sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Se não se passa em Lisboa então não aconteceu!

Considero este "artigo" do Expresso INACEITÁVEL (foi publicado na página 22 do Expresso de 7 de Agosto, estando agora também no Expresso online). Lamento que um jornal como o Expresso fique pela "espuma dos dias" e não vá ao fundo das questões. E faça um "artigo" assim, na altura das candidaturas ao ensino superior, sobre inovação, em que só ouve o presidente do IST, como se não houvesse mais mundo. Muito mais mundo: para a jornalista autora deste "artigo" não há o Porto, nem o Minho, nem Coimbra, nem Aveiro, nem Algarve, nem Bragança, nem Vila Real, nem Leiria, nem Castelo-Branco, ... não, o país é só Lisboa, e uma certa Lisboa. Ainda, segundo a jornalista que assina este artigo, "Muitas outras escolas estão determinadas em seguir o exemplo do Técnico (IST)". Isto seria cómico se não fosse trágico e não revelasse uma mentalidade tacanha de um país que insiste na ideia: só existe Lisboa, se não se passa em Lisboa então não existe ou não aconteceu.

Não é aceitável. É parcial. Não presta um bom serviço a Portugal, porque esquece as boas iniciativas que por aí vão em todo o país. Confundir Portugal com Lisboa, sem sequer ver o que se passa no resto do país, é um sinal de um país doente, sem chama, que insiste no suicídio colectivo.

Para além disso, confunde inovação e capacidade de realização, com registo de patentes nacionais. Não seria melhor, digo eu, ver quantas dessas patentes foram vendidas, passaram a patentes internacionais, deram origem a novas empresas, novos negócios, novos produtos, criaram emprego, etc.?? É que registar patentes nacionais pode ser só uma forma de "mostrar" indices para as estatísticas. Até é barato!

Este "artigo" não presta um bom serviço porque é um exemplo de MAU JORNALISMO, em que a pessoa que o escreve se limita a transmitir aquilo que, provavelmente, lhe enviaram, sem fazer investigação, sem cruzar dados, sem perguntar a outros, em suma, sem levantar a cabeça e olhar à volta.

E claro, nem verifica que existem outros locais no país que têm resultados bem mais interessantes. Aqueles que de facto contam, porque têm impacto na economia e na vida das pessoas. Esquece tudo o resto. Por exemplo, que foi a Universidade do Porto (uma universidade que nem é mencionada no "artigo") que ganhou o concurso da COTEC sobre "Fomento do Empreendedorismo nos Alunos do Ensino Superior Português" no valor de 100 mil Euros. Ou que a melhor incubadora de empresas do País (considerada também a 2ª melhor do mundo) é de Coimbra (Instituto Pedro Nunes). Melhor porque tem mais empresas, e muito melhores taxas de sobrevivência, isto é, excelentes resultados na criação e sobrevivência de empresas criadas em ambiente universitário. Etc., etc.

Mas mais importante do que isso, esquece que, se calhar, o que devemos querer saber das universidades é:

1. Quantas empresas foram criadas pelos seus alunos.
2. Quantos empregos foram criados por essas empresas.
3. Qual o volume de negócios dessas empresas.
4. Quanto representam do PIB nacional.
5. Dos seus docentes e investigadores quantas patentes resultaram.
6. Quantas foram vendidas e deram lucro.
7. Quantas deram origem a spin-offs.
8. Qual o impacto da universidade nas exportações portuguesas.
9. Qual o valor acrescentado de um aluno da universidade/politécnico: custa quanto e vale quanto.
10. Qual o impacto da universidade/politécnico no cenário internacional de I&D: docentes e investigadores.
11. Quantos projectos europeus tem a universidade/politécnico.
12. Quanto valem os projectos europeus em percentagem do orçamento da Universidade.

Pois, mas obter esta informação dá muito trabalho.
E se calhar não permite obter o resultado pretendido com o "artigo"!
O melhor, como dizia recentemente Mário Soares sobre o actual jornalismo, é ficar pelos fait-divers, pela "espuma dos dias".

J. Norberto Pires

14 comentários:

Anónimo disse...

Mesmo de águas conspurcadas, a espuma tem a vantagem de ser branca: valha-nos isso! JCN

Anónimo disse...

pois, só existe Lisboa, e quando não existe só Lisboa, só existe o Norte, o Algarve e a Estremadura.... Alentejo? nem ve-lo... não existe. pelos visto o meu amigo também tem de levantar a cabeça e olhar em volta.

Anónimo disse...

Tudo como antes. Lisboa é o país e o resto é paisagem... A tacanhez continua por aí à solta...

joão boaventura disse...

É o problema do contágio.

Assim como o país é periférico no contexto da UE, acaba também por sê-lo no contexto do IST, via Expresso.

António Piedade disse...

Caro Professor, um oportuno reparo à centralidade jornalística dos principais periódicos portugueses.
Não sei se a viabilização (económica) das edições on-line dos jornais regionais, ao permitir-lhes uma visibilidade em "banda larga", poderia remar contra este estado das coisas.
Até porque muitos dos cronistas e fazedores de opinião dos principais jornais/semanários portugueses continuam e mantêm colaborações em jornais regionais (Diário de Coimbra, Diário das Beiras, Jornal do Fundão, etc.).

António Piedade

Anónimo disse...

O que eu sei é que muitos investigadores, coordenadores de projectos de bolsas da fct de Lisboa não valem um "peido furado", na província há muito melhor, e mais não digo..

tem calma meu disse...

o Campo Pequeno está previsto ser alargado para acomodar essa gentalha sem coluna vertebral.

Anónimo disse...

A começar por ti, pá! JCN

Anónimo disse...

ESSA LISBOA DE OUTRAS ERAS

Lisboa é tudo; o resto é palanfrório
para as crianças entreter à mesa,
pois só a capital, como é notório,
tem peso algum na vida portuguesa.

Enquanto para o Porto é obrigatório
laboralmente ter candeia acesa,
Coimbra é presumido mistifório
e Braga por nós todos faz que reza.

Lisboa não; Lisboa tem na mão
a vara do poder, com que comanda,
"tant bien que mal", o curso da nação.

Lisboa faz, Lisboa pensa e anda
a ver se leva à certa este país
ignaro e cada vez mais infeliz!

JOÃO DE CASTRO NUNES

J. Norberto Pires disse...

Caro António Piedade, Penso que não. As pessoas esquecem com facilidade os locais de onde vêm. É pena, porque os jornais deveriam prestar atenção ao que se passa pelo país. Uma missão de coesão nacional que o governo tem de tomar nas suas mãos.
norberto

Atónito Passante disse...

Pensei que este blog pretendia "partir da realidade do mundo (o nosso mundo, feito de átomos e espaço vazio) para discutir o empreendimento humano da descoberta do mundo, que é a ciência, e as profundas implicações que essa descoberta tem para a nossa vida no mundo".

Anónimo disse...

Uma das coisas que a ciência permite é identificar "enganos". É uma das implicações que tiramos da ciência para a nossa vida no mundo

Anónimo disse...

Vai cá uma dor de corno...

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Nem, casca grossa.

AS FÉRIAS ESCOLARES DOS ALUNOS SERÃO PARA... APRENDER IA!

Quando, em Agosto deste ano, o actual Ministério da Educação anunciou que ia avaliar o impacto dos manuais digitais suspendendo, entretanto,...