sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

SIMPATIA AO DESBARATO (Os nossos queridos inimigos)


Nova crónica da escritora Cristina Carvalho:

A verdade é que todos temos os nossos queridos inimigos. Desde a cabeleireira brasileira que se instalou e tirou a clientela à cabeleireira portuguesa, porque é mais simpática, mais despachada e mais barateira ao nosso vizinho que diz mal de uns e bem de outros, vá lá uma pessoa perceber porquê. E sobretudo os nossos simpatizantes, a quem topamos as manhas à distância e que nos detestam mesmo quando exibem um sorriso luzidio.

E todos têm razão! A escorraçada cabeleireira, o dito simpatizante, etc, etc. Agora, uma coisa é certa! Pessoalmente, aprecio muito os meus inimigos e quero-os bem por perto! Quero estar sempre pronta a aprender com quem sabe menos ainda do que eu e assim evitar os meus próprios danos e erros. Gosto de os observar, de os evidenciar, de trocar impressões com quem analisa e quem percebe de psicologias. Devíamos todos gostar de saber que os nossos inimigos nos espiam e nos atacam na primeira oportunidade. Que existem para isso. Que vivem nos subúrbios da própria memória e que só se lembram de coisas más, atitudes suburbanas de enorme mesquinhez fazendo tentativas desesperadas de evidência mesmo que isso seja à vossa, à minha custa. Vivem num sobressalto permanente se agradam, se não agradam a um longo e inequívoco cortejo de indigente saber. Entram por ínvios e enviesados atalhos de conhecimentos variados para alcançar a vingança. E a vingança – como todos sabemos – é “o prazer da pança” sendo pança algo que mais tarde ou mais cedo, terão. Virão, sim, a inchar e a rebentar de angústia, angústia essa que se virá a localizar-se sempre ao nível do estômago e dos intestinos e que causa uma espécie de flatulência intelectual digna de registo e que deverá ser rapidamente eliminada sob pena de envenenar todos ali à volta e de o/a próprio/a vir a sofrer na sua mesma explosão.

E é assim que as grandes, emergentes e inesperadas simpatias, os grandes gestos simbólicos de altruísmo, de bem-fazer, de atenções variadas com que algumas pessoas nos brindam – todos já fomos alvos das maiores e repentinas simpatias – se traduzem apenas e pontualmente num significado horroroso: o do próprio e exclusivo interesse. De variados interesses: conhecimentos que pensam que podem vir a ter através de uma putativa amizade; fura aqui e fura ali sempre com um sorriso nos lábios como se eu, tu, nós, vós, eles não compreendêssemos o que está por detrás dessas intenções; amabilidades secas e a cheirar a mofo à distância. E como nada obtêm, lá vem a revolta mais o desânimo mais a incompreensão, o diz que diz, o diz que nunca disse, a incompreensão mais a maledicência ao dobrar de todas as esquinas.

Os nossos queridos inimigos vivem a esvoaçar à nossa volta como as abelhas esvoaçam à volta das colmeias, cheios de graça e intenções. Os nossos queridos inimigos, na primeira maré, afogam-nos se entenderem que é preciso. Rejubilam se nos sentirem prejudicados, rejubilam se nos sentirem na mó de baixo. Rejubilam sempre. Deles podemos sempre esperar o pior.

Ora, alguém menos avisado ainda pode embarcar em simpatias destas, simpatias ao desbarato. Passado algum tempo, não muito, as evidências surgem como estampilhas antigas, daquelas que se molhavam na superfície de um copito de água e se viravam para o papel. Baças de um lado, coloridas e brilhantes do outro. E a luz faz-se num instante. Onde antes eram mimos, atenções, beijinhos e afagos, hoje são frases escondidas, ditas de esguelha, cheias de alusões a tudo e a nada. Ou então são silêncios incompreensíveis, silêncios de medo.

Aprendi que, nas primeiras impressões e porque “já cá ando há muito tempo”, nada é o que parece. Pessoas, surgidas dum nada, querem à viva força ser nossos “amigos” como se a amizade fosse assim – zás! Amigos para sempre! –

É a total falta de discernimento e de razoabilidade.

E para não sofrermos muito, todos nós criamos de algum modo as nossas subtis defesas. É melhor assim.

Por isso, as marés vão e voltam e nós cá vamos chapinhando na babugem e, de vez em quando, se a onda se faz a jeito, até mergulhamos de cabeça. E sabe tão bem! É nessa rebentação com alguns suspiros marulhados que vamos saboreando a frescura das amizades verdadeiras que encontramos no imenso mar da nossa vida.

CRISTINA CARVALHO

3 comentários:

Ana Pereira disse...

Não esperava um texto deste género no Rerum Natura. Demasiado pobre, corriqueiro. Não gostei.

Anónimo disse...

Que texto tão fraco, que coisa tão simplória.

Carmen

João Esteves disse...

Boa noite,
Não sei se percebi muito bem a intenção do texto. A gentileza, a simpatia são qualidades que merecem ser cultivadas diariamente. Para ser gentil não há que ter, necessariamente, segundas intenções. Em boa verdade, o principal motivo para sermos amáveis pode residir numa certa maneira de estar na vida, optimista e aberta na relação com os outros. Obviamente que um amigo não se faz de um dia para o outro, mas não é correcto partir do pressuposto de que não há quem o mereça ser.

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