sábado, 15 de dezembro de 2012

Uma nota sobre a verdade

Uma das razões que faz muitos cientistas evitar a palavra “verdade”, usando ao invés “validade”, talvez seja a confusão que a primeira provoca. Isto é irónico porque é como alguém que tem medo de dizer asneiras sobre a aceleração e acaba dizendo asneiras sobre a velocidade: coisas diferentes, mas relacionadas.

O que é a verdade? Mal se faz a pergunta as pessoas comuns pensam logo em respostas místicas e olhares esgazeados. Mas isto só acontece porque têm uma literacia filosófica que tende para zero. É como pensar que o estudo da origem do cosmos ou o estudo das origens da humanidade tem de envolver misticismos baratos, ignorando o que se faz em ciências sóbrias como a cosmologia científica ou a paleontologia. 

Não é fácil saber o que é a verdade, tal como não é fácil saber qual é a origem do cosmos. Mas isso não significa que não possamos ter uma ideia mais clara do que tem quem nunca estudou coisa alguma sobre isso. O que vou dizer de seguida são aspectos elementares da verdade que qualquer teoria sofisticada terá de aceitar ou pelo menos de apresentar razões adequadas para rejeitar. Por outras palavras, vou caracterizar aqueles aspectos elementares da verdade que qualquer pessoa tem de dominar para não dizer asneiras quando usa a palavra “verdade”.

A verdade não é uma propriedade de coisas como árvores, factos ou pessoas, ainda que se possa usar a palavra num sentido metafórico para dizer que o “Jacinto é muito verdadeiro” (querendo dizer que ele é autêntico). Os factos não são verdadeiros nem falsos; os factos existem, quando existem. Pensar que os factos são verdadeiros ou falsos é um erro categorial. Mas quando alguém pensa um certo tipo de coisas, isso que ela pensa é por vezes verdadeiro e por vezes falso. Quando alguém pensa que Einstein era italiano, está a pensar uma falsidade porque Einstein não era italiano. E continuará a ser uma falsidade por mais que a pessoa tenha a certeza. A certeza é apenas uma atitude mental sem qualquer relação relevante com a verdade. 

Esta é a primeira confusão que as pessoas fazem. Confundem “certo” com “certeza”. A certeza é apenas uma medida da força da convicção humana. Como os seres humanos são evidentemente falíveis, uma pessoa cheia de certezas pode ter a cabeça cheia de falsidades. O que é certo, por outro lado, é diferente da certeza; o certo é apenas o verdadeiro. E o que nos interessa realmente é a verdade, e não a certeza.  

O que nos conduz à mais brutal confusão que as pessoas fazem quanto à verdade: confundem o ser verdadeiro ou falso com o sabermos que é verdadeiro ou falso. Pensam que se não sabemos que algo é verdadeiro, então isso não é verdadeiro. Isto seria uma beleza porque nos tornaria infalíveis. Mas é uma tolice. A verdade nada depende das nossas convicções, nem das certezas. Uma ideia é verdadeira exclusivamente quando as coisas são como a ideia diz que são, e isso nada tem a ver com o sabermos que as coisas são desse modo.

Por exemplo, ninguém sabe se alguma das versões da teoria das cordas é verdadeira ou falsa. Alguns cientistas pensam que sim, outros que não. Todavia, a única coisa relevante para que uma das versões da teoria das cordas seja verdadeira é que a realidade seja de um certo modo. Podemos nunca vir a descobrir se a realidade é desse modo ou não, caso em que nunca saberemos se alguma dessas teorias é verdadeira ou não. Mas isso nada tem a ver com a verdade ou falsidade da teoria.

Ou seja: uma coisa é a verdade outra coisa completamente diferente é saber o que é verdade. Uma teoria não é verdadeira ou falsa em função dos indícios que temos a seu favor. Uma teoria é verdadeira ou falsa em função de a realidade ser dessa maneira ou não. Os indícios que temos a favor dela são apenas justificações para a nossa convicção de que a teoria é verdadeira. Acontece que, por sermos falíveis, podemos ter azar epistémico: podemos estar em circunstâncias, como Ptolomeu, em que todos os indícios apontam para uma teoria, que todavia é falsa.

Daqui se vê que é um disparate afirmar que em ciência nunca há teorias verdadeiras. Claro que há. Tal como fora da ciência. Tudo o que é preciso para que uma teoria seja verdadeira é acertar na verdade — o que pode acontecer por sorte, pois felizmente não há apenas azar epistémico. O que se quer dizer ao afirmar que em ciência nunca há teorias verdadeiras (ou que a verdade é provisória) é outra coisa completamente diferente: é que, dada uma qualquer teoria científica que hoje temos as melhores razões para pensar que é verdadeira, podemos estar enganados e vir a descobrir que afinal era falsa. Só que isto acontece não devido à natureza da ciência mas antes devido à falibilidade humana. E acontece em todas as áreas, seja a ciência, a religião, o senso comum ou a filosofia: qualquer coisa que pensemos e que julguemos estar muitíssimo bem justificado, pode ser falso e podemos vir a descobrir mais tarde que era falso. Se há algo de grandioso e de aplaudir em alguns seres humanos é a disponibilidade para aceitar a descoberta de que o que antes julgávamos verdadeiro era afinal falso. 

