na atmosfera ética em que ele faz actuar os seus heróis,
no seu estilo de vida. É a isto que verdadeiramente
se pode chamar educação homérica.”
Gomes, 1982, p. 25.
A educação europeia está intimamente ligada à cultura e à civilização ocidental, desenvolve-se com ela e sofre as suas vicissitudes.
tal educação, iniciando-se de forma sistemática com os gregos, tem a sua origem em Homero, nos poemas que constituem a Ilíada e a Odisseia e que, como agora se poderia dizer, são documentos curriculares do sistema de ensino heleno-arcaico, reflectindo a cultura da Idade Média Grega, num período entre o século X e o século VIII a.C., marcado pela bárbara invasão dórica, que os rejeita.
Em conjunto, estas obras permitem conhecer a comunidade “cortesano-aristocrática” grega nos seus primórdios, onde a educação era apanágio das classes nobres: a vida de ócio dos jovens, livres de trabalhos servis, permitia-lhes receber uma refinada formação que os preparava para a guerra.
A Ilíada narra o cerco de Tróia, em que são protagonistas o povo Aqueu, impedido pelos Dórios de efectuar o seu processo de emigração em direcção à Ásia Menor, episódio que se desenvolve num ambiente cavaleiresco, reflectindo uma monarquia e sociedade análogas à Idade Média. Com esta obra, o educando aprende a conhecer a sua própria história, o seu código religioso e moral, sendo o seu guia em contexto bélico.
Por seu lado, a Odisseia, em que Ulisses é o herói, relata uma epopeia que ilustra um dos mais importantes feitos do povo grego: a conquista do mar, feita “à força de audácia, de paciência e de inteligência” (Bonnard, 1980, p. 55).
No geral, a educação homérica foi conservada em muitos dos seus aspectos durante longos séculos, isto porque, segundo Gomes (1982), apresenta:
- uma técnica de preparação para o triunfo glorioso. Para tanto, deviam os jovens ser dotados de capacidade física e agilidade, aprender o manejo das armas, desportos atléticos, lançamento do disco e do arco, jogos cavalheirescos, entre outros. Mas deviam também ser formados através da oratória, da poesia popular, da dança e da música, canto incluído e uso de instrumentos, com destaque para a lira.
- uma ética, que vai além da mera moral de preceitos, traduzindo-se numa imagem de existência, de homem a realizar, de saber-viver num mundo que apresenta desafios, por vezes extremos. E isto porque a nobreza era entendia sobretudo ao nível do espírito, nível este em que se destaca o temor aos deuses e o respeito pelos outros.
É esta técnica e esta ética que, visando obter homens fortes e vigorosos em termos de compleição física e providos de sagacidade, prudência e astúcia, bem como de delicadeza e cortesia, consubstanciadas em boas maneiras, marcarão a educação da época clássica e das épocas que lhe sucederão, até ao presente.
Estamos perante uma pedagogia intimamente ligada à realização dum ideal de perfeição humana – a “vigorosa saúde do corpo e nobreza de alma” – a que só o nobre pode ascender (Galino, 1981, p. 117), o qual, a exemplo dos deuses e heróis, paradigmas de acção a imitar, deve aspirar a sobressair, a ser superior, a deslumbrar, a ver universalmente a sua honra reconhecida, sendo assim digno de estima.
Como, na época, não se vislumbravam recompensas depois da morte, seria na vida terrena que o mais alto destino do herói se concretizava, nos feitos revestidos de glória, daí o desejo imenso de viver, bem patente em Aquiles “herói que encarna por excelência o ideal de perfeição a que aspira o cavaleiro”, quando afirma que não há nada que valha tanto como a vida, nem sequer as riquezas (Galino, 1981, p. 118). Mas, ao mesmo tempo que a vida é amada e enaltecida, o herói também está disposto a sacrificá-la em nome da honra, que o tornará imortal como os deuses. A morte, nestas circunstâncias, aparece como a possibilidade do mais elevado feito de heroísmo, convertendo-se a areté aristocrática, “palavra intraduzível mas que é costume traduzir por excelência” (Gomes, 1982, p. 27), no fim que o homem deve alcançar no seu processo de aperfeiçoamento.
Temos, pois, na obra de Homero, um modelo de educação para a heroicidade, para a vivência de super homens, que triunfam pelo facto de defenderem valores e encarnarem a mais autêntica areté, ainda que isso origine o sacrifício da própria vida, sendo a “morte desejada e valorizada quando nela se consuma o destino do herói” (Galino, 1981, p. 119).
Maria Dulce da Silva e Maria Helena Damião
Referências bibliográficas:
Bonnard, A.(1980). A civilização grega. Lisboa: Edições 70.
Galino, M.A. (1981). Historia de la educació - Edades Antigua y Media. Madrid: Editorial Gredos.
Giles, T.R. (1983) Filosofia da educação. São Paulo: Editora Pedagógica e Universitária.Gomes, 1982, p. 15).
Gomes, J. F. (1982). História da educação. Coimbra: Serviços Dactilográficos e Impressos de Hilário Teixeira.
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