De uma revista que recebi hoje, destaco o artigo acima identificado (ver aqui) que, tendo por pano de fundo a “pós-verdade”, interroga o funcionamento e destino da democracia:
Nele se "analisa o valor da verdade nas sociedades pós-modernas e discute em que medida a verdade se torna abstrata ou de pouca importância (...) debate os desafios enfrentados pela cidadania e como os espaços públicos estão sendo ameaçados pelas novas tecnologias e mídias. Em tempos de desinformação, como a comunicação influencia o exercício da cidadania e, especificamente, o voto e a concretização de políticas públicas. A ignorância e a informação, unem-se a poderosas estruturas manipulativas radicadas em instrumentos tecnológicos."
Alerta também para que:
"A instrução cidadã e o acesso à educação de forma ampla e de qualidade são condição sine qua non para que o entendimento esclarecido seja estabelecido e as notícias falsas sejam combatidas. O exercício democrático está intimamente ligado à capacidade de os indivíduos desenvolverem um raciocínio-crítico sobre sua realidade material, diferenciando fatos objetivos de opiniões pessoais."
1 comentário:
Espírito crítico, não é pedir muito, é esperar demasiado. Nos tempos conturbados em que vivemos, assoberbados de solicitações e de megafones mais ou menos selectivos e privativos, numa imersão desinibida na barafunda das tragédias e no teatro dos festejos e das celebrações, quando alguém ainda sabe dizer em que rua mora, ou para onde quer ir, isso já é um motivo de esperança, não digo na humanidade, mas no que vier a seguir.
A verdade, além de ser algo inacessível, até aos tribunais superiores, a maior parte das vezes, é o que menos importa ao comum dos mortais. Quando muito, pode interessar aos filósofos e aos cientistas e, mesmo nestes casos, depende de que verdade se estiver a falar.
As declarações e os manifestos políticos, sejam democratas, autocratas, plutocratas, cleptocratas, aristocratas, etc., não são verdades.
O socialismo não é verdade. O capitalismo também não. O comunismo idem. República ou monarquia, nada disso é verdade, por mais verdades que digam. E também não são mentira, falsidade, ou erro, por mais que mintam, falseiem ou errem.
As religiões não são verdades, por mais verdades que digam. As realidades culturais, institucionalizadas, com mais ou menos legitimidade, aceitação, passividade, adesão, não são expressão, nem critério de verdade.
É escandaloso que tenham a pretensão de ser aquilo que não sabem ser, nem podem ser, verdade.
Uma realidade, material, física, ou social, não é verdade. Um presidente, um clérigo, um filósofo, um cientista, um jogador, um trabalhador, um rei, uma aranha, não são verdades. Um facto não é uma verdade. Um acto não é verdade.
O conceito de verdade, de certo ou errado, segundo critérios de verdadeiro/falso distingue-se do conceito de verdade, segundo critérios de eticidade, de direito, de correcto/incorrecto, ou do conceito de verdade, segundo critérios de moralidade, de bem/mal.
Em todos os casos, verdade tem a ver com condutas, comportamentos, humanos, cujo escrutínio e julgamento, por sua vez, padecem das mesmas limitações e deficiências daqueles.
Mas não há motivos para desanimar, porque os humanos têm um sentido muito desenvolvido para escolherem o que lhes interessa.
A mentira, a falsidade, normalmente, aproveitam-se disso, como formas deliberadas, sofisticadas, de manipulação.
Quando é por erro/ignorância, já a manipulação, até a das grandes estruturas ideológicas a que não escapamos, é desculpabilizável.
Enviar um comentário