sexta-feira, 1 de maio de 2020

"Aulas interrompidas, aprendizagem ininterrupta". Siga-se o modelo chinês.

Tanto a OCDE como a UNESCO têm apontado as medidas adoptadas pela China em matéria de educação escolar em tempos de COVID 19 como modelo a seguir por todos os países do mundo, incluindo, evidentemente, os Ocidentais. 

De notar que a declaração "é preciso seguir o modelo da China" faz parte da "narrativa da educação do futuro/do século XXI": vemo-la destacada, por exemplo, nas publicações do PISA (da responsabilidade da OCDE), desde o seu início. Porém, tanto quanto me lembro, nunca ela foi tão ostensivamente invocada como no último mês, e não só pela primeira organização internacional que mencionei, mas também pela segunda.

Um exemplo recente é o Manual de Apoio à Aprendizagem Flexível durante a Interrupção do Ensino Regular: A Experiência Chinesa na Manutenção da Aprendizagem durante o Surto de COVID-19divulgado em 15 de Março pela UNESCO e concretizado numa parceria entre o seu Centro Internacional para a Investigação e Formação para a Educação Rural (INRULED) e o Instituto de Aprendizagem Inteligente da Universidade de Pequim (SLIBNU), 

A tradução para português foi rápida (presumo que em muitos outros países também tenha sido), estando disponível na internet ao acesso das escolas e professores, como suporte para o seu trabalho. Trabalho que, como bem sabemos, em poucos dias, passou de um regime presencial para um regime que, com muito boa vontade, se designa, "à distância". Isto porque, alega-se, a aprendizagem não pode ser interrompida. 

“Aulas interrompidas, aprendizagem ininterrupta”, foi, de resto, o slogan adoptado pela China para a sua iniciativa de ensino à distância...
"... com o intuito de proporcionar aprendizagem online flexível a centenas de milhões de estudantes nas suas casas. Inspirado na solidariedade conjunta e nas experiências inovadoras de milhões de professores e alunos"
 Assim, o manual em causa...
"... tem como objetivo definir o termo “aprendizagem flexível” através de exemplos vividos e histórias emocionantes (...) descreve várias estratégias flexíveis de aprendizagem online implementadas durante o surto de COVID-19."
Vale muito a pena ler o documento, que não é muito longo, para se perceber aquilo que as grandes organizações internacionais têm em mente em termos de sistema educativo global, nomeadamente, o que entendem por "aprendizagem flexível", que métodos e recursos lhe associam, que papéis reservam aos alunos e aos professores, etc. 

Interessa-me de modo muito particular, analisar o lugar das empresas no dito "new normal". Dessa análise darei conta num próximo texto.

2 comentários:

Anónimo disse...

"Quando a China acordar, o mundo tremerá!"
Napoleão Bonaparte

Nos últimos cinco séculos, a grande, e talvez única, grande vantagem, dos ocidentais em relação aos chineses, foi a ciência experimental de Galileu.
Eles, não tendo rejeitado as suas superstições, agora também têm a nossa ciência.
Tal como os portugueses foram obrigados a escrever à maneira dos brasileiros, é bom que os ocidentais se vão habituando à ideia de aprender com os chineses.

Rui Ferreira disse...

Com toda a certeza que teremos muito que aprender com os chineses, mas não sobre o conteúdo do documento em epígrafe. O documento apresenta-se como uma alternativa ocupacional e não como um modelo de ensino e aprendizagem. E em relação à primeira, as crianças e os jovens sobram para eles próprios, não precisam de orientação alguma. Já quanto à segunda, a garantia do acesso ao currículo prescrito, a aplicação das técnicas de intervenção pedagógica no sentido de maximizar o tempo potencial de aprendizagem, a implementação pertinente e oportuna do feedback pedagógico, a manutenção de um clima positivo e de estabelecimento de relações afetivas e emocionais equilibradas, não existe.

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