O trânsito do "astro rei" no firmamento marca desde sempre a
actividade da vida nas sociedades humanas, em particular, e de toda a vida em
geral. Aquelas duas expressões estão presentes em muitas, se não mesmo em todas
as línguas humanas.
Nos outros seres vivos, que connosco coabitam este planeta,
estão também identificados sons anunciadores daqueles acontecimentos celestes. Quem
não se recorda ou ainda acerta o seu acordar pelo cantar do galo a romper a
madrugada num anúncio de luz? Ou o chilrear da passarada a discutir o
condomínio de um ramo ao anoitecer?
É assim desde que há memória, desde que há história. Os
sentidos assim nos iludiram durante milhares ou mesmo milhões de anos: é o Sol
que se move ao redor da Terra, que irrompe o dia a nascente, que encerra a
jornada a poente, num ciclo eterno. Mas será mesmo assim como as línguas nos
dizem? O que fez com que alguém pusesse a hipótese de poder ser diferente? A
progressiva observação do céu, o registo meticuloso e acumulado ao longo de
séculos do movimento dos outros planetas visíveis a olho nu.
O modelo geocêntrico servia para a organização da vida
humana na Terra, mas era insuficiente para compreender a organização, o
comportamento dos astros no céu. Incompleto para o conhecimento, última morada
do destino humano (como apontou Carl Sagan). Mas para romper com a ilusão sensorial sedimentada pelos
poderes seculares e intemporais, doutrinas centradas no umbigo da humanidade,
foi preciso a coragem de alguns para erguer a verdade, qual vela acesa, na
noite escura.
Nicolau Copérnico (1473 – 1543)
Por volta de 1510, o polaco Nicolau Copérnico (1473 – 1543),
então com cerca de 40 anos de idade, estabeleceu uma nova concepção do nosso
sistema solar, na qual o Sol, em vez da Terra, estava no centro: o modelo
heliocêntrico. Mas, com um medo visceral de poder ser alvo da chacota dos seus
colegas matemáticos e da irra de outros senhores, ocultou a sua teoria durante
outros 40 anos!
O que é que fez com que tivesse mudado de ideias e escrito
as suas teorias no livro “Das Revoluções dos Corpos Celestes”, que marca o
início de uma nova era para o conhecimento e para o lugar da humanidade no
Cosmos? Um jovem matemático alemão de nome Georg Joachim Rheticus (1514 – 1574).
Foi Rheticus quem convenceu Copérnico e levou o manuscrito para que este fosse
impresso em 1539 em Nuremberga, no melhor impressor de textos científicos da
Europa de então.
Georg Joachim Rheticus (1514 – 1574)
Ninguém sabe até hoje como é que Rheticus terá convencido o
seu mestre a mudar de ideias quanto à publicação da obra que tanto impacto
causou até hoje. E é neste epicentro misterioso de confronto de personalidades e
circunstâncias da história do séc. XVI, que a premiada escritora Dava Sobel (que
foi editora de ciência do New York Times) desenvolve e nos oferece mais um
livro soberbo.
Em “Um Céu mais Perfeito – Como Copérnico revolucionou o
cosmos”, publicado em Setembro de 2012 pela Temas e Debates e pelo Círculo de
Leitores, Dava Sobel, com a mesma maestria cativante presente em “Longitude” e
“A Filha de Galileu” (publicados entre nós pela Temas e Debates) narra-nos a
vida de Nicolau Copérnico. Apresenta-nos, numa primeira parte, o ser humano na
antecâmara da obra que o celebrizou como um dos gigantes da ciência moderna,
assim como descreve as consequências e o impacto da sua publicação, o que
apresenta na terceira e última parte do livro.
Na parte segunda e parte central (“E o Sol Imobilizou-se”),
Dava Sobel coloca-nos como espectadores privilegiados de um diálogo, em dois
actos, entre Copérnico e Rheticus. Baseando-se em “palavras que eles escreveram
em diversas cartas e tratados”, a autora tece, num contexto histórico e factual,
uma ficção sobre como Rheticus terá persuadido Copérnico a deixar que o seu
manuscrito visse a luz do dia.
Das Revoluções dos Corpos Celestes
Com este livro somos transportados até ao debate crucial ocorrido
em meados do séc. XVI, que redefiniu o nosso lugar no Cosmos. Entre séculos e
séculos de alvoradas e ocasos, a Terra sempre girou ao redor do Sol. A consciência
deste conhecimento não nos retirou qualquer fascínio com o esplendor do nascer
e do pôr-do-sol, os quais continuam a fertilizar a nossa emotividade e poesia. E este é um livro a ler entre qualquer um desses momentos e registos, à luz da nossa
humanidade.
António Piedade
Ficha
Bibliográfica
Título: Um Céu Mais Perfeito
Autor: Dava Sobel
Editor: Temas e Debates / Círculo de Leitores
ISBN: 9789896441814
Número de páginas: 316
Edição: 1ª – Setembro de 2012
Encadernação: Brochado
2 comentários:
Harmonia é mar em idade,
o céu perfeito, a unidade!
Oh'natureza eira de amor,
de gentil e sublime, valor.
Voa, voa;
doce criatura!
Vossa face,
flor d'altura.
Enviar um comentário