"E seria um desses projectores de Robert Paul, que chamaremos Animatógrafo Rousby, que iria revelar a fotografia animada projectada ao público português - a começar pelo Real Coliseu de Lisboa, que ocupava, na Rua da Palma, o lugar da actual Garagem Liz.
O empresário dessa casa de espectáculos, António dos Santos Júnior, era um espírito activo e empreendedor, que não esperava que a Fortuna lhe viesse bater à porta. Ia com frequência ao estrangeiro, ver o que havia no mercado do espectáculo, e contratava o melhor para o seu Coliseu. Depois, fronteiras adentro, negociava os "seus" artistas com outras casas do país, nomeadamente o Teatro-Circo do Príncipe Real, do Porto.
Em Maio de 1986, exibia-se no Circo Parish de Madrid (uma das melhores casas de onde os "números" passavam frequentemente para Lisboa) um aparelho de grande novidade, a fotografia com vida, apresentado por Edwin Rousby.
Santos Júnior contratou-o, e telegrafou a notícia, como era seu costume, para que a publicidade tivesse início desde logo.
O "número" de Rousby era anunciado como "Animatógrapho e Cinematógrapho" (abrangendo assim os dois rivais da especialidade) - e logo os jornalistas lhe adicionaram os nomes de Edison e de Lumière, e terminologia correlativa, para ornamentar os seus parágrafos.
Quem fosse Edwin Rousby, não conseguimos ainda descobrir. Dizia-se "electricista de Budapesth", alinhando assim ao lado de Edison, electricista americano. Era um profissional de espectáculos, e casado com uma artista do mesmo ramo, Maud Rousby. Estava por certo em Inglaterra nos princípios de 1896, já que pôde adquirir um Theatrographo de Robert Paul; e para Inglaterra se dirigiu, quando terminou o seu contrato (e o de sua esposa) no Real Coliseu. Mas as entidades cinematográficas inglesas que contactámos desconhecem-no inteiramente.
(...) A apresentação à Imprensa, da praxe, redundou num fiasco. O Real Coliseu não tinha luz eléctrica; um gerador alugado às Companhias Reunidas de Gás e Electricidade revelou-se ineficaz; e os 200 convidados tiveram de aceitar as desculpas do Sr. Rousby.
A temperatura desse princípio de noite andava pelos 20 graus, e o passeio até ao fim da Rua da Palma não lhes terá sido desagradável, mas o desapontamento deve ter embotado a habitual benevolência das suas linhas noticiosas - o que lhes aumenta a credibilidade.
(...) No dia seguinte - 18 de Junho de 1896 - tudo correu satisfatoriamente. Apresentação à Imprensa durante a tarde e espectáculo para o público na soirée.
O Real Coliseu tinha em cena uma opereta, O Comendador Ventoinha, em 3 actos; e a novidade foi apresentada num dos intervalos, sem alteração do habitual preço de 100 réis pela Geral.
À boca de cena foi colocado o écran de tela branca, com 7 metros quadrados (mais ou menos 3 m por 2,5), numa moldura de pelúcia vermelha. A projecção era feita nas costas do écran, que era humedecido para lhe aumentar a transparência.
Este procedimento tinha as suas vantagens: não se via um feixe luminoso por cima dos espectadores, e não se ouvia tanto o ruído da máquina, que era considerável.
Na completa escuridão da sala, não faltaram as exclamações impertinentes e obscenas, a ponto de um jornal do dia seguinte pedir a intervenção da Autoridade e a expulsão dos espirituosos.
Rousby dava um programa de 8 filmes, que duravam entre 20 segundos e 1 minuto, cada um. Afora programa, exibiu mais 3. Pelos títulos e por algumas descrições do conteúdo reconhecem-se filmes de Edison, de Lumière e de Paul".
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
A ESTREIA DO CINEMA ENTRE NÓS
A. J. Ferreira, num muito interessante livrinho acabado de publicar (Novembro de 2009) pelos Bonecos Rebeldes, intitulado "O Cinema chegou a Portugal" (2ª edição revista; a 1ª saiu policopiada em 1986) conta assim a chegada do cinema a Portugal (na foto, o pioneiro inglês do cinema Robert W. Paul, 1869-1943):
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