sexta-feira, 7 de junho de 2013

UMA GREVE GRAVE

Deixei há muitos anos de ser membro de um Sindicato dos Professores (a Fenprof), pois eles achavam que a questão da propina universitária devia ser, nessa altura, a sua questão número um. Era "uma questão estratégica", diziam os dirigentes sindicais, por fazer parte de uma luta política contra o governo de então. Havia obviamente um telecomando sobre os sindicatos e estes nem se importavam que alguns professores como eu abandonassem o sindicato. A questão da propina não dizia, para mim e para muitos colegas, respeito à profissão docente, que não víamos dignificada. E os sindicatos serviam interesses que não eram obviamente os dos professores, até porque não perguntavam a opinião a estes.

Agora o mesmo sindicato, conduzido praticamente pelas mesmas pessoas (não há limitação de mandatos nos sindicatos, pelo que se mantêm nas direcções verdadeiros "dinossauros", que não se lembram decerto do que é dar uma aula) e ao serviço dos mesmos interesses, não encontrou uma outra forma de protestar contra o Ministério da Educação e Ciência do que fazer uma greve aos exames, que sabem trazer directos prejuízos aos jovens e às suas famílias. A convocatória de uma manifestação seria contraprudecente pois seria manifesta a enorme diferença em relação às grandes manifestações contra a avaliação proposta pela ministra Lurdes Rodrigues, uma avaliação sem ponta por onde se lhe pegasse e que causou uma confusão absolutamente desnecessária. Os eternos dirigentes sindicais querem mostrar não que os professores podem fazer bem aos alunos, como seria desejável, mas sim que podem fazer mal. Quaisquer que sejam as razões que invoquem, não se trata de valorizar os professores, mas sim de os diminuir perante os alunos e  a sociedade. Ao dizerem que na educação não há e não deve haver serviços mínimos, estão objectivamente a desprezar o valor da educação de que eles deviam ser os principais defensores. Desvalorizam também os exames, na linha do que defendem algumas ideologias.  A política dos dirigentes sindicais parece ser: quanto pior melhor. E, neste momento, a sua "questão estratégica" é derrubar o governo sem ser através de eleições.

Vivemos tempos difíceis e o governo é responsável por parte dessas dificuldades. Os professores sofrem, como sofrem quase todos os portugueses, devido a acções e omissões de um governo sem rumo, um governo que está manifestamente desorientado perante o falhanço na prática das suas decisões nas áreas financeira, económica e social. Basta metermos as mãos nos bolsos para repararmos que não  temos razões nenhumas para estar contentes com a situação presente do país. Podemos também olhar para o número galopante de desempregados, alguns em situação muito desesperada, e para o número de reformados em dificuldades. Mas, pior do que tudo: não vemos uma luzinha de esperança nestes tempos escuros, por não haver liderança capaz. Nas eleições, o governo saberá a opinião dos cidadãos a respeito da sua acção ou inacção. A chamada "reforma do Estado" está longe de ser consensual e está a ser feita, à pressa e inabilmente, usando eufemismos do "economês" como "requalificação", "mobilidade especial", etc. que não ficam atrás dos eufemismos do "eduquês". Os sindicatos da função pública têm, por isso, todo o direito a fazer greve. Mas a presente greve dos professores, da responsabilidade de dirigentes sindicais irresponsáveis, é grave, por atingir menores de idade, que não têm direito a voto. As crianças e jovens nada fizeram que tivesse causado a crise e têm direito ao futuro sem atrasos. Cabe aos professores acender-lhes uma luz que os ilumine, uma luz que lhes permita um caminho. Os professores são membros de uma das profissões mais nobres por ser portadora de esperança. Não se justifica que prejudiquem a vida dos seus alunos em circunstância alguma. E muito menos que, aqui e agora, a prejudiquem mais do que ela já está com a situação degradada da sociedade portuguesa.

24 comentários:

Nan disse...

