Perdoem-me os leitores que são professores (eu também sou) mas, ainda a propósito do texto Aquele que não consegue, tenho de escrevo o que se segue.
A verdade, é que, nós, os professores, nós as centenas, os milhares de professores do Ocidente
- como membros da sociedade, independentemente dos (estranhos) rumos que ela toma,
- como elementos duma escola, seja ela de que nível e especificidade for,
como profissionais, mais ou menos formados para exercer a docência,
- como adultos, que, nas palavras de Arendt, "chegaram há mais tempo ao mundo" e, logo têm o dever de guiar os mais novos, que não se “governam a si próprios” nem uns aos outros,
não estamos a fazer o que devíamos, o que a nossa função dita: ensinar as crianças e os jovens.
É certo que essa função se confronta com constrangimentos de toda a natureza: são as concepções de educação vigentes, são as solicitações e práticas sociais, são as peculiaridades das famílias, e mais isto e mais aquilo, mas a verdade, é que, se pusermos a mão na consciência, percebemos que não os estamos a ensinar de forma eficaz para que adquiram conhecimentos e princípios com valor cognitivo e moral.
Conhecimentos e princípios que, como civilização inventámos, criámos, descobrimos... e que nos têm tornado pessoas, no sentido em que hoje entendemos a palavra pessoa.
E, mais grave, indidualmente e/ou cooperativamente, não nos temos comprometido com isso, não temos reivindicado isso com a voz que seria necessário que usássemos.
Num trabalho que reproduzi no De Rerum Natura sobre o assunto que desencadeou este texto, o "caos nas salas de aulas", de modo muito claro, referindo-se à realidade inglesa, uma professora diz é que preciso perceber o que é óbvio: que as crianças são apenas crianças, os adolescentes são apenas adolescentes, que não nasceram educados, e, nessa medida, é preciso educá-los. Nas suas palavras: "Tornou-se claro para mim que a explicação para o mau comportamento dos alunos podia estar relacionada com o facto de não serem desafiados intelectualmente. Será que alguém já tentou perceber se os alunos estão a ser devidamente “estimulados?”.
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
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9 comentários:
Prof.ª Helena Damião:
Este seu Post, na sequência do anterior, põe uma questão do domínio do «dever ser», aí estamos todos de acordo, é preciso ensinar, quanto mais e melhor, melhor será para todos nós.
Mas ensinar não é independente nem do lastro histórico que na matéria temos como sociedade nem do contexto (global e particular) em que o ensino se realiza.
Quanto ao seu «dever ser» não valerá a pena gastar tempo com ele, tão óbvio e inquestionável é, quanto aos dois aspectos que acrescento talvez valesse a pena debruçarmo-nos um pouco sobre eles.
Cara leitora Aurélia Santos
Na verdade, ensinar é um dever "óbvio e inquestionável", mas estaremos a cumpri-lo da melhor maneira? Estaremos a reivindicá-lo da melhor maneira? Estaremos a concentrarmo-nos no que é fundamental para educar formalmente as novas gerações? Ou estaremos presos a essa ideia de que pouco podemos fazer para alterar o devir dos tempos, as opções da sociedade, dos contextos particulares em que nos incluímos?
Estas são questões que, no meu entender, como professores nos deriam fazer parar para pensar, não individualmente, nem em pequenos grupos de confidência de desesperos vários, mas como profissionais que têm nas suas mãos "o dever de ensinar como condição de liberdade" como refere o filósofo da educação João Boavida
Helena Damião
Ensinar é amar.
Um dos problemas é o do aluno que pretende constantemente chamar a atenção sobre si, ou amavelmente, ou agressivamente.
A agressividade dos segundos resulta muitas vezes do desamor que sente em casa, da carência de atenções, ou de problemas que se exteriorizam com indisciplina, como um chamamento de atenção sobre necessidades que não sabe exteriorizar.
É bom ter uma classe disciplinada, mas se alterações comportamentais há, é bom procurar saber se não haverá um grande distanciamento doméstico, e encontrar soluções: ou dando um pouco mais de atenção a esse aluno indisciplinado em vez de aumentar o distanciamento com castigos.
Por isso considero que ensinar é amar.
João dos Santos dizia que "dar amor à crianças, é dar-lhes inteligência".
É bom falar sobre o ensino globalmente, mas penso, e por ventura mal, que descer aos problemas das crianças, quando se fala em indisciplina, seria um bom caminho para os professores juntarem, à transmissão do conhecimento, o olhar de quem está ali por prazer, amor, dedicação, e não como um oficial à frente de um pelotão de soldados.
Cara Helena Damião,
Concordo inteiramente com o seu texto. É para mim evidente, há muitos anos, que não estamos a exigir quase nada aos alunos. Um dia destes por muito que tentem e se esforcem os alunos não conseguirão chumbar.
Se quase nada se exige que comportamento poderíamos esperar de adolescentes? Vou, até, mais longe, imagine uma empresa com 300 empregados adultos aos quais nada se exige. Agora imagine o comportamento destes funcionários depois de 5 ou 6 anos...
Excelente texto.
É claro que os alunos não estão a ser devidamente estimulados, ao invés, estão a ser "estupidificadus".
Hr
O comentário de João Boaventura é de um simplicidade e autenticidade que toca na alma.
HR
Caro HR
Falo de experiência pessoal.
Quando estava ao activo estranhava a insubordinação ou indisciplina de alguns alunos, e comecei a entender que estava perante o meu próprio retrato porque fui tratado como um intruso.
Um dia, a um aluno sempre irrequieto, à saída da aula disse-lhe:
"Vê lá se ganhas juízo"
Respondeu-me: "Sim, agora vou à farmácia comprar 5 tostões de juízo".
A minha aproximação foi errada e optei por dar-lhe mais atenção, e não considerá-lo um número entre muitos números.
E modificou-se totalmente, como muitos outros.
Mas é possível que muitos professores não tenham passado por aquilo que passei, e por isso não entendam a minha linguagem.
Mas os meus alunos irrequietos e insubordinados entenderam.
Se a palavra "amor" é demasiado forte e choca, pode substituí-la por "atenção", "dedicação", "entrega", "cuidado". ou, como refere a Professora Helena Damião, "sermos pessoas", isto é, estarmos perante "pessoas" que muitas vezes nos olham a ver se descortinam no nosso olhar o olhar de pai, ou de mãe, que não vê em casa... o olhar próximo e não o olhar distanciado.
Um abraço
Talvez o problema esteja em que os professores ensinam muito mas os alunos aprendem pouco, como na anedota do linguista famoso que declarou ter ensinado o cão a falar com recurso a novas técnicas e teorias da linguagem; quando o cão foi chamado a exame, chumbou! O comentário foi lapidar: bem, eu ensinar, ensinei, ele é que não aprendeu!
Como professora que sou, as palavras do Professor João Boavida fazem-me todo o sentido. Independentemente do nome que dermos às coisas, o aluno tem de ser o centro, o fulcro da atenção e da intenção pedagógica, embora isto hoje se confunda muito com displicência e falta de disciplina de trabalho, a par com a aceitação do discurso da utilidade imediata da aprendizagem e da validade de qualquer opinião ou gosto não informado pelo "honesto estudo". Mas este será outro comentário.
Por mim, trabalho arduamente por que eles aprendam, mesmo que eu ensine muito pouco... (Não me despeçam ainda ...)
Olímpia Teixeira Silvestre
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