terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Os perigos das «medicinas» tradicionais

Hoje constou numa série de jornais, nos Estados Unidos e não só, uma notícia da Associated Press que conta a história de Maria, uma texana de Houston que envenenou as suas filhas e uma sobrinha, felizmente sem consequências fatais, com um «mezinha» tradicional.

O «medicamento» em causa é a greta que os curanderos mexicanos garantem ser quasi uma panaceia, que supostamente cura hiperactividade em crianças, empacho ( aflições intestinais) e problemas estomacais, e que na realidade envenena quem a ingere já que é composta quase exclusivamente (cerca de 80%) por óxidos de chumbo.

Existem outros componentes da «farmacopeia» tradicional mexicana que são essencialmente compostos de chumbo como o azarcon, conhecido igualmente como Rueda, Coral, Maria Luisa, Alarcon ou Liga. Os sintomas do envenenamento com chumbo podem passar facilmente despercebidos, na realidade confundem-se com os sintomas das doenças que as «mezinhas» pretendem tratar, e, se não se fizerem testes específicos, são difíceis de despistar já que muitas vezes se resumem a cansaço, sonolência e dores de estomâgo.

Os departamentos de saúde um pouco por todo o território norte-americano indicam que as «medicinas» tradicionais utilizadas por emigrantes da América Latina, India e outras partes da Ásia, são a segunda maior causa de envenamento com chumbo - só ultrapassado por envenenamentos causados por tintas antigas que ainda contenham pigmentos deste metal pesado - e podem ser responsáveis por dezenas de milhares de casos análogos aos das crianças de Maria todos os anos.

Entre as «farmacopeias» tradicionais mais perigosas em termos de metais pesados encontra-se a usada na «medicina» ayurvédica, para cuja toxicidade o número de Dezembro de 2004 do Journal of the American Medical Association já tinha alertado. O estudo indicava que um em 5 dos «medicamentos» ayurvédicos vendidos na zona de Boston continha níveis elevados de chumbo, mercúrio e/ou arsénio. Como notam os autores, a tradição ayurvédica atribui um papel terapêutico importante ao mercúrio e ao chumbo e pelo menos um destes metais entra na composição de cerca de 35-40% das suas formulações.

Os autores concluiram na altura que podem estar em risco de envenenamento com metais pesados os utilizadores desta «medicina» tradicional, muito em voga entre New Agers e vendedores de banha da cobra, que tem em Deepak Chopra, o «curador» quântico, um dos seus grandes divulgadores. Assim, recomendam que seja mandatório o teste dos ditos produtos, normalmente vendidos como produtos herbais.

De facto, enquanto a indústria farmacêutica só pode comercializar um produto após rigorosos e demorados testes, os produtos das «medicinas» alternativas não estão sujeitos a qualquer tipo de controle, teste ou regulamentação. Aliás, os produtos «naturais» estão isentos de testes, qualquer que seja o fim a que se destinam, medicamentos, cosméticos ou pesticidas.
Existem inúmeros exemplos de medicamentos extraídos ou derivados de produtos encontrados na Natureza. Mas mesmo na bula da vulgar aspirina, o ácido acetilsalicílico que substituiu o (mais tóxico) ácido salícilico em que se transforma no organismo humano a salicilina da casca do salgueiro, encontramos uma longa descrição de todos os seus possíveis efeitos secundários e das suas contra-indicações. As banhas da cobra «terapêuticas» são publicitadas com descrições delirantes sobre as suas inúmeras e impossíveis benesses e nunca apresentam nem efeitos secundários nem contra-indicações.

Numa altura em que a Direcção Geral de Saúde mantém a ASAE tão atarefada em inspecções sanitárias sortidas, interrogo-me porque razão a gastronomia tradicional é um alvo preferencial e ninguém sequer menciona as «medicinas» alternativas, tradicionais ou não, que infestam até locais insuspeitos como farmácias, impertubadas e impertubáveis por regulamentação ou testes...

16 comentários:

Sérgio O. Marques disse...

A ASAE é a coisa mais descabida que por aí apareceu. Qualquer dia ainda pagamos multa por comer uma coxa de frango com a mão.
Quanto às mezinhas ou medicamentos farmacêuticos da vanguarda bioquímica, é de evitar (sinal que se está de boa saúde). Como escreveu um lírico português do século coisa e tal:

Aqui jaz um homem rico
Nesta rica sepultura
Escapava da moléstia
Se não morresse da cura.

Bruce Lóse disse...

Parece-me óbvio que a segurança alimentar carece de ordenamento no nosso país, algo europeu. Afirmações como

A ASAE é a coisa mais descabida que por aí apareceu.

parecem emanar da Liga Portuguesa dos Amigos da Salmonella (LPAS) ou de algum saudosista dos talhos do califado com cabeças de vaca no caminho dos transeuntes. Há regras, ainda bem que há, vamos respeitá-las. Os problemas da ASAE devem-se apenas à forma como o espécime português exerce a autoridade.

