Crónica de Santana-Maia Leonardo publicada nas Beiras no recente Dia Internacional do Burro:
Até Otelo Saraiva da Carvalho já tem saudades “de um homem
com a inteligência e a honestidade de Salazar” [ao DN em 2011] capaz de sacar Portugal do
atoleiro de corrupção em que a nossa democracia o mergulhou. A história de
Portugal é uma ditadura contínua com alguns intervalos de selvajaria absoluta,
a que se convencionou chamar “democracia”, para que o povo volte a ganhar
saudades de ser governado por um ditador.
Ora, o que nós precisamos não é de um
homem com a inteligência e a honestidade de Salazar, mas de cidadãos que
valorizem a honestidade e a inteligência, sem complexos, amem a liberdade, o
que significa ser responsável, e cultivem o respeito pelos outros e pela
diversidade. Ditadores e pastores é precisamente aquilo que nós não precisamos,
sejam eles inteligentes ou estúpidos. É precisamente aqui que reside a
diferença entre o Homem e a ovelha: enquanto a ovelha procura um pastor que a
guie, o Homem busca a Liberdade. “Ser homem é ser livre. Tornarmo-nos
verdadeiros homens, esse é o sentido da História.” (Jaspers)
E já vai sendo
tempo de os portugueses tirarem as palas dos olhos e deixarem de tirar água à
nora. Quase 50 anos depois do 25 de Abril, a esmagadora maioria dos portugueses
continua amarrada à nora e a ver o mundo a preto e branco: direita/esquerda,
Benfica/ Sporting, comunistas/fascistas, Norte/Sul. Não admira, por isso, que
os portugueses vão sempre parar ao mesmo sítio. É esse o destino do burro que
tira água à nora. Por amor de Deus, deixem de ser burros! Abram os olhos!
O
mundo é a cores e a sua beleza reside precisamente na sua diversidade. Como
disse Laborinho Lúcio, «na complexidade da vida não sou o preto ou o branco,
sou preto, branco, amarelo, verde e, no momento de escolher, vou buscar a cor
que naquele momento se impõe.»
Ao contrário da esmagadora maioria dos
portugueses que conheço, não tenho nenhum brinco de identificação na orelha,
que me tivesse sido posto à nascença ou na infância, fosse ele do Benfica, do
Sporting, dos Católicos ou da Mocidade Portuguesa. Eu não nasci ovelha de
nenhum rebanho: seja clube, partido ou religião. Nasci livre. “Ser livre não é
um dote, é um dom”, como escreveu Miguel Torga. Todas as minhas escolhas são
racionais. Só estou vinculado à minha consciência. E se gosto de participar em
debates acesos em que defendo com entusiasmo as minhas convicções, o meu
principal objectivo não é convencer o oponente da minha razão, mas desafiá-lo
a convencer-me de que eu estou errado. E, se me convencer, eu mudo de opinião
de imediato.
Como dizia André Gide, “confia nos que procuram a verdade mas
desconfia daqueles que a encontram”. Por isso, enfrento de peito aberto e
olhos nos olhos qualquer exército por maior que ele seja. E quando socialistas,
benfiquistas ou qualquer outra maioria esmagadora (se vivesse na Madeira ou em
Viseu, o PSD; se vivesse no Porto, o FCP) me tenta atemorizar com o grande
número dos seus adeptos e o seu poder de fogo, dizendo-me que as flechas que
vão lançar sobre mim são tantas que vão encobrir o Sol, eu respondo-lhes como
Leónidas respondeu ao mensageiro de Xerxes no desfiladeiro das Termópilas:
“Melhor, combaterei à sombra.”
Santana-Maia Leonardo
1 comentário:
"Confia nos que procuram a verdade mas desconfia daqueles que a encontram." Cá está. A esta ideia está subjacente a verdadeira verdade: tudo é mentira. Desconfia desta também.
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