Todavia, quando descobrimos (ou julgamos descobrir, pois também aqui podemos estar enganados) que o que antes pensávamos que era verdadeiro é afinal falso, não foi a verdade que mudou. O que antes pensávamos que era verdadeiro não era verdadeiro, tornando-se depois falso; sempre foi falso, mas nós pensávamos erradamente que era verdadeiro. Por exemplo, se a Terra se move, nunca foi verdadeiro no tempo de Ptolomeu que a Terra estava imóvel. E por isso é um disparate dizer que era verdadeiro que a Terra estava imóvel e hoje é falso. O que se passa é que as pessoas pensavam que era verdadeiro que a Terra estava imóvel, e hoje pensam que é falso. Se não distinguirmos a verdade do que pensamos que é a verdade, ficamos mergulhados em confusão. 

46 comentários:

Unknown disse...

Muito bom, parabéns

Anónimo disse...

Galois

« Ou seja: uma coisa é a verdade outra coisa completamente diferente é saber o que é verdade. Uma teoria não é verdadeira ou falsa em função dos indícios que temos a seu favor. Uma teoria é verdadeira ou falsa em função de a realidade ser dessa maneira ou não. Os indícios que temos a favor dela são apenas justificações para a nossa convicção de que a teoria é verdadeira. »

Totalmente de acordo. Observo também, relacionado com esta temática, que há um intruso muito curioso e importante que é o conceito de «utilidade». Nós conseguimos fazer coisas com as nossas teorias científicas bem como somos capazes de grandes previsões. Mas a utilidade não está totalmente relacionada com a verdade. Por vezes as pessoas relacionam os nossos sucessos e façanhas com a «verdade científica». A teoria científica é verdadeira devido às televisões que temos a funcionar em casa. Isso é um erro. Os antigos tinham teorias falsas muito, mas mesmo muito úteis. Com as suas teorias faziam fantásticas e engenhosas previsões. Provavelmente os feitos e objectos incríveis que conseguimos fazer actualmente têm por base teorias falsas ou incompletas! Acontece que são «as melhores» teorias que temos agora por nos deixarem convictos de que explicam a realidade. Mas, como bem diz, convicção não é verdade. E grande utilidade e previsão pode não ser verdade, mas sim apenas forte convicção. A história da ciência gira à volta disto.

«Se há algo de grandioso e de aplaudir em alguns seres humanos é a disponibilidade para aceitar a descoberta de que o que antes julgávamos verdadeiro era afinal falso. »

E, na minha opinião, essa capacidade é a chave mágica para o avanço da ciência. Essa disponibilidade, juntamente com a curiosidade, é a chave. E aceitar que o que antes era considerado verdadeiro é afinal falso é, talvez, a tarefa mais difícil para a comunidade científica (e isto relaciona-se com a temática de posts recentes).

No entanto, volto a dizer que «teoria matemática» (por ser ciência exacta) tem um significado diferente. Numa teoria matemática, a realidade verdadeira pode ser substituída por um modelo totalmente inventado pelo ser humano. Uma axiomática pode ser consistente com um modelo totalmente concebido na nossa mente. E esse modelo é que traz a «verdade» à axiomática. Desde que de acordo com as regras matemáticas, os matemáticos podem inventar a sua realidade.

Anónimo disse...

Mae-Wan Ho fala sobre a verdade e de facto "uma coisa é a Verdade, outra coisa completamente diferente é saber o que é Verdade." É por isso que precisamos de de ir além da ciência, ela é apenas uma parte do cosmos, nós somos conscientes e não precisamos de aguardar que a ciência prove a existência da consciência para que a possamos usar. A ciência é Visão, não o contrário. Eis aqui um exemplo de alguém que abriu os olhos e que aprendeu alguma coisa com a investigação.
BigPicture interviews Dr. Mae Wan Ho
https://www.youtube.com/watch?v=t9JIVU5J4TY&list=UL

Carlos Ricardo Soares disse...

A talho de foice e na expectativa de que o Desidério aprofunde um pouco o tema, deveras interessante, ocorre-me dizer o seguinte.
O conceito de verdade apresentado parece ser a noção geral de verdade como a de não divergência entre o que pensamos sobre algo e o que esse algo é (não o que possa ser, independentemente do que podemos pensar) ou de correspondência entre a ideia que fazemos da realidade e a realidade. Neste caso, a minha verdade seria o quê? O que eu sei sobre determinada realidade? Mas o que eu sei, em que termos e em que extensão e de que modo (estético, sensorial, intelectual, matemático)? O que é uma suficiente e adequada correspondência entre o que eu sei da realidade e essa realidade? Até que ponto preciso de pensar ou de dizer sobre (o meu conhecimento) a realidade para estabelecer a correspondência com a ideia verdadeira?
Outra questão que me ocorre é a seguinte: podemos estar a pensar verdadeiro e não o sabermos. Neste caso diríamos que não conhecemos a verdade. E isto não seria verdadeiro.
Por outro lado, se considerarmos que todas as realidades abarcáveis podem ser parcelas ou partes ou episódios ou fases ou momentos de realidades inabarcáveis que, por sua vez são partes… de uma realidade totalmente inabarcável (semelhante a alguém que tivesse nascido e visto os alicerces de uma casa e morrido sem ter visto a casa concluída, ou sequer o projecto, mas haverá melhores exemplos) a verdade é algo de inacessível. Ainda que o fosse por mera dedução, se a deduzíssemos, admitiríamos ser verdade uma realidade desconhecida.

Anónimo disse...

É por isso que distinguimos na escrita a palavra "verdade" e "Verdade", ou seja, qualquer acordo ortográfico que dissolva esta diferenciação é uma patranha.

Desidério Murcho disse...

Ainda há pouco tempo li uma resposta a uma recensão que Thomas Nagel fez do último livro de Plantinga. Nessa resposta Leiter e outro gajo que não me lembro o nome usavam o argumento rídiculo de que sabemos que a nossa ciência é verdadeira porque funciona. O mesmo poderiam ter dito os romanos. A nossa tecnologia sempre funciona, pela simples razão de que onde há seres humanos é a aplicação prática de ideias, e esse é o sentido mínimo de "tecnologia". É verdade que as aplicações actuais mais sofisticadas dependem também de aspectos mais sofisticados da ciência do que a tecnologia dos romanos. Mas não depende da maior parte da nossa ciência fundamental, cuja falsidade massiva é perfeitamente compatível com os iPads e, ainda mais, com gajos na Lua a falar de passos de gigante para a humanidade. Quando as pessoas escrevem coisas destas ou são ignorantes ou fazem-se de parvas para poderem fazer a sua guerra privada contra a religião (Nagel incomoda muita gente porque, como eu, leva a sério, apesar de ser ateu, as ideias mais radicalmente contrárias à mundividência científica, desde que inteligentemente desenvolvidas, como é o caso de Plantinga, um dos mais importantes filósofos contemporâneos que Dawkins gostaria de mandar para a fogueira, se pudesse -- ou, num gesto de imensa clemência e tolerância, deixá-lo apenas ser um merceeiro, mas jamais um professor que pode poluir as mentes dos jovens, nem um investigador pago, para investigar tolices anticientíficas).

José Batista disse...

Não sendo muito habilitado em matéria filosófica, leio sempre com muito interesse os textos de Desidério Murcho, e aprecio grande parte dos muitos comentários que desencadeia.
Deste texto gostei particularmente.
Hesitei em comentar, mas a opinião de Carlos R. Soares fez-me decidir. Passo a expor:

A verdade é um conceito ou é a realidade tal qual ocorre, independentemente de qualquer sujeito pensante que procura conhecê-la?

Tomando a verdade como o acontecimento e o decurso real dos fenómenos, ela é, alguma vez, em tempo algum, acessível aos seres pensantes em toda a sua extensão e exatidão?

Imaginando que não há sujeitos pensantes que procurem a verdade, faz sentido falar de verdade?

A verdade não está condenada a ser um produto de cérebros pensantes, restrita ao domínio e à amplitude das capacidades desses cérebros?

O ser humano faz a verdade? Ou ele é, quando pode (e manda), a verdade?

Não sei se exprimi adequadamente as minhas dúvidas.

Mas, como professor de biologia (do ensino secundário) foi honestamente que as coloquei.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

A verdade é muda que um dia fora, semente.

Regar verdade a ter por fruto, sabedoria.

António Bettencourt disse...

Não fará a ciência essa mesma separação de águas entre aquilo que é verdadeiro, no sentido de estar de acordo com a verdade, e aquilo que é uma mera possibilidade de verdade quando distingue teoria de lei?

Por exemplo, existe uma lei da gravidade mas a relatividade é apenas uma teoria.

Anónimo disse...

Galois

A questão da «verdade» e sua definição parece-me do campo da filosofia e, portanto, sou totalmente ignorante. O que não me impede de comentar...

Partilho uma questão que me parece muito relacionada com os comentários de Carlos Soares e José Batista.

A verdade precisa de ser pensada? Se explodirem os locais com «pensantes» deixa de haver verdade?

Eu gosto de pensar que não. Vejo a verdade como a causa da consistência do Universo (uma espécie de axiomática que não o torna contraditório). A ciência dá uma boa pista para a ideia de um Universo não contraditório. E o Universo seria, à luz dessa «verdade», consistente com ou sem nós (e outros tais). Feynman dizia que a lei da gravidade podia ser escrita elegantemente através da matemática mas, que em última análise, ninguém sabia o seu porquê, a sua causa última. Essa simbologia matemática tem milhões de óptimas consequências, mas não é um porquê universal (antes de ser mal interpretado, sou totalmente agnóstico). Gosto de pensar na verdade como essa espécie de axiomática que dá a consistência ao Universo e que, com outra, poderíamos ter algo igualmente consistente e com outras leis a ser trilhadas (eventualmente) por seres com nós.

