sábado, 2 de maio de 2020

"Não paramos, estamos ON": (mais) um exemplo da insuportável infantilizarão do ensino

"O professor é aquele que faz um trabalho 
que mais ninguém faz: ensina."
Olga Pombo (aqui). 

Uma análise histórica, sociológica e deontológica do ensino não pode deixar de revelar fragilidades na afirmação desta ancestral acção humana como profissão.

É importante estarmos conscientes disto para percebermos, nomeadamente, o modo como o professor é encarado e como ele próprio se encara, o modo como é formado e como ele perspectiva a formação, o modo como as mais diversas entidades o substituem e como ele aceita ser substituído, o modo como as instâncias de poder o declaram e como ele aceita ser declarado.

Entendo que, em vez de se darem passos no sentido de se entenderem os professores como profissionais e de eles se entenderem como tal, dão-se passos em sentido contrário. De facto, a destituição da sua função identitária - o ensino -, a par da mistificação (ou, mesmo, subversão) dessa função, é uma das marcas mais visíveis da "narrativa da educação do futuro/do século XXI". 

Nessa narrativa, imposta ao mundo que estabelece o "novo normal" desaparece o adulto-educador, por princípio (bem)formado, cuja função é instruir e formar os mais jovens, para aparecer o aplicador, destituído de pensamento, discernimento e destreza de acção. Há que lhe dizer tudo aquilo que deve fazer para tornar a educação que se quer instituir numa realidade, mas de maneira muito simples e linear, como se fosse uma criança pequena.

Um exemplo: a Direção Geral da Educação (Iniciativa Laboratórios de Aprendizagem) publicou em Abril um conjunto de vídeos com o título "Não paramos, estamos ON", no quais se apresentam "sugestões" que "devem ser usadas de acordo com soluções da sua escola" (ver aqui). 

Como esperado, em todos se solicita atenção às:
- áreas de competências integradas no "Perfil dos alunos";
- "Aprendizagens essenciais"
E todos terminam com duas frases:
"Valorize o progresso dos seus alunos
Promova a aprendizagens diferenciadas que garantam a inclusão de todos"
Eis os onze títulos, cada um dos quais com pouco mais de dois minutos:
"Trabalho entre professores e alunos"
"Dar e receber feedback"
"Portefólio individual do aluno"
"Aprendizagem em casa para alunos mais novos"
"Questões a distância"
"Criar mapas de conceitos"
"Aprendizagem autónoma com o milagre"
"Gerir uma sessão em videoconferência"
"Dinamizar uma sessão síncrona"
"Aprendizagem cooperativa"
"Aprendizagem baseada em problemas"
Vale a pena ver um ou dois para se perceber o que  acima mencionei.

Este texto continua aqui.

1 comentário:

Anónimo disse...

Os professores é que estão completamente infantilizados. Perderam a noção da sua importância e do seu verdadeiro papel.
E os diretores, acólitos do Ministério, vão na mesma senda.
O ensino público agonizou de vez!

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...