terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Investigação Científica



As PME (Pequenas e Médias Empresas), que representam 90% do nosso tecido industrial e sensivelmente a mesma percentagem do emprego, não têm capacidade financeira, nem de recursos humanos, para fazer investimento de longo prazo em I&D e muito menos de suportar I&D de risco. Na verdade, o I&D de risco é muito importante porque permite avanços significativos, em caso de sucesso na investigação, e produtos que podem ser diferenciadores no mercado. O problema é que empresas pequenas, sem cultura de investimento em I&D, não o podem fazer.

É aqui que entra o Estado e a política de I&D nacional. Um governo tem de ter uma acção concertada no apoio às empresas (o que significa apoio às PME porque, de facto, elas são a economia) e no apoio ao seu desenvolvimento. Eis algumas coisas aparentemente simples, mas que se tornam complicadas em Portugal. O Estado tem de:

1. Pagar a tempo e horas.

2. Incentivar a exportação, reduzindo impostos de forma significativa a empresas exportadoras. Isto tem de ser um imperativo nacional.

3. Incentivar a contratação efectiva de pessoas com formação superior, reduzindo os impostos às empresas que o fazem. Isto é apostar no futuro.

E, em termos de I&D, tem de:

4. Fomentar o aparecimento de novas empresas que resultem da I&D efectuado em Universidades e Centros de Investigação: incubação de ideias e empresas, apoio no desenvolvimento de projectos, aceleração de empresas e apoio a parques de ciência e tecnologia.

5. Incentivar a relação entre empresas e as instituições de I&D portuguesas, apoiando de forma efectiva projectos de I&D em consórcio que tenham em mente resultados de médio e longo prazo: apoiar significa investir, colocar dinheiro em projectos em consórcio cujo valor científico tenha avaliação internacional. Só as Universidades e Centros de I&D podem apoiar o I&D de risco, tendo por base fórmulas de financiamento que incluem uma parte pública nacional (via FCT), uma parte pública internacional (via União Europeia) e uma parte privada (das empresas).

6. Definir com clareza as áreas prioritárias para o país, canalizando para essas áreas o investimento público em I&D. Não é possível que um país tão pequeno como Portugal disperse o pouco dinheiro que tem por todas as áreas científicas. Não pode, não faz sentido. Tem de ter a coragem e a clarividência de definir prioridades, concentrando uma percentagem significativa do seu investimento nessas áreas. Ou seja, o investimento tem de ser estratificado por prioridades. É uma questão de gestão de recursos. Aliás, a União Europeia (UE) faz isso mesmo com os seus programas-quadro. Define uma agenda de I&D e abre concursos somente nas áreas que definiu.

7. Apoiar efectivamente a presença dos grupos de I&D portugueses nos programas-quadro da UE, complementando assim o financiamento nacional e equilibrando o investimento nas áreas não prioritárias que não obtiveram financiamento nacional. Verifica-se um menor sucesso nacional em projectos europeus. Isso significa que Portugal tem de ter uma presença efectiva nos centros de decisão, nas várias unidades de I&D da UE, com capacidade de influência e de apoio na elaboração e acompanhamento de candidaturas. A noção que tenho, depois de vários projectos europeus que tive aprovados, é que o apoio nacional é muito incipiente.

Em vez de gastar rios de dinheiro em obras públicas (estilo TGV), que beneficiam essencialmente empresas de fora do país (fornecedoras de tecnologia), dão emprego a pessoas pouco qualificadas e essencialmente constituídas por emigrantes (nada contra, mas não é, penso eu, prioridade do país dar emprego a emigrantes), e são investimentos sem retorno, faria todo o sentido investir na "alta velocidade" que é criar condições para tirar partido dos Portugueses: das suas instituições de I&D (muito boas e preparadas), dos projectos em consórcio (como forma de fazer avançar as empresas com I&D de risco) e do investimento nas pessoas com formação superior (a melhor forma de transferência de conhecimento entre as Universidades e a sociedade). Isso significa perceber que temos de contar connosco próprios e com aquilo que formos capazes de aprender e construir.

Mas isso coloca o foco na necessidade de planear e definir objectivos nacionais, uma coisa complicada num país que não gosta de planear e muito menos de avaliar.

My two cents...

8 comentários:

JKL disse...

