Post sobre história da ciência em Portugal recebido de António José Leonardo (na imagem retrato de Marino Miguel Franzini):
Existem referências da existência de observações meteorológicas em Portugal a partir do século XVII. Segundo Filipe Simões, o astrónomo português António de Najera (ou Naxera) compilou ou conjunto de observações meteorológicas em Lisboa no seu livro intitulado Summa astrológica, onde se pode ler na terceira página do prólogo:
“…Y si fuera bien recebido, y agradar ela disposicion d’este asunto, me ofresco en breve com el favor de Dios Salir a luz com una recopilacion de observaciones y experiencias meteorológicas ácerca de los tiempos e mudanças del Aire q tengo observado espacio de tiempo, todos los dias del ano, y cada uno en particular, los que fueron cálidos, los húmidos y secos, los lluviosos, los templados, y serenos, los ventosos, y tempestuosos, y finalmente en los que uvo truenos, relâmpagos etc” (Simões, 1875, 78).
O médico inglês Thomas Heberder registou o tempo na Madeira no período de 1747-1753, tendo apresentado os resultados à Royal Society de Londres, resultados esses que foram publicados nas Philosophical Transactions (1752-1757). Extractos das observações meteorológicas de Jacob Chrysostomo Pretorius de 1781-1785, membro da Academia de Ciências, foram publicados em quatro volumes no Almanach de Lisboa de 1782 a 1786 (Peixoto & Ferreira, 1986, 262). José Bento Lopes (?-1800), um médico portuense, recolheu ao longo de 1792 dados meteorológicos diários na cidade do Porto (Monteiro, 2001, 167).
No entanto, algumas das primeiras observações meteorológicas realizadas no nosso país de forma sistemática e com um intuito científico terão sido efectuadas a partir de 1816 por Marino Miguel Franzini (1779-1881). Filho do matemático italiano Miguel Franzini (?-1810) que, a convite do Marquês de Pombal, tinha vindo para o nosso país em 1772, por altura da reforma da Universidade de Coimbra e por cá permaneceu até à sua morte (Nunes, 1988). Franzini fez carreira na Marinha, ascendendo ao posto de major do corpo de engenheiros. Demonstrando um interesse invulgar pela meteorologia, montou um pequeno observatório na sua residência onde recolheu dados, diariamente, em dois períodos: de 1816 até a 1826 e de 1835 a 1855. Franzini teve como objectivos, para além do conhecimento dos fenómenos atmosféricos, não só caracterizar o clima de Lisboa, mas também deduzir as leis subjacentes a esses fenómenos. Um objectivo mais prático relacionou-se com a avaliação da quantidade de chuva anual em Lisboa e a sua distribuição ao longo das estações, de forma a melhorar a saúde e higiene públicas através do “abastecimento de água potável e a canalização subterrânea de esgotos.”
Em 1843, Guilherme José António Dias Pegado (1803-85) apresentou ao governo um pedido de constituição de um observatório meteorológico em Lisboa, integrado na Escola Politécnica. Esta instituição não seria apenas “um objecto de ensino mas para [nela] se formarem séries seguidas e ininterrompidas das observações [meteorológicas] comparáveis, e as mais completas possível, do modo e em local que fosse o mais próprio para este fim” (Ferreira, 1940, 7).
Guilherme José Dias Pegado formou-se na UC em Matemática e Filosofia, tendo-se doutorado em Matemática em 1826, o que levou à sua nomeação como assistente do observatório astronómico. Devido às suas ideias liberais foi forçado ao exílio em Brest, França. Após o seu regresso em 1834, ocupou o lugar de lente na Faculdade de Matemática na UC, transferindo-se para a Escola Politécnica de Lisboa, aquando da criação desta em 1837. A iniciativa da fundação de um observatório meteorológico, anexo à Escola Politécnica, terá estado relacionada com a Conferência Internacional de Bruxelas de 23 de Agosto de 1853, que juntou representantes dos Estados Unidos da América, da Grã-Bretanha, da Bélgica, da Dinamarca, da França, da Holanda, da Rússia, da Suécia e de Portugal, na pessoa de J. de Matos Carreira.
O Observatório Meteorológico Infante D. Luís iniciou o funcionamento em Outubro de 1854, tendo Dias Pegado assumido as funções de observador e director. Em colaboração com o Observatório de Paris, começaram em 1857 as primeiras tentativas de previsão do tempo, sendo emitidos alertas de tempestade: no caso de “mau tempo” ou “temporal” eram içados sinais nas estações semafóricas costeiras. Só a partir de 1865 se iniciou a publicação de um boletim diário do Diário de Lisboa que continha o tempo provável nesta cidade para o dia seguinte.
Referências:
- Ferreira, H. Amorim (1940). O observatório do Infante D. Luiz: memória apresentada pelo director do Observatório. Congresso de História da Actividade Científica Portuguesa. Lisboa.
- Monteiro, Ana (2001). O reconhecimento oficial da climatologia em Portugal (1850-1900). História – Revista da Faculdade de Letras. Porto, III Série, 2, 167-174.
- Nunes, Maria de Fátima (1988), O universo estatístico de Marino Miguel Franzini (1800-1860). In O Liberalismo Português: Ideários e Ciências, Lisboa, INIC.
- Peixoto, José Pinto & Ferreira, José F. V. G. (1986). As Ciências Geofísicas em Portugal. História e desenvolvimento da ciência em Portugal. Lisboa.
- Simões, A. Filipe (1875). Notícia do posto meteorológico de Évora. O Instituto, 78-83.
António José Leonardo
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
ESTUQUE
Por A. Galopim de Carvalho Uma das utilizações do gesso, a um tempo técnica e artística, vem de longe e materializa-se no estuque, produto...
-
Perguntaram-me da revista Visão Júnior: "Porque é que o lume é azul? Gostava mesmo de saber porque, quando a minha mãe está a cozinh...
-
Usa-se muitas vezes a expressão «argumento de autoridade» como sinónimo de «mau argumento de autoridade». Todavia, nem todos os argumentos d...
-
Cap. 43 do livro "Bibliotecas. Uma maratona de pessoas e livros", de Abílio Guimarães, publicado pela Entrefolhos , que vou apr...
Sem comentários:
Enviar um comentário