É a sua opinião e tem todo o direito a ela. Mas agora experimente pensar nisto: uma greve de professores atinge os alunos. Deve ser porque os professores trabalham com os alunos e se a greve lhes é deixada como último recurso, não vão fazê-la num domingo de Agosto, não lhe parece? Não fazer o exame no dia marcado é capaz de ser aborrecido, sim senhor. Mas passar a ter uma escola de qualidade ainda mais baixa, com professores sobrecarregados e mal pagos enquanto milhares de outros estão em casa a receber uma migalha à espera do desemprego definitivo ou da morte, em salas cheias até à porta, com falta de pessoal auxiliar e de segurança,programas de caca e fome - sim, porque a maioria parlamentar chumbou o pequeno almoço escolar - se calhar, é mais prejudicial, ou acha que estou errada? A greve é uma coisa séria. Não lhe passe pela cabeça que vou fazê-la de ânimo leve, que não respeito os meus alunos ou não me preocupo com eles. Mas este ano, nas sala de aula do sétimo ano, da segunda fila para trás ninguém me ouve, porque são 30 miúdos de 12 e 13 anos, que não têm um minuto livre há anos por causa da escola a tempo inteiro da ministra Maria de Lurdes. Passo 40 e muitas horas por semana na escola em reuniões insanes, a preencher formulários da treta, a dar pseudo apoios e mais-do-mesmo a alunos que não querem ser apoiados ou cujo único mal é falta de tempo dos pais, ou a falta de pequeno almoço. E também tenho filhas. Os professores não são santos mártires. Parem de nos atirar com a nobreza da nossa profissão para nos lixar, porque para nos difamar e humilhar não há nobreza que nos valha!

Sílvia disse...

O papel dos sindicatos ao longo dos últimos anos pode e deve ser questionado, o que não deve ser colocado em causa é o papel dos professores nas escolas. E, isso, infelizmente é o que está neste momento em causa. É claro que uma greve de professores prejudica os alunos, não podia ser de outra maneira, já que os professores trabalham com e para os alunos (repetindo o que foi dito no comentário anterior). E é pena que só de vez em quando (quando dá jeito) se lembrem que "os professores são membros de uma das profissões mais nobres"! Esta é uma greve que tem de ser feita! E pode ser que o Professor Carlos Fiolhais se surpreenda com a quantidade de professores que irão comparecer na manifestação convocada para dia 15.

Armando disse...

Muito grave mesmo. Só gostava que, por uma vez que fosse, os sindicalistas defendessem os interesses do ensino e não os seus.

Unknown disse...

tão importantes como os alunos que fazem exames este ano são os alunos que os farão nos anos seguintes, que ficarão menos bem preparados por terem professores que não têm condições para os prepara.

José Batista disse...
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José Batista disse...
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Paulo Correia disse...
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Anónimo disse...

E já agora, refere a avaliação de MLR, a tal sem ponta por onde se pegasse, sabe que no essencial se mantém, não sabe ?

Anónimo disse...

Como pai que acompanha com alguma regularidade e proximidade o que se passa na escola, não posso deixar de estar com os professores que fazem greve, porque como trabalhadores não lhes for dado as condições minimas para exercer a sua profissão, dela não resultarar nada de util ou bom. E neste momento é disso que se trta . As escolas públicas têm sofrido uma degradação gradual da sua qualidade sobretudo e em virtude da degradação das condições de trabalho com a imposição de regras que nada têm a haver com a profissão. O Governo se de facto queria minimizar o impacto da greve já podia ter cancelado os exames respectivos pois tem espaço temporal para o fazer. Ao manter a confrontação age de má fé, demonstrando que o que os move são outras preocupações que não a escola e o ensino como bem universal.

Paulo Correia disse...

De facto quem (concorda com quem) acusa os sindicatos de não ouvir os professores... devia tentar saber o que pensam... os professores!

Anónimo disse...

Para alguns professores, pode ser a última greve que poderão fazer antes de serem postos na rua.
Tão simples quanto isso.

Anónimo disse...

O texto de Fiolhais incorre desde logo no vício que denunciei: é vítima do preconceito ideológico contra os professores e os seus representantes (explorado à exaustão desde os tempos de MLR); os zecos não sabem pensar nem sabem o que querem – e assim deixam-se conduzir e manipular pelos sindicatos e pela respectiva agenda.

Mas depois, Fiolhais entra em contradição e é, pelo menos, ingénuo. Aponta, e muito certeiramente, ao governo todo uma série de erros políticos e de medidas erróneas e injustas, que precisamente constituem o motivo pelo qual os professores estão em luta, porque, além de os sentirem bem na pele (não se trata de invenções malévolas dos sindicatos), sabem que assim – discriminados, diminuídos, desmotivados, sobrecarregados de trabalho, e com condições cada vez mais difíceis – terão muita dificuldade em estar à altura daquilo que os alunos legitimamente esperam deles e do seu desempenho.

Todavia, Fiolhais não consegue tirar daí as consequências que se impõem. A luta dos professores contra essa política nefasta e destrutiva da Educação é a via, justamente, pela qual os verdadeiros interesses dos alunos acabam por ser também salvaguardados.