Sobre o vazio legal que tem abrigado as pseudo-farmácias e lojas de saúde a metro (onde encontramos não apenas mezinhas de que fala a Palmira mas, por exemplo, coisas fabulosas como o pão sem colesterol)é sempre interessante ouvir o arauto dos direitos e deveres do consumidor, Beja Santos.
Hoje às 18:30 na FNAC Colombo.

perspectiva disse...

É evidente que os medicamentos de referência dão, de um modo geral, melhores garantias.

Nos Estados Unidos, por exemplo, o processo de aprovação de um medicamento é bastante complexo e bastante prolongado, durando em média cerca de 7 anos. Por vezes muito mais.

Tal processo inclui, entre outras coisas, a administração do medicamento a algumas dezenas de pacientes, o posterior alargamento dos testes a centenas de pacientes, e, numa fase mais avançada, a avaliação do medicamento em milhares de pacientes.

A evidência assim obtida é depois sujeita a várias sessões de discussão e revisão, envolvendo os fabricantes e a Food and Drugs Administration.

A complexidade e o rápido desenvolvimento dos conhecimentos biotecnológicos recomendam, nalguns casos, um ulterior aprofundamento dos testes clínicos, só possível mediante uma prorrogação das patentes.

A indústria farmacêutica deve ser estimada e devidamente protegida.
A mesma é uma das formas que usamos para atenuar os efeitos da queda e da posterior corrupção de toda a natureza. A mesma combate os efeitos, em nós, da segunda lei da termodinâmica e da entropia genética.

Em todo o caso, não podemos ignorar que se trata de um mundo onde se movem poderosos interesses económicos, para os quais pode ser mais lucrativo o VIAGRA ou o PROZAC do que o combate a doenças mais sérias (v.g. SIDA, Malária).

Também não podemos ignormar o modo com esta industria procura pressionar o processo político e as entidades reguladoras, criando disfunções no sistema.

Além disso, devemos lembrar que esta indústria tem procurado fazer o levantamento das práticas medicinais de muitos povos nativos de diferentes partes do mundo (criando com isso acesas controvérsias), não caindo no erro de descartar pura e simplesmente a medicina popular só por ser popular.

:: rui :: disse...

É pela razão que o Perspectiva menciona acerca dos poderosos interesses económicos que fazem mover as grandes empresas da industria farmaceutica que surge toda uma industria alternativa dos quais se incluem medicamentos homeopáticos e outros tradicionais a tentar "balançar" a questão para outro lado. Por haver excesso de zelo por parte da poderosa industria farmaceutica, tal como a ASAE por vezes tem, é que existe toda essa crescente industria de medicinas alternativas. A questão é que ambas estão a fugir á questão principal, e por isso acabam por ser como duas faces da mesma moeda. A questão principal é o entendimento que Deus criou e que o homem se rebelou, fazendo entrar o pecado. Pode parecer algo muito fora este entendimento, mas a questão é que ambas as perpectivas, a da industria farmaceutica (quando esta realmente quer dominar e ter interesses demasiado materialistas) e a da industria de medicinas alternativas (que também crê na mesma perspectiva materialista muito embora esteja disfarçada de espiritual à la New Age), são realmente duas faces das mesma moeda. Ambas crêem na evolução, ambas crêem que o homem provém de um antepassado símio e daí a razão de existir uma perspectiva que vai explorar os resursos sem grande consideração pela preservação, e a outra perspectiva procura colocar-se o mais perto possivel da natureza, tentando evitar que esta se degrade demasiado. No final temos o homem tentando pelas suas próprias capacidades encontrar soluções para os vários problemas que encontra. No entanto, tudo se encontra na forma como vemos o mundo. Ou cremos em Deus como Criador e entendemos que não conseguimos nada sem Ele, ou cremos nas nossas forças, na sobrevivência dos mais aptos, nas nossas experiências, nos ensinamentos ancestrais, etc. e vamos continuar a ver mais do que sempre vemos, ou seja, corrupção à nossa volta. A resposta está mesmo nas nossas percepções do mundo. Vivemos a sofrer porque nos afastámos do entendimento do nosso Criador. Com isto, não estou a dizer que condeno a industria farmaceutica ou a industria alternativa, ambas têm os seus argumentos válidos, mas que estão cada vez mais afastados do verdadeiro cerne da questão e portanto, a atrair a corrupção que cada vez mais vemos.

Um bom dia,

AAA disse...

A despropósito: alguém sabe alguma coisa sobre as propriedades curativas do açafrão?

Unknown disse...

Os antioxidantes são assim os agentes responsáveis pela inibição e redução das lesões causadas pelos radicais livres nas células e alguns destes antioxidantes são fornecidos na dieta, não só as antocianinas e os seus copigmentos, mas também carotenos, α-tocoferol (vitamina E) ou a curcumina - outro pigmento natural e que confere a cor amarela ao açafrão-da-Índia (e ao caril).

http://dererummundi.blogspot.com/2007/12/antocianinas-polifenis-e-cancro.html

Andrew Black disse...

Talidomida.

Manuela Gonzaga disse...