Será?
Quero dizer... Assumindo que os centros de I&D...
Assumindo que não fossem eles próprios dominados por teias de interesses pouco claros, sim. Por isso mesmo eu ficaria um passo atrás. Se o Estado pagasse a tempo e horas, se o Estado providenciasse uma justiça em tempo útil, se o Estado providenciasse uma educação de primeira no ensino público... Se o Estado fizesse BEM o que deveria fazer, talvez as empresas em Portugal não precisassem de muitos anos para alcançarem a massa crítica que lhes permitisse a elas próprias investirem em I&D.

Anónimo disse...

«Definir com clareza as áreas prioritárias para o país, canalizando para essas áreas o investimento público em I&D.»

Como se sabe, a priori, com razoável segurança, quais são essas áreas prioritárias, e que estrutura estatal deveria aconselhar os decisores políticos?

Américo Tavares

Anónimo disse...

Para alcançar a massa crítica, só contratando pessoas e particularmente doutorados. É o que fazem os países mais desenvolvidos e que pretendem assim manter-se.

Subscrevo o comentário relativo às áreas prioritárias, acrescentando que uma área pode ser prioritária agora, mas daqui a 5 anos pode estar descontinuada. Um exemplo, em 99 ninguém quase ligava à investigação em líquidos iónicos e passados 3/4 anos, houve a "explosão" científica e ainda se mantêm.

A Silva

J. Norberto Pires disse...

A definição de áreas estratégicas (ou prioritárias) seria feita tendo por base a evolução científica e técnica internacional, a respectiva massa crítica em Portugal, o potencial interesse em a desenvolver e as condições de Portugal para estar no plano da frente nessas áreas. Isso implica definir uma agenda de I&D, que de facto constitui um guia (revisto regularmente), que permitiria aos vários centros de I&D orientarem os seus planos de desenvolvimento pois sabiam com clareza as fontes de financiamento que teriam à sua disposição: nacionais, internacionais (onde existem estas agendas de I&D, ver os programas quadro da União Eurpeia, por exemplo, o 7 programa quadro) e privados.
Seria ainda necessário discutir com a indústria nacional, no sentido de ajustar às suas necessidades tendo sempre em conta que só seriam financiados projectos em cooperação com real valor científico e técnico (avaliação internacional).
A definição da agenda teria de ser feita tendo por base um debate alargado na comunidade científica nacional, e definido por uma comissão necessáriamente composta por elementos nacionais e internacionais. A agenda estaria em discussão pública, seria apresentada, e seria com base nela que se abririam concursos de projectos de I&D.

Anónimo disse...

Dr. Pires, queira desculpar mas o q escreveu soa a ruído de fundo, retórica mesmo, no sentido em q tantas vezes foi repetido pela propaganda. Se for essa a sua intenção, de repetir o q já foi tantas vezes dito, bom esforço. Senão, n o percebo.
Para além das regras de bom senso q enumera e q deveriam levar à boa prática - mas n levam, saiba-se pq, acredita por exemplo q seja possível "Definir com clareza as áreas prioritárias para o país...", etc? O Prof. José Hermano de Saraiva, disse num programa sobre história de Portugal, n sei se disse mais alguma vez, q o "nosso futuro" estava no sol do algarve e na paisagem alentejana...!

E depois exclama "Não é possivel que um país tão pequeno como Portugal disperse o pouco dinheiro q tem por todas as áreas científicas"....não será por Portugal ser pequeno q tal acontece? Qual a razão de licenciar em massa alunos em antropologia ou coisas do género? Estatística? Mão de obra barata a baixo custo para competir com os chineses? Para já n falar na coisa das obras públicas.

MMT disse...

Também sou investigador e tenho que discordar. A "alta velocidade" ferroviária não é particularmente dependente de componente estrangeira. 70% é terrapleno, traçado, pontes e túneis. E nos outros 30% está a tecnologia. Fala-se demasiado sem saber, mas em Portugal estão empresas de excelência e multinacionais que nos dão emprego e "know-how" especializadas em electrotecnia de potencia, transformadores, bobinados para motores (que obviamente me abstenho de dizer o nome)... e que se não as soubermos agarrar, têm o mesmo destino da Bombardier da Amadora: vão-se embora.

Quanto ao resto, num país dominado por auto-estradas e automóveis a vinda de mais vias férreas, de "alta velocidade" e de outras só pode ser bem-vinda. Metