quinta-feira, 28 de maio de 2020

"A universidade light" - 1


Por muito apelativas que sejam as páginas online das universidades e das faculdades públicas (só me refiro a essas porque das privadas pouco sei) deste e de outros países, por muito boas que sejam as avaliações dos seus cursos por agências credenciadas, por muitos projectos que publicitem, por muitas iniciativas que tenham, por muitos prémios que ganhem ou atribuam, por muitas avaliações que façam, o ensino definha, está moribundo.

Pode haver uma ou outra faculdade, um ou outro departamento, um ou outro instituto, uma ou outra disciplina (deveria dizer unidade curricular), um ou outro professor, que vai mantendo a resistência possível, a resistência possível até à desistência, que sabem ser certa. 

Focalizando-me nos professores, o trabalho acrescido e a perda de tempo sem qualquer resultado, o confronto com a inutilidade dos esforços e, pior do que tudo, a hostilidade que paira sobre as suas cabeças, levam a melhor. Há um momento em que o cansaço se associa à tristeza e eles cedem, desistem. É humano!

Tenho assistido a este "quadro de abandono" entre os melhores dos meus colegas, mais velhos mas também mais novos: os melhores sob o ponto de vista científico e pedagógico, os que se importam. Dos que têm características contrárias não falo, não me dizem nada, apenas adianto que é para eles que a universidade está preparada, sendo que eles também estão preparados para ela. Daí ser legítimo prever um futuro em tons mais carregados do que o cinzento que é, agora, o desta escola.

Declara-se que aquilo que nela se investiga e ensina tem de ser adequado à realidade, quer dizer a um certo mercado de trabalho e aos seus clientes. A "satisfação" de um e de outros traduz a "qualidade", apurada em rankings nacionais e internacionais.

Não posso estar mais em desacordo. E o autor do livro, publicado em 2019 cuja capa reproduzo ao lado também não. De facto, Francisco Esteban Bara, doutorado em Pedagogia e professor do Departamento de Teoria e História da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de Barcelona, analisa em pormenor esta ideia.

A universidade deve seguir o seu caminho, que é, afinal, aquele que sempre seguiu: construir conhecimento racionalmente válido e eticamente responsável (o autor investiga também na área da ética*) e educar/formar novos construtores desse conhecimento.

Sim, sem esquecer a importância que o conhecimento tem nos diversos sectores da sociedade, incluindo o produtivo, mas distanciando-se de interesses restritos e poderosos que impõem o urgente, o pragmático e o utilitário como critérios absolutos de decisão, ao ponto de fazerem parecer o trabalho em certas áreas, sobretudo as humanidades e as artes, como opções inconsequentes, perturbadoras da ordem instalada, quando não indícios de insubordinação, a silenciar o mais depressa e eficazmente possível.

* Martínez, F.; Esteban, F. (2013). De qué comunidad hablamos cuando nos referimos a la universidad Apuntes en relación a la formación ética. Ibáñez-Martín, J.A. (Ed). Educación, Libertad y Cuidado (89-94). Madrid: Dykinson. 

Este texto continua aqui.

3 comentários:

Socorro, a minha mulher tem um blog disse...

Não está traduzido? Gostaria de ler...

De Rerum Natura disse...

Caro Leitor não está traduzido mas o livro é muito compreensível, mesmo para quem não domina bem o espanhol. Cordialmente. MHDamião

Socorro, a minha mulher tem um blog disse...

Obrigada.

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...