Oh que engraçado. É nitidamente o caso em que se toma a parte pelo todo para provar um determinado ponto de vista. Um sofisma, portanto.
Todos os dias morrem pessoas por tomarem em excesso ou de forma inadequada os medicamentos da medicina dita convencional. Todos eles contêm venenos, se mal doseados. No limite até a água é "venenosa" se tomada em excesso! Por outro lado, milhões de pessoas no mundo inteiro foram tornadas dependentes de fármacos que não as curam, nem vão à raiz dos seus problemas de saude, mantendo-as numa dependência total dos fármacos. Para dormir, para acordar, para ficar alegre, para não ficar triste, para ter erecção, para perder apetite ou para o retomar etc. etc.
As medicinas tradicionais não são perigosas em si, se contém conhecimento ancestral provado. A forma como as pessoas a utilizam, ou os seus interlocutores as prescrevem, é que podem não ser sempre o mais adequado. E muitas vezes não é. Isto só acontece com elas?
Entrentanto, as elites em todo o mundo (dinheiro=acesso a conhecimento diversificado), e as pessoas mais esclarecidas (por exemplo no Reino Unido as medicinas não convencionais têm direito a Universidade e desde a Rainha Vitória que viveu longos anos a casa real trata-se desta forma...) -- usam medicinas alternativas. Isto conjugando-as com as convencionais sempre que é mais adequado.
Mas não convém que esta prática saia de um nicho muito pequeno. Estragava um negócio brutal. Assim cria-se esta cortina de fumo: o saber ancestral e suas práticas, desde que não avalizados pela grande multinacional farmacêutica, e devidamente "vampirizados" por esta, não prestam e matam. Entretanto a saúde mundial (e os Estados Unidos são um bom exemplo) não está nada bem...a indústria farmaceutica é que sim.

Unknown disse...

meu caro Sr. gonzaga:

Por acaso podia explicar a uma pobre inocente e ignorante alma (eu) quais são as qualidades curativas do chumbo e do mercurio?

Nos saldos da FNAC vi (e malditamente não comprei) uma enciclopedia de homeopatia só custavava 10 euricos. Devia ser uma perola de sabedoria ancestral...

antonieta disse...

Pois é...
Não há dúvida de que a natureza é um imenso laboratório mas, como todos eles, produz bons e maus compostos. É uma tristeza que ainda haja por aí gonzagas a defender e valorizar um "diz que é uma espécie" de conhecimento puramente empírico evidenciando, dessa forma, a sua ignorância.

Graça disse...

"A questão principal é o entendimento que Deus criou e que o homem se rebelou, fazendo entrar o pecado."

Mas o que é que isto tem a ver com o tema???

Quanto aos ditos poderes curativos de certas mezinhas, sei do caso de um jovem a quem uma mezinheira vendeu uma poção por ela feita no momento (numa dessas lojas de produtos naturais, com artigos esotéricos à mistura...), juntando 2/3 de conhaque e uns pingos do conteúdo de frascos vários com "florais" de várias plantas. Para uma melhor e mais rápida absorção da "energia" das plantas, aconselhou-o a deitar x gotas, directamente debaixo da língua . Das poucas vezes em que o fez, ele sentiu-se enlouquecer... Até que denunciou o caso à Ordem dos Farmacêuticos, que lhe respondeu agradecendo a informação e dizendo ir tomar as diligências tidas por convenientes. Qual foi o desfecho, não sei...

Peliteiro disse...

Concordo com todo o seu texto e compartilho das suas preocupações no que respeita ao uso das terapêuticas ditas não convencionais.
No que respeita às farmácias, impertubadas e e impertubávies por regulamentação, se fosse farmacêutica o que faria, recusava-se a vender produtos que a legislação nacional legitima (como os homeopatéticos)?

PS- O Prof.º Vitor Lobo, que me deu Química analítica e aquela história da marcha dos catiões, ainda anda por aí?

Humilde Canalizador disse...

Os ateístas que estão na área dos medicamentos naturais agora começam a ficar numa posição confrangedora, pois a eficácia provada e comprovada dos remédios naturais começa a ser posta em causa com a violência habitual da corrente ateísta portuguesa.
Alhos com bugalhos, o costume (vamos lá ver se este não é censurado, como o anterior).

Humilde Canalizador disse...

Os ateístas que estão na área dos medicamentos naturais agora começam a ficar numa posição confrangedora, pois a eficácia provada e comprovada dos remédios naturais começa a ser posta em causa com a violência habitual da corrente ateísta portuguesa.
Alhos com bugalhos, o costume (vamos lá ver se este não é censurado, como o anterior).

Anónimo disse...

mas agora as farmacias tb ja vendem com muita pompa e bem caros os chas que outrora eles consideravam produto de charlataes e curandeiros....qd toca a dinheiro meu amigo e ve los como caes a carne

Peliteiro disse...

«mas agora as farmacias tb ja vendem com muita pompa e bem caros os chas que outrora...»

Não diga disparates, as Farmácias sempre venderam chás e nas Faculdades sempre se ensinou Botânica e Farmacognosia.

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