repleto de camaradas ou simples simpatizantes, e mesmo de uma assistência de outros ou nenhuns estratos políticos que não perdem festanças por nada deste mundo). Trata-se ela de uma festa anual política dos comunistasl, palco privilegiado para apelar, vibrantemente, e com aplausos  entusiásticos  de uma plateia já causticada por medidas gravosas para a sua economia doméstica.

Jerónimo de Sousa, que nada tem de parvo, convidado a jogar à bisca com um parceiro que lhe pôs todos os trunfos nas mãos, não se fez rogado a esta cereja em cima de bolo do seu discurso em que teve matéria de sobra para explorar a ocasião soberana,  que lhe era oferecida de bandeja,  para se atirar a Passos Coelho, como gato a bofe, e à sua política de contenção de despesas sem atingir verdadeiramente o grande capital e as "gorduras do Estado".

Escreveu Freud: “Um dia, quando olhares para trás, verás que os dias mais belos foram aqueles em que lutaste”. Receio bem que Passos Coelhos, quando olhar ainda que mesmo para o presente, veja que um dos dias mais desastrosos da sua vida foi quando fez o anúncio descuidado  de um futuro negro e sem esperança que pôs o país e os portugueses em polvorosa e ainda mais temerosos, ou mesmo apavorados, perante o dia de amanhã

Como se ouve para aí dizer, “há dias de manhã que uma pessoa à tarde não deve sair à noite”! Ora, Passos Coelho saiu  ao fim da tarde para fazer a sua desastrosa comunicação ao País. E voltou a sair nessa  noite  para assistir a um espectáculo comemorativo dos “50 anos de Carreira de Paulo de Carvalho”, numa das salas mais tradicionais do mundo do espectáculo lisboeta: o Teatro Tivoli. Aí fez uma entrada discreta, quiçá, para evitar entusiásticas aclamações que deslustrassem os aplausos ao homenageado dessa noite!

Sempre fiel ao meu escritor de eleição, Eça de Queirós, embora salvaguardando qualquer possível injustiça por mim involuntariamente cometida (por Deus, o juro!) para com políticos de eleição (não, não me refiro a todos aqueles políticos eleitos, por  todos eles o serem em obediência a princípios democráticos) , não resisto em transcrever este naco de prosa querosiana, de outrora que encontra guarida em  nossos dias:

“É extraordinário! Neste abençoado país todos os políticos têm ‘imenso talento’. A oposição confessa sempre que os ministros, que ela cobre de injúrias, têm, à parte os disparates que fazem, um ‘talento de primeira ordem’! Por outro lado, a maioria admite que a oposição, a quem ela constantemente recrimina pelos disparates que fez, está cheia de ‘robustíssimos talentos’! De resto todo o mundo concorda que o país é uma choldra. E resulta, portanto, este facto supra cómico: um país governado ‘com imenso talento’, que é de todos na Europa, segundo o consenso unânime, o mais estupidamente governado! Eu proponho isto, a ver: que, como os talentos sempre falham, se experimentem uma vez os imbecis!”

Julgo que muitos de nós, causticados por sermos governados por “talentos robustíssimos”, estaremos de acordo com o nosso Eça numa altura confinada às últimas décadas de má governação  e em que a confiança na maioria dos nossos governantes atingiu níveis preocupantes que põem em risco a nossa própria identidade como país obrigado a esmolar dinheiros vindos de uma aldeia global  também ela em grave crise económica ( mas que venha o primeiro iluminado, não adepto da teoria de “terra queimada”, que apresente para o país uma solução que não nos lance em maior e mais negra miséria em que se possam ir, para além dos anéis, os dedos!). Experimentem-se os imbecis, portanto!

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