Devo estar a espalhar-me, mas ok!

Anónimo disse...

Galois

De uma forma menos palavrosa. Existem dois verbos com significados diferentes que, por vezes, são usados como se fossem a mesma coisa (mesmo por gente erudita): «inventar» e «descobrir» E não são...
«Descobriram-se os números imaginários», «Inventou-se a electricidade», etc.

Para mim, a «verdade» pertence à classe das coisas que se descobrem. A verdade já lá está. Se há entes para a descobrir ou não, isso é outra coisa. Repare-se que esta ideia não está relacionada com outra questão que é a do «acaso». Pode haver um Universo consistente com elementos puros de acaso e baseado em fenómenos aleatórios. Não deixa de ser consistente por isso. Consistência e determinismo são coisas diferentes.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Trilhar por multiplicar: verdade enquanto capacidade, instrumento de concórdia.

Desidério Murcho disse...

A verdade é uma propriedade de alguns pensamentos. O pensamento de que a água é H2O é verdadeiro se a água for realmente H2O. Mas a água em si não é verdadeira nem falsa. O que é verdadeiro ou falso são os pensamentos que visam representar algo. Consequentemente, sem pensamentos não há verdade. Mas as coisas que tornariam verdadeiros os pensamentos, se existissem, continuam existindo. Pensemos na Terra antes de haver quaisquer seres vivos. Não há também verdades no planeta Terra. Mas se já havia água, já era uma realidade que a água era H2O. Apenas não havia qualquer agente cognitivo que representasse tal coisa, e por isso não havia verdades. Ficou mais claro, agora?

Anónimo disse...

Galois

Está a separar o conceito de existência do conceito de verdade. É isso, não é?

A existência é autónoma não dependendo de entes pensantes.
A verdade depende.

Realmente podemos considerar pensamentos verdadeiros sobre coisas que não existem. Pelo que a verdade não pode depender da existência...

Comentarei mais tarde. Deixe-me reflectir um pouco sobre isso e pensar um pouco onde é que a ideia da não contradição entra aí.

Desidério Murcho disse...

A chamada "lei da gravidade" é apenas o que uma dada teoria diz que existe. Podemos estar enganados, tal como podemos estar enganados quando pensamos que qualquer teoria, como a da relatividade, é verdadeira.

A ideia de leis é enganadora porque se trata de uma metáfora: as leis propriamente ditas são legislações feitas por seres humanos. A natureza não obedece a leis como um ser humano obedece à lei.

Desidério Murcho disse...

Inventar é fazer uma realidade. Descobrir é dar-se conta de uma realidade.

Carlos Ricardo Soares disse...

Entretanto, fiquei a pensar na composição química da água (H2O) e na questão de inventar = fazer uma realidade. Presumo que o Desidério não está a considerar que, sempre que alguém produz ou faz água por reação de oxigénio com hidrogénio, está a inventar uma realidade, porque já conhecemos a água.
Mas podemos supor uma situação em que alguém inventaria a água se a desconhecesse e, dispondo de oxigénio e de hidrogénio, conseguisse obtê-la por reação química. Neste caso, tratar-se-ia de uma invenção de uma realidade que já existia.
Embora, neste caso, e isto já é outra questão, eu não esteja a imaginar que tipo de raciocínio permitiria a quem não conhecesse a água, mas conhecesse o hidrogénio e o oxigénio, concluir que uma molécula de hidrogénio e uma de oxigénio dariam uma de água? (Se é que estou a exprimir-me bem).

Unknown disse...

por qualquer razão misteriosa volta e meio tento perceber os seus comentários, e confesso que me fascina alguém possa encontrar neles algum sentido ou propósito.

Anónimo disse...

Galois

Vou fazer um paralelo com conceitos que conheço da matemática. E vou abreviar a prosa.

Há uma axiomática (aceite sem prova, espécie de regras do jogo).

Utilizando-a, podemos encarar teoremas que são susceptíveis de ser provados e verdadeiros.

Fora isso, pode existir um modelo (repare-se no «existir»), modelo inspirado na natureza ou inventado, não contraditório com a axiomática e que, portanto, valida a axiomática.

Aqui aparece o verbo «validar» (estou a usar a prosa típica de um matemático). A questão é que podemos ter uma axiomática e sermos ignorantes, não sabendo se gera ou não contradição. A axiomática torna-se válida perante um modelo, uma vez que, existindo modelo compatível, ficamos descansados face à não contradição.

O modelo diz respeito ao «existir». Um modelo é o que é. O modelo não é verdadeiro ou falso, apenas é.

Decorrentes da axiomática, os teoremas, propriedades e suas consequências que, por vezes, formam o que chamamos «teoria» dizem respeito à «verdade» e são estes que requerem agente cognitivo.