Há uma falácia, que é usada até à náusea, e em que Fiolhais incorre, que tem que ser bem denunciada: os interesses dos professores não são opostos aos dos alunos, não são inversamente proporcionais. A Educação é, essencialmente, uma relação entre estes dois pólos, que se condicionam mutuamente: o que afecta e prejudica um acaba, de uma maneira ou de outra, por afectar e prejudicar o outro, por se reflectir no outro e na relação que entre si mantêm.

O problema é que, com a deriva técno-burocrática que avassala a Educação – nomeadamete na sua actual expressão “mega” – a escala, a dimensão humana do acto educativo e pedadógico foi-se perdendo de vista. Pretende-se que, de um lado, estejam os “trabalhadores” e os “funcionários”, de outro, os “clientes” da “escola-empresa-de-serviços” e, ainda do outro lado, a “entidade patronal”, quadro em que – como é próprio do mundo empresarial – se projectam os conflitos (laborais ou outros) enquanto meras relações de antagonismo, de força e de competição, onde o que uns ganham é retirado aos outros

João Esteves disse...

Carlos Fiolhais, seria possível contra-argumentar de várias maneiras perante o texto que escreve. Mas deixo-lhe antes a lucidez de um pai que é parte interessada o que não é o meu caso:

https://www.facebook.com/pbsousa/posts/4557043738348

JdiMarq disse...

O estado faz a lei. Em geral, o cidadão é cumpridor. Por vezes resiste. E assim muitas iniciativas de mudança fracassam. O cidadão pode resistir à "ditadura" da lei democrática. Vejam o caso do "Acordo Ortográfico"!
Outro caso é o da greve dos professores. Há um conjunto de cidadãos que está a resistir. Mas, por outro lado, existem alguns que apresentam uma grande preocupação sobre o que vai acontecer. E têm razão: esta é mais uma situação onde está a haver manipulação política. As pessoas não são o problema deles. O problema reside na ignorância do estado de coisas. A realidade por vezes choca, mas está aí. Vão a uma escola...

Anónimo disse...

Tenho 3 filhos. O direito à greve está estabelecido na Lei, e por isso os Ex.mos Sr.s Professores podem fazer greves à vontade.

Infelizmente o que não está consagrado na Lei é o direito de os Contribuintes do privado, como eu, poderem fazer greve não pagando os impostos... limitamo-nos a ser a carne para canhão que engrossa as estatísticas do desemprego, sacrificados no altar do Estado Socialista, e roubados mensalmente para alimentar empregos para os quais não há trabalho.

Não vale a pena argumentar que este ensino (ou sistema de ensino) é bom, e melhor do que para aí pode vir. Se fosse bom não estávamos como estamos. Este ensino é mau, muito mau mesmo! Alimenta desde as patranhas na história, às patranhas na física, com textos de «pétuguês» de acordo ortográfico (como diria o Eça) latrinário.

Por isso não me façam é de atrasado mental, argumentando que a greve é para defender os meus interesses, e os dos meus filhos. Já não há paciência para aturar a falta de verdade generalizada neste País.

E o Mário Nogueira continua a caminhada para secretário geral do pc...

Obrigado pelo espaço,

JM

José Batista disse...

Em estado de grande cansaço fiz um comentário no passado dia sete que ficou com vários erros. Na intenção de ressalvar esses erros acrescentei primeiro um e de seguida outro comentário mas acabei por não referir os erros todos, tantos eram!
Vou copiar esse comentário para aqui e proceder às devidas emendas, após o que o apagarei na "versão inicial" bem como às insuficientes corrigendas que lhe fizera.

Então:

"A greve é grave sim. Muito grave. Gravíssima.
E contudo foi o governo que empurrou os professores para ela.

Em minha opinião, nobres são os professores que a fizerem. E creio que serão muitos.
Apesar de todas as incompreensões.

E ninguém mais que os professores olha para os seus alunos, que, em não poucos casos, são os seus próprios filhos.

Com o coração apertado, escuro e dorido farei greve. Pelos alunos do meu país, pelos meus filhos e por mim. Não posso proceder de outro modo. O que lamento. Muito..."

Esperando não estar a cometer novos erros, reafirmo pedido de desculpa.

Mendonça disse...

E quem disse que o Mário Nogueira defende os professores?

Francisco Lopes disse...

