quinta-feira, 16 de junho de 2022

O FUTURO DO "MAIA" SÓ PODE SER O ESQUECIMENTO

Na sequência de apontamento anterior sobre a submissão da avaliação escolar à deriva que é o Projecto MAIA (ver aqui), recuperamos parte de um texto, publicado online, de Luís Filipe Torgal, professor. 

Já demos conta de análises que fez à reforma curricular em curso (ver aqui, aqui).

O título deste texto mais recente, MAIA, a abelha distópica que vai matar a escola, anuncia o fim de uma instituição que herdámos da Antiguidade e que há-de continuar pelos tempos fora. É que, afinal, está em causa o suporte da civilização, e o ser humano comum não quer abdicar dele. E muito menos professores que, como Luís Filipe Torgal, estão atentos aos desvios que se lhe querem imprimir.

O MAIA é mais um projecto que vai ficar para a história como "de má memória", isto se não for imediatamente esquecido. O mesmo acontecerá a outras derivas que marcam a reforma da educação escolar em curso no país. Reforma que, note-se, é reflexo de uma muito mais vasta que se quer impor ao mundo. Não, o MAIA não é "made in Portugal".

À parte esta nota, subscrevemos o texto de Luís Filipe Torgal, pela seu realismo e clarividência. 

Extraímos dele duas passagens que se referem, em particular, à formação contínua de professores para pôr em prática o "complexo" processo que se conhece por MAIA, e a questões que colocam aos professores, sobretudo aos que passam pela formação.

Maria Helena Damião e Isaltina Martins

"(...) Eis o seu conteúdo: excetuando um número exíguo de luminárias, os professores mergulharam há anos em práticas pedagógicas e avaliativas equívocas e perniciosas que têm desmotivado e lesado os alunos. Todavia, agora, chegou o momento de esses docentes reconheceram os seus atos falhados, saírem da caverna, enxergarem a luz da «verdade» e propiciarem, enfim, o sucesso educativo universal. 
Para isso, têm de optar exclusivamente por pedagogias ativas (discursar aos alunos sobre ciência tornou-se um pecado venial), fundir conhecimentos com competências, avaliar de forma holística, distinguir avaliar de classificar, diferenciar práticas de avaliação formativa e sumativa (fazer testes escritos sumativos é pecado mortal), definir objetivos, critérios, rubricas e indicadores de aprendizagem a partir das aprendizagens essenciais. 
Este é o novo paradigma educativo, o alfa e o ómega da escola, onde os professores devem concentrar toda a sua energia. Aqueles que preferirem canalizar a sua energia para a preparação pedagógica e científica das suas aulas não têm lugar na «escola moderna», onde ensinar conhecimentos se tornou um detalhe de menor importância." 
"(...) é possível elaborar e operacionalizar critérios de avaliação holísticos onde os domínios comportamentais se fundem com os domínios do conhecimento? 
Como conciliar o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória com a lecionação dos conteúdos vertidos nos programas das diversas disciplinas? 
Devemos avaliar as escolas, os seus alunos e professores segundo os critérios utilizados nas empresas e aplicados aos seus «colaboradores»? 
Os professores (...) que lecionam em regime de pluridocência, têm, na maioria dos casos, mais de cinco turmas (muitas vezes, oito, nove ou mais turmas), mais de 100 alunos com quem estão apenas numa, em duas ou em três aulas semanais de 50 minutos. Como podem (...) ensinar e avaliar com objetividade e honestidade os seus alunos recorrendo, de modo sistemático, aos processos pedagógicos e avaliativos complexos hoje impostos, os quais pressupõem, por exemplo, um feedback (como agora se diz em bom português) instantâneo e contínuo?"
Como conseguem fazê-lo sem cair na armadilha de reduzirem a educação e avaliação a um processo bur(r)ocrático kafkiano? 
Está o ME disponível para debater estas questões? Não está. Neste momento, a ordem é arregimentar novos crentes, silenciar e marginalizar os descrentes e caminhar gloriosamente para o abismo. Quem chegar depois que feche a porta! E no futuro, a médio ou a longo prazo, quando se concluir que estas «políticas» pedagógicas não produziram melhores cidadãos, mas sim súbditos mais iletrados, amorfos e hedonistas, quem assumirá as responsabilidades? Obviamente, ninguém. Porque os portugueses já inscreveram no seu espírito a máxima de que em Portugal «a culpa [vive e] morre solteira»!

2 comentários:

Anónimo disse...

"O rei vai nu!"
Hans Christian Andersen

A verborreia despejada nos últimos tempos pelo ministro da educação e seus auxiliares, ao nível das administrações central e local, sobre as cabeças dos professores do ensino secundário e dos seus colegas do ensino básico e dos jardins de infância, feita de aprendizagens essenciais, medidas universais, rubricas, perfil do aluno à saída da escolaridade obrigatória, DAC (Desenvolvimento Alternativo de Currículo), TAC (Tomografia Axial Computadorizada), REX (Rumo ao Exame), Projeto MAIA - Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica, entre outras pérolas de igual quilate (ou dislate?!), é, para quem olha para a realidade sem os filtros das convenções hipócritas, uma vacuidade absoluta!
Haverá alguns crentes capazes de ver na sua própria verborreia mantos de veludo vermelho debruados a fio de ouro, com que cobrem o corpo do rei, mas a maioria dos professores apenas faz de conta que ainda não vê a nudez da realidade das nossas decadentes escolas EB1,2,3 + JI + S.
Para começar, temos de vestir o rei (escolas EB1,2,3 + JI + S) com vestimentas reais!

Anónimo disse...


Ainda há poucos anos, em Portugal, a Escola Inclusiva, Democrática e Flexível, mesmo sem ainda dispor das ferramentas analíticas proporcionadas pelo Projeto MAIA - Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica, já era tão avançada na aplicação de modernas técnicas de melhoria de aprendizagens, em contexto de sala de aula, que serviu de rampa de lançamento a um macaco que, perante a papinha feita, que lhe deram no ensino secundário, decidiu agarrar-se às aprendizagens fáceis e acabou por se licenciar e concluir o mestrado num instituto universitário.
Outros, para concluirem licenciaturas em engenharias, tiveram de frequentar, ou obtiveram, por equivalência, cadeiras de folclore!
Um Sistema de Ensino em que macacos podem obter facilmente, e com elevadas classificações, o grau académico de Mestre, é pernicioso para o desenvolvimento cultural e socioeconómico de Portugal.
Persistir nesta via errada, e aprofundar os erros com o Maia, só pode conduzir ao abismo!
PS: Este comentário é uma fantasia. Qualquer semelhança com o mundo real é pura coincidência.

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