A questão da invenção pode aparecer no modelo que, no caso da matemática, pode ser inventado (o que a distingue das ciências naturais).

Se percebi, e estando melhor definidas as coisas, continuo a achar que a verdade, embora requerendo agente cognitivo, não é do campo da invenção. As pessoas não inventam teoremas. Os matemáticos enunciam teoremas e demonstram os mesmos. Se forem bem sucedidos, o teorema «já lá estava à espera» antes disso.

Quanto ao último interessante comentário de Carlos Soares, visto a existência ser autónoma, parece possível uma pessoa inventar algo, podendo ficar na dúvida para sempre se essa coisa existe ou não no nosso Universo. Parece-me que é importante refinar o «inventar» e «descobrir». Será «inventar» um conceito relativo à consciência ou não da existência de dada coisa. Os números imaginários são inventados? (eu acho que sim) O que os torna imunes à preocupação do Carlos Soares?

António Bettencourt disse...

Simplesmente ridículo.

Desidério Murcho disse...

Nunca se faz uma realidade ex nihilo. E nunca vimos uma realidade aparecer ex nihilo. Tudo o que podemos fazer é transformar uma coisa noutra coisa. E tudo o que vemos é transformações de uma coisa noutra.

Mas se queremos diferenciar a invenção da descoberta, e penso que é crucial distinguir as duas coisas, inventamos quando fazemos algo (o que significa, de facto, transformar uma coisa noutra), ao passo que descobrimos quando nos damos conta de algo. Inventamos poemas, mas descobrimos leis da natureza, por exemplo.

O Galois pergunta-se se no caso da matemática é invenção ou descoberta. Os empiristas pensam que é invenção, porque para eles a matemática é como escrever romances. Mas eu penso que isto é uma ilusão. A matemática é a descoberta de estrutura muitíssimo gerais da realidade. Leis das leis da natureza, se quisermos.

Desidério Murcho disse...

Não, a verdade não é inventada, excepto nos casos em que escrevemos romances ou inventamos histórias. Quem diz isso é porque está mergulhado em confusão. se a verdade fosse inventada, seria fácil resolver as maiores desgraças humanas, como a fome, as doenças e a miséria: bastaria proibir por lei que as pessoas continuassem a inventar tais coisas.

Quando é verdade que a água é H2O isso é algo que resulta exclusivamente de 1) haver alguém que pensa que ela é H2O e 2) de a água ser H2O. A condição 1, mal entendida, faz pensar que é invenção, mas isso é porque não se vê a condição 2. Não basta a condição 1 para haver verdade, pois muitas vezes pensamos que algo é tal e tal e afinal não é. Quem pensa que basta 1 para haver verdade é parvo, pois isso implicaria a nossa omnisciência. A condição 2 é crucial. Se a água, ao contrário do que pensamos, não é realmente H2O, então todas as pessoas que pensaram que o era estavam pensando uma falsidade, e não uma verdade.

Desidério Murcho disse...

No que respeita à matemática e à lógica há por vezes uma confusão elementar que podemos eliminar já.

Os axiomas não se provam como se prova um teorema. A estrutura da prova, se encarada de modo simplista e fundacionalista, está condenada a partir de indemostráveis. Isto dá a ideia de que há algo de arbitrário na lógica e matemática, mas é uma ilusão. As razões são as seguintes:

1) Mesmo que os axiomas e regras de inferência fossem arbitrários, não é arbitrário que dado um axioma A se deriva validamente o teorema T. Este resultado em si é uma descoberta, e não uma invenção. Isto não depende da vontade de quem fez o axioma ou as regras de inferência. É independente disso.

2) Numa concepção menos infantil de prova, os axiomas são provados pelas suas consequências, pelo sistema mais vasto em que estão inseridos. Se fazemos um sistema axiomático que visa explicar algo e a totalidade do sistema, depois de explorado, não explica ou explica inadequadamente as coisas, então esse sistema é deficiente. Por outro lado, quando um sistema axiomático funciona bem e é iluminante e explicativo, isso é uma boa razão para pensar que tais axiomas são verdadeiros. Não temos uma demonstração dos axiomas -- se tivéssemos, seriam teoremas, em vez de axiomas -- mas temos boas razões (não fundacionalistas) para pensar que são verdadeiros.

Anónimo disse...

Galois

De acordo.

Quando falo de validade não estou a falar de teoremas (que são objectos susceptíveis de demonstração por inferência lógica a partir dos axiomas, e portanto objectos não inventados).

Quando falo de validade falo do perigo primordial da axiomática que é a contradição. Se de uma axiomática pudermos provar algo e o seu contrário, a axiomática não é consistente. O que acontece (e há bons exemplos na história da matemática) é, por não encontrarmos contradições, ficarmos na dúvida quanto à consistência da axiomática. É aqui que entram os modelos, havendo um modelo compatível com a axiomática, isso significa que ela é consistente. Como bem diz, isso não é uma «demonstração» dos axiomas. Os axiomas não são teoremas nem objectos susceptíveis de demonstração.

O que se pode dizer quanto a uma «boa axiomática» é que esta deve ser consistente e «económica» no sentido em que são tudo axiomas (não há nenhum que seja dependente no sentido em que pode ser demonstrado com os outros; o termo técnico é independência).

O que eu disse até agora é não se sente muito a necessidade da natureza e fenómenos naturais.

A questão da completude é que está mais próxima do problema da realidade. Se tivermos um universo que queremos «explicar» através de uma axiomática, a dita axiomática pode ser incompleta se não conseguir «explicar» tudo. Em matemática chamam-se indecidíveis os «teoremas» (não são teoremas) em relação aos quais não se pode provar a veracidade nem provar a falsidade.

Eu penso que isto tudo está de acordo com o que o Desidério diz. A minha questão ia no sentido de sair da visão habitual da matemática, tentando generalizar os conceitos para a filosofia e existência em geral.

Desidério Murcho disse...

Sim, está falando de coisas que conheço relativamente bem, porque dizem respeito aos fundamentos da matemática, e estes envolvem conceitos lógicos e não matemáticos.

A própria ideia de que um conjunto de axiomas tem de ser consistente pode ser posto em causa. Há vários sistemas lógicos paraconsistentes que lidam bem com a inconsistência. Nos sistemas não-paraconsistentes uma contradição trivializa o sistema, porque se aceita o princípio geral de que de A e não-A se deriva validamente seja o que for. Logo, deriva-se tudo o que quisermos de um sistema inconsistente e por isso não tem interesse. Mas as lógicas paraconsistentes bloqueiam este princípio, e como não permitem que se derive tudo de uma contradição, podemos assim ter sistemas inconsistentes não triviais.

Anónimo disse...

Galois

Não sei nada de sistemas axiomáticos paraconsistentes. Mas vou tentar informar-me.

Esta conversa está a ser boa. De um modo geral, concordo com muita coisa.

No início, estava a usar mal a palavra «verdade», por tentar enquadrar a mesma no contexto da discussão. Mas o problema era meu (ou seja, essa contextualização só era necessária na minha cabeça), a palavra estava a ser usada por vós exactamente da mesma maneira do que na matemática (requerendo ente pensante, baseada na inferência lógica).

O único tópico ainda não definido de uma maneira totalmente convincente (pelo menos para mim) é o que diz respeito à distinção inventar/descobrir.

Vou pensar um pouco no que foi escrito por vós e, espero, opinarei um pouco mais sobre isso.

Anónimo disse...

Galois

Comentário 1)
«Inventar é fazer uma realidade. Descobrir é dar-se conta de uma realidade.»

Parece óptimo. Mas, na minha opinião, o conceito precisa de ser mais desenvolvido para dar cabo de algumas dúvidas.

Comentário 2)
«Mas podemos supor uma situação em que alguém inventaria a água se a desconhecesse e, dispondo de oxigénio e de hidrogénio, conseguisse obtê-la por reação química. Neste caso, tratar-se-ia de uma invenção de uma realidade que já existia.»

Nomeadamente esta dúvida! (que também me dá que pensar) A questão que se coloca é a de saber se inventar está ou não relacionado com a consciência que o ente pensante tem da existência de uma coisa. Penso eu que não deve estar, caso contrário não haveria distinção clara entre invenção e descoberta. Quando se descobre algo, normalmente também não há essa consciência.

Comentário 3)
«Nunca se faz uma realidade ex nihilo. tudo o que vemos é transformações de uma coisa noutra.»

Este comentário, embora procurando esclarecer, no meu caso, mantém ainda a dúvida... É que, a meu ver, não é mesmo nada fácil. Partamos de vários exemplos:

a) «Mensagem» de Fernando Pessoa; b) Teorema de Pitágoras; c) Água por reacção química; d) Roda

a) Parece claramente inventado; b) parece claramente descoberto (e posteriormente provado); c) parece descoberto, mas a ideia do comentário 2 é pertinente; d) diz-se uma invenção (a invenção da roda) mas, na mina opinião, parece uma descoberta.

Espero boas sugestões para a distinção (mais desenvolvidas do que o comentário 1).

A título de exemplo, vi rapidamente um dicionário online:

Inventar: Achar, criar algo de novo. Imaginar uma coisa que se dá como real.

Descobrir: Encontrar o que era desconhecido, que estava escondido; achar. Inventar.

Não deixa de ter graça a dificuldade da coisa.

Anónimo disse...

Galois

Um dos problemas está relacionado com os verbos utilizados. No caso da construção matemática, os termos usuais apontam para no «estabelecimento de uma axiomática», «definição de objectos matemáticos», «enunciado e demonstração de teoremas». Os verbos usuais são estes, estabelecer, definir, enunciar e demonstrar. Este «enunciar» e «demonstrar», a meu ver, está próximo do descobrir, uma vez que o teorema já lá estava como objecto alcançável por inferência lógica a partir dos axiomas. O acto de inventar está mais relacionado com os actos de «estabelecer» e «definir». Os tais modelos que validam a consistência de uma axiomática envolvem usualmente definições e, a meu ver, estão muitas vezes no campo da invenção. A ideia de «nunca se faz uma realidade ex nihilo» é compatível com isto (e a contrária também).

