terça-feira, 7 de maio de 2013

Escola, família e campo mediático - 1

Texto de Carlos de Sousa Reis, professor no Instituto Politécnico da Guarda e especialista em Educação e Meios de Comunicação.

Se passarmos de relance a história dos media, verificamos que a partir de meados do século XIX aparece, pelo menos, um novo meio em cada vinte e cinco anos.

Nesta evolução criou-se um ambiente fortemente mediatizado: os meios estão por todo o lado e intervêm em todos os momentos da nossa vida, do nascer ao morrer, do levantar ao deitar. Já nenhuma das atividades humanas parece dispensá-los e nós mesmo dificilmente suportaríamos a sua ausência. A sua ubiquidade alterou profundamente o nosso quotidiano.

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A atividade dos media é de tal ordem e a sua penetração nas diferentes dimensões sociais tem-se afirmado de forma tão profunda, que fez emergir o que se designa por “sociedade mediática”, marcada na sua organização, funcionamento e desenvolvimento pela ação dos meios de comunicação.

Corresponde-lhe uma cultura de massas, fruto da atividade conjugada de diversos meios e indústrias. Os media formam o ambiente, mais ou menos poluído, desta época consumista, ou mesmo hiperconsumista, no dizer de Lipovetsky (2007). Até porque a sua relação com o sistema de produção e consumo é estrutural. Tal como acontece com os media, nada escapa tão pouco ao consumo, todas as dimensões da nossa vida envolvem o consumo de algo, para o qual está pensada uma dada indústria. E esta, por seu lado, envolve, em muitos casos, de algum modo, um ou vários meios de comunicação.

Mas não foi só neste aspecto que, nos últimos setenta anos, os meios de comunicação transformaram radicalmente a existência.

As pessoas vivem hoje um intenso envolvimento com os media eletrónicos que sustentam indústrias colossais: a televisão, o cinema, os vídeos de diversa natureza, a internet, os jogos de computador e consola, sem esquecer os telemóveis, que já permitem acesso à internet e a receção dos programas de televisão...

O tempo dedicado a estes meios supera já o que os mais jovens passam na escola e o dedicado convívio familiar. Acresce a isto o facto de a supervisão parental neste aspecto ser muito fraca e, grande parte das vezes, inexistente. 

A Common Sense Media (Organização sem fins lucrativos, cuja missão é fornecer informação criteriosa a pais e educadores sobre os meios de comunicação e os seus conteúdos, de modo a facilitar a sua tarefa educativa.) tem divulgado dados, sobre o consumo mediático na sociedade dos Estados Unidos da América, que podem ser para nós indicativos:
As crianças pequenas (0-6 anos) passam quase 25 horas por semana em frente aos ecrãs (TV, filmes, videojogos); as crianças e jovens dos 8-18 passam 44.5 horas por semana a ver TV, jogar videojogos, na Internet e a ouvir música, entre outros media. Este tempo excede o que passam com os pais (17 horas) ou na escola (30 horas); 26% das crianças dos 8-18 usam mais de um meio ao mesmo tempo; 63% crianças dos 8-18 vivem em casas em que a TV está ligada durante as refeições; 36% das crianças de seis anos ou menos têm TV nos seus quartos, enquanto são 68% os de 8-18; 53% dos pais de crianças com 8-18 anos não têm regras para consumo de TV.
Ao problema de os meios de comunicação produzirem uma verdadeira “massagem” mediática, acrescenta-se outro: ser a primeira atividade de lazer.

Um estudo da GFK, realizado em 2011, revelou que...
... nos últimos 12 meses, 96% dos portugueses inquiridos escolheram em primeiro lugar a televisão como forma de preencher os tempos livres, o que corresponde a 37% do seu tempo. Os portugueses são dos povos da Europa que mais vêem televisão. Quarenta por cento dos inquiridos dedica 8% do seu tempo semanal a visionar filmes (DVD). Os jovens revelaram ter menos tendência para ver televisão, mas ocupam muito do seu tempo livre a jogar consola ou a ver filmes. O estudo indicou ainda que em quinto lugar aparece a internet (em ascensão), correspondendo a 35% das escolhas e com a qual os portugueses despendem 22% do seu tempo, enquanto apenas 9% é utilizado na leitura de livros.
Pelos vistos, dos povos da Europa e até da Ásia, África e América, os portugueses são os que fazem menos atividades ao ar livre. O estudo torna também evidente que a ocupação do lazer dos portugueses é pobre em termos de atividades culturais.

Por outro lado, os meios de comunicação são também hoje a principal fonte de informação, são “o coração da vida política e cultural… As imagens dos meios de comunicação organizam e ordenam a nossa visão do mundo e os nossos valores mais profundos: o que é bom e mau, o que é positivo e o que é negativo, o que é moral e o que é amoral, ou até imoral. Os meios indicam-nos como comportar-nos ante determinadas situações sociais; propõem-nos o que pensar, que sentir, que crer, que desejar e que temer. Ensinam-nos o que é o homem e o que é a mulher, como vestir-nos, que consumir, de que maneira ser popular e evitar o fracasso; como reagir ante grupos sociais diferentes do nosso e de que modo responder a normas, instituições e valores sociais” (Morduchowichz, 2003, 35 e 43).

Isto significa segundo Riou (2004), que os media ao mesmo tempo que retraíram as “metanarrativas” da ciência, da razão, da religião, das ideologias políticas, do progresso, da liberdade, etc., foram afirmando um papel que ainda há pouco pertencia ao estado, à família, ao sistema educativo, ao exército e à igreja quanto à definição do que a sociedade deve ser.

E o modo como os media desempenham esta função de que se apropriaram está longe de corresponder às expectativas que se construíram a seu respeito. São uma espetacular fonte de divertimento, informação e estimulação intelectual, mas também há motivos para os ver como uma espécie de «educadores selvagens» (Comissão Europeia, 1995, 13).

As críticas neste sentido vão-se avolumando ao mesmo tempo que se assiste ao crescimento das audiências e à intensificação dos consumos. Uns verberam aos meios de comunicação a superficialidade, outros o excesso de violência e sexo num registo libertino, outros ainda a apologia de comportamentos e atitudes deploráveis.

Sobre este assunto falaremos num texto que se encontra aqui.
Carlos de Sousa Reis 

Referências bibliográficas:
- Lipovetsky, G. (2007). A felicidade paradoxal – Ensaio sobre a sociedade do hiperconsumo. Lisboa: Edições 70.
- Morduchowicz, R. (2003). El sentido de una educación en medios. Revista Iberoamericana de Educación, (32), 35-47.
- Riou, N. (2004). Pub fiction. Paris: Éditions d’Organization.

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O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...