segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Curiosity

“Zenão partia sozinho, de madrugada, com as suas tábuas na mão 
e metia-se pelos campos dentro, em busca de não sei que ciência 
saída directamente das coisas. Não se cansava de sopesar e estudar, 
com toda a curiosidade, as pedras cujos contornos polidos e rugosos, 
cujos tons de ferrugem ou de bolor contam uma história, 
testemunham dos metais que as formaram, dos fogos ou águas que 
outrora precipitaram a sua matéria ou coagularam a sua forma.” 

Marguerite Yourcenar, A Obra ao Negro, 1985, 91.

O robô Curiosity aterrou em Marte com a precisão e a suavidade previstas. Quando viram as imagens-testemunhas, os cientistas do centro de controlo da NASA, irmanados nas suas camisolas azuis celestes, pularam, abraçaram-se, gritaram, riram como miúdos que tivessem posto um brinquedo a funcionar.

Para alguém, como eu, pouco familiarizada com as distâncias do Universo e vê Marte muito, muito longe numa circunstância destas, não pode deixar de se perguntar: como é possível? Como  é  possível ter-se conseguido enviar um objecto tão pesado, tão sofisticado mas, simultaneamente, tão frágil por esse espaço fora, tê-lo feito pousar no sítio certo? Como é possível evitar todos os erros que, ocorrendo, comprometeriam tanto trabalho, esforço e dinheiro?

Feito tão extraordinário, tão maravilhoso, parece magia. Mas sabemos que não é. Sabemos que decorre do conhecimento e do aperfeiçoamento técnico. Passo a passo, pacientemente.

Isso é fundamental, sim. Só que não basta, precisa de um motivo: a curiosidade. Na origem de cada empreendimento científico está, esteve e estará esse motivo.

A curiosidade que temos de saber se há ou houve vida algures, que não na Terra, e que tipo de vida foi ou é essa, vem de longe e é grande, de maneira que chamar Curiosity ao instrumento que ajudá a encontrar respostas foi uma opção feliz.

2 comentários:

Joaquim Manuel Ildefonso Dias disse...

Professora Helena Damião;

Estas noticias sobre a exploração de Marte trazem-me à memória o discurso da atribuição do nosso prémio Nobel da Literatura, e as suas criticas, bem explicitas a estas iniciativas. Creio que, no mundo de hoje é para muitos cada vez mais evidente, que José Saramago tinha razão, foi muito feliz ao denunciar estas loucuras e na forma como o fez.

Cordialmente,

João de Castro Nunes disse...

*




Curiosity


De Zenão se refere, o sábio grego,
que não deixava de fazer por nada
em cada dia a sua caminhada,
levado pelo seu desassossego.


Nada escapava à sua observação:
enquanto caminhava, ia indagando
de cada coisa, em que ia reparando,
qual era de existir… sua razão.


Sobremaneira o intrigava o facto
de em certas pedras magoar os pés,
outras havendo de macio tacto.


E foi assim, supõe-se, que a ciência,
aproveitando todas as marés,
ganhou sua moderna consistência!


João de Castro Nunes

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...