Quando falamos da realidade (seja lá o que isso é, e essa é uma questão pertinente), um objecto existe na realidade ou não. Se existir e, mesmo que de forma inconsciente, se dê com ele, o ente cognitivo apenas o descobriu. Dessa forma, a água por reacção , mesmo que de forma ignorante, não passará de uma descoberta. Essa reacção já existe na natureza (segundo percebi, era essa a questão). No caso da «Mensagem», admitindo que no nosso Universo o Fernando Pessoa propôs algo de totalmente novo inexistente antes dele, estamos a falar de uma invenção.

Isto faz sentido?

Aires Almeida disse...

Chegado bastante tarde à conversa e sem me querer alongar muito, creio que a confusão entre inventar e descobrir decorre de uma confusão persistente entre metafísica e epistemologia. "Inventar" é um termo metafísico ao passo que "descobrir" é um termo epistémico.

Carlos Ricardo Soares disse...

Problematizando um pouco mais a questão da verdade e da correspondência da ideia com a realidade. Tomemos o exemplo de alguém que afirma que a água é H2O e que a água é H2O. Essa pessoa afirma uma verdade. No entanto, não tem necessariamente conhecimento dessa verdade. Pode até fazer uma ideia do que está a afirmar sem qualquer correspondência com a realidade ou não fazer ideia nenhuma. Mas suponhamos que é um cientista da química que o afirma e que até já fez a experiência. Que ideia faz ele da realidade e que correspondência é possível estabelecer com a realidade? Até que ponto ele conhece os átomos de hidrogénio e de oxigénio e a molécula da água e que ideia faz disso?

Unknown disse...

Ou muito me engano ou trata-se apenas do significado das palavras e «inventar» é a criação de algo (onde o "algo" não existia antes, pelo menos nessa forma) e descobrir é encontrar ou revelar. São bem distintas. Parece-me que é apenas isto, ou não?

Anónimo disse...

Galois

A ideia é essa. Mas estava-se a elaborar um pouco mais.

Por exemplo, o Teorema de Pitágoras é descoberto (descobrir não é o grande verbo, mas certamente que não é inventado).

De onde vem o facto de ser descoberto? O Teorema de Pitágoras não é algo que se diga existir como se diz que uma maçã existe. O Teorema de Pitágoras é algo que se enuncia e se demonstra com argumentação lógica.

Mas, de certa forma já lá estava. Ou seja, embora não existisse como uma maçã, existia como objecto susceptível de ser alcançado com argumentação lógica.

Outro comentário, feito por Carlos Soares dizia respeito, de certa forma, à questão da consciência do ser pensante.

«Mas podemos supor uma situação em que alguém inventaria a água se a desconhecesse e, dispondo de oxigénio e de hidrogénio, conseguisse obtê-la por reação química. Neste caso, tratar-se-ia de uma invenção de uma realidade que já existia.»

Ou seja, concordando consigo, estava-se a tentar elaborar um pouco a definição para lidar mais cristalinamente com estes problemas.

Ainda que seja um pouco ignorante na linguagem filosófica, julgo perceber e concordar com o que disse Aires Almeida (na medida em que traduz a mesma ideia)
"Inventar" é um termo metafísico ao passo que "descobrir" é um termo epistémico.

É só uma questão de acertar bem no alvo na forma como se diz a coisa.

Anónimo disse...

Que grande discussão. é simples a meu ver: a verdade é aquilo em que se acredita em cada momento. Sendo assim a verdade é relativa e corresponde a um enunciado que se validou.

Fernando Caldeira disse...

D.M.:
"A chamada "lei da gravidade" é apenas o que uma dada teoria diz que existe. Podemos estar enganados, tal como podemos estar enganados quando pensamos que qualquer teoria, como a da relatividade, é verdadeira"

Eu penso que se estivéssemos enganados sobre a "lei da gravidade" os aviões não voariam, nunca o homem teria ido à Lua, nunca teriam conseguido colocar uma nave em Marte, etc., etc. Ah! e a Torre de Pisa também játeria caído há muito.
E isto não é uma metáfora...

Anónimo disse...

Galois

Segundo e terceiro comentários (a propósito das façanhas humanas e da utilidade).

Desidério Murcho disse...

Podemos estar enganados quanto ao que faz os objectos cair e quanto ao que permite que um avião voe. A ideia de que as teorias científicas são verdadeiras porque funcionam é falsa. Se forem verdadeiras é exclusivamante porque a realidade é como essas teorias dizem que é. Ora, sabemos de muitas teorias que mais tarde descobrimos que são falsas apesar de funcionarem adequadamente em muitos contextos.

Somos falíveis. Isto significa que mesmo as nossas melhores teorias talvez sejam falsas. Mas isto não significa que somos nós que fazemos a realidade ser como é.

Desidério Murcho disse...

Se tiver tempo farei uma nota sobre o que é uma lei da natureza. A concepção comum entre os cientistas é incoerente e baseada em confusão e ignorância.

Desidério Murcho disse...

Na verdade, e ironicamente, é uma concepção religiosa.

Desidério Murcho disse...

Se a verdade for aquilo em que se acredita em cada momento, quem acredita que a Terra é plana tem razão porque isso é verdade. E se isso for assim, a verdade não corresponde a um enunciado que se validou. Por outro lado, a verdade certamente não corresponde a um enunciado que se valida porque se valida muitos enunciados que mais tarde descobrimos serem falsos. A verdade nada tem a ver com a nossa validação de que é verdadeiro. Validar algo, que sem lodo verbal quer apenas dizer ter indícios a seu favor, como quando vemos nevar isso valida que está nevando, apenas torna mais provável que o que pensamos é verdadeiro, mas não garante que o é. Se garantisse, seríamos infalíveis.

Anónimo disse...

Galois

O problema da colagem total da ciência à sua aplicação não é apenas um problema de concepção errónea. É também um problema que tem consequências na forma como as instituições universitárias fazem as suas hierarquias de importância e utilizam os seus dinheiros.

Eu era capaz de apostar que a maioria dos vultos científicos da história da humanidade, em última análise, se estão marimbando para a aplicação. O que eles querem é compreender os fenómenos para poderem saciar a sua curiosidade. Juntam esses três condimentos mágicos: sofisticação de pensamento, persistência e curiosidade. Não acredito que a «cenoura da aplicação» seja motor chave para a maioria. Admito que possa haver algum com essa cenoura à frente do nariz, mas não acredito que seja maioritário.

Muitas são as conquistas que só deram o corpo às aplicações muito mais tarde. Muitas são as conquistas científicas que estão na lista de espera para a «utilidade» (se é que têm aplicação).

Esta concepção de «ciência validada pelo que faz funcionar» revela profunda incompreensão sobre a forma dinâmica com que as teorias científicas evoluem na história humana, procurando cada vez mais estender-se, explicar mais factos da realidade, corrigir erros, interligar-se com outras teorias. Esta coisa do «faz funcionar» servir erroneamente de prova última (esperarei o post prometido sobre a temática) tem também o problema prático de promover o carácter estático e liquida a saudável curiosidade sobre as coisas inúteis (como se em algum momento pudéssemos ter certezas sobre a inutilidade).

Felizmente que há sempre aqueles que se estão marimbando para isso. Alguns serão idolatrados mais tarde por esta gente do «faz funcionar».

Anónimo disse...

Em cada momento a verdade é relativa á validação que se faz. Depois muda. Não creio em verdades imutáveis.

Unknown disse...

Embora muitos gostem de negar, o homem é um ser essencialmente religioso (de resto para mim é muito mais religioso do que racional, tendo a ilusão e a ambição de ser racional, mas isso é só para mim)

Henrique Monteiro disse...

Muito bem! Não podia estar mais de acordo

Henrique Monteiro disse...

Na verdade, há uma certa confusão entre causa e processo. Ainda que conheçamos os efeitos da lei da gravidade, não lhe conhecemos a causa. O postulado matéria atrai matéria, etc. pode, como diz DM, não corresponder à realidade e o processo ou efeitos da gravidade deverem-se a outras causas.

Fernando Caldeira disse...

Também ninguém sabe o que é a Electricidade, mas isso não impediu que (já) chegássemos aqui, e podermos fazer o que estamos a fazer neste momento.
Se não sabemos o que é a gravidade ou a electricidade sabemos no entanto o que é um fenómeno gravítico ou eléctrico ou pelo menos o suficiente para podermos “voar”, ir à Lua ou a Marte e, claro, termos os computadores e as redes de comunicações que temos hoje.

Sérgio Rodrigues disse...

Cheguei a esta discussão muito tarde mas ocorreu-me uma dúvida: qual será o lugar nesta questão da verdade da distinção que Althusser (eu sei que não se devem ler filósofos perturbados que fazem massagens nas mulheres, mas enfim eu li-o há pouco) faz entre "teoria" e "modelo" ou "prova" e "validação" que, segundo ele, separa o materialismo do idealismo? Obviamente as teorias e provas podem ser verdadeiras (pelo tal golpe de sorte que DM refere) ou estarem erradas e serem por isso falsas. Mas os modelos e a sua validação já pressupõem de certa forma que a realidade material não pode ser descrita de forma completa e por isso não chegam a enfrentar o teste "forte" de serem ou não verdadeiros, ficando-se pelo teste "fraco" de relevância ou utilidade. É nesse sentido que talvez alguns cientistas entendam o critério de validação (do modelo) pelo critério de "funcionamento". Obviamente isso não é um critério de verdade, mas, na minha opinião, não é absurdo: para eles a "verdade" não era um objectivo atingível, bastando a "validade". Não chego a ser um filósofo amador, mas estarei a "estampar-me" como um verdadeiro filósofo ;)?

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