Greve de médicos: o risco de vida não conta para nada...
Greve de transportes... o facto de se perder um dia de trabalho não conta
Greve de professores... mesmo sabendo que não deixam de ter classificações no fim... mesmo sabendo que as avaliações vão acontecer embora provavelmente mais tarde... prejudica gravemente o "futuro" (Mas que futuro????) dos alunos... Ao menos que alguém assuma... dá mau jeito nas férias... não é? Ninguém vai deixar de ter as classificações para o novo ano ... ninguém vai ter classificações que lhe permitam entrar em universidades antes de outros... são mesmo as férias não é? Creio que a luta pela educação dos nossos filhos e pela dignidade da profissão é capaz de ser menos importante que aquele pacote de férias que alguém comprou no Natal com um fabuloso desconto!
F.Lopes

DEANA BARROQUEIRO disse...

Os Professores Universitários têm muito pouco a ver com os professores do dos outros graus de Ensino e desconhecem quase por completo o seu trabalho e as condições em que o fazem e ainda menos a sua dedicação aos alunos - não há qualquer semelhança entre uns e outros.
A única greve dos professores do ensino básico e secundário que pode ter algum efeito no Ministério da Educação é a greve aos exames, todas as outras são uma pura perda de tempo e de dinheiro para os professores e poupança para a tutela.

Parece-me mais danosa para os alunos e prejudicial para a educação dos nossos jovens, a política de Nuno Crato, fazendo Agrupamentos gigantescos de escolas com milhares de alunos atafulhados às trintenas nas salas de aulas, com os problemas de indisciplina que se conhecem, tendo cada vez menos professores e menos pessoal auxiliar, apenas com o desprezível intuito de poupar dinheiro de salários, mantendo professores com anos de experiência no desemprego.

Do "eduquês" tão criticado por Crato enquanto professor, agora com ele no poder, passou-se ao "cratês", igualmente mau, autista e sem visão. Espero que a greve seja um sucesso. Se não estivesse aposentada, faria greve aos exames sem hesitar!

De uma ex-professora que dedicou toda a sua vida ao ensino e aos alunos e sofreu todas as reformas destrutivas das boas práticas, a que sucessivas tutelas de gente incompetente do Ministério da Educação nos foram impondo a ponto de fazer a nossa Escola cair no mais imbecil facilitismo (de que culparam os professores).
Deana Barroqueiro

DEANA BARROQUEIRO disse...

Ressalvo a minha gralha "do dos", na 2ª linha, não vão dizer as más-línguas que, sendo professora de Português e escritora, não sei escrever e contribuí seguramente para a má qualidade do Ensino!
De resto, não escrevo segundo o novo Acordo Ortográfico.
Deana Barroqueiro

margarete disse...

Não sou professora, fui aluna (anos 80 e 90... ui!) e tenho um enteado que fará exames.
Tenho a minha opinião sobre as lutas dos professores, concordo com muitas das suas reivindicações mas também tenho queixas, por ex: estou cansada de os ouvir como se sejam os maiores trabalhadores deste país (por favor parem de nos relatar o quanto trabalham, isso fazemos todos, uns mais do que outros, é certo) ;)
MAS será que me cabe pôr em causa o direito à luta por concidadãos? Não.
Pergunto, quais são afinal os requisitos que interessam para se falar sobre este assunto?
Respondo: ser-se cidadão de uma sociedade democrática.

Não entendo, não me cabe na cabeça (mesmo), que andem a discutir a legitimidade de alguém usufruir de um direito que tanto custou a adquirir. Respeitem a democracia e ensinem os vossos filhos a fazê-lo também. Este é o momento ideal para mostrar que não são individualistas e que respeitam os princípios inerentes à vida em democracia.
Querem ver que gostam de viver em democracia mas... só quando lhes convém?
Que desilusão, Carlos Fiolhais.

Anónimo disse...

As crianças e jovens nada fizeram que tivesse causado a crise e têm direito ao futuro sem atrasos. Cabe aos professores acender-lhes uma luz que os ilumine, uma luz que lhes permita um caminho. Os professores são membros de uma das profissões mais nobres por ser portadora de esperança - escreve o professor Carlos Fiolhais.

Concordo inteiramente quanto à nobreza da profissão. Não só concordo como a sinto e pratico diariamente.
Por isso mesmo... o melhor exemplo que podemos dar aos nossos jovens estudantes é não cruzarmos os braços e usarmos as formas legais de proptesto (e intervenção) perante as vergonhosas decisões dos nossos vergonhosos governantes...
Ana Maria Baltazar

Anónimo disse...

acrescento ainda...

Só assim estaremos a iluminá-los, a mostrar-lhes que o caminho tem esperança e que podemos construir essa esperança, em vez de aceitar passivamente todas as barbaridades...

Ana Maria Baltazar

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