Estão a passar
cem anos desde que Niels Bohr publicou a primeira parte do seu artigo
seminal “Sobre a Constituição de Átomos e Moléculas”, na Philosophical Magazine, com a benção de
Ernest Rutherford, em cujo laboratório o autor tinha trabalhado em 1912. Bohr
quando teve o “aha” extraordinário da quantização das orbitais atómicas só
tinha 28 anos. Tinha completado o doutoramento com uma tese sobre teoria de
metais em 1911, quando Rutherford anunciou ao mundo o núcleo atómico que
obrigava ao modelo dos electrões planetários. A física mais revolucionária costuma
surgir de mentes jovens. Já Einstein tinha proposto a teoria da relatividade e
a explicação quântica do efeito fotoléctrico com apenas 26 anos. E o mesmo
haveria de acontecer no ano “mágico” de 1926, com Heisenberg e Dirac, que, com
25 e 24 anos respectivamente, substituíram a mecânica quântica antiga de Bohr
pela mecânica quântica que sobreviveu até hoje.
Em 1913
Rutherford, com 42 anos, estava em Manchester no auge da sua glória. Em
contraste, um dos pais da física moderna J. J. Thomson, com 56 anos, estava anquilosado.
Pelo menos deve ter sido essa a impressão de Bohr que, doutorado de fresco, foi
ao seu encontro em Cambridge e quase não conseguiu comunicar com ele. Por um
lado, o inglês de Bohr era muito deficiente e, por outro e principalmente,
Thomson não quis saber dos erros nos seus escritos que o jovem doutor lhe
apontava. A mudança para o laboratório de Rutherford foi a solução apesar de
Bohr ter sido obrigado a reprimir a sua vocação teórica para fazer trabalho
experimental, na companhia entre outros de Charles Darwin, não obviamente o
famoso naturalista mas um seu neto.
Rutherford
gostava de pôr as mãos na massa, não sendo dado a devaneios teóricos. Mas
percebeu e encorajou o “aha” de Bohr, que com duas hipóteses revolucionárias
(estacionaridade de certas órbitas electrónicas e “saltos quânticos” entre
elas, com emissão ou absorção luz) fixou as bases do modelo atómico actual. Em Março
de 2013 Bohr informava Rutherford do bom acordo com a experiência do seu
modelo: “Tentei demonstrar que... parece
possível dar uma interpretação simples da lei do espectro do hidrogénio e que
do cálculo resulta um acordo quantitativo íntimo com a experiência.“ E mais
adiante: “Espero que concorde em que
adoptei um ponto de vista razoável em relação à delicada questão da utilização
simultânea da antiga mecânica e dos novos pressupostos introduzidos pela teoria
da radiação de Planck. Estou ansioso por saber o que pensa disto tudo.”
Como o acordo era
inequívoco, Rutherford pensava bem, descontado o facto de o “artigo era bastante denso e longo para uma
só publicação”, pelo que que ele acabou por sair em três partes, tendo a
primeira e mais importante aparecido em
Julho (estão publicadas entre nós em “Sobre
a Contituição de Átomos e Moléculas”, Fundação Gulbenkian, 1969). Einstein,
então a caminho da fama, também pensou bem, impressionado como Rutherford pela
descrição dos espectros. Estavam ainda longe os tempos da sua famosa querela
com Bohr. Thomson não pensou nada, mas a sua opinião pouco interessava.
O modelo de Bohr,
aliando Rutherford e Planck, ainda hoje não só um bom exemplo de como se faz
física nova: intuição poderosa escorada em dados experimentais. Mas Rutherford
colocou logo uma notável questão: como saberia um electrão numa órbita mais
alta para que órbita cair? O indeterminismo estava escondido na nova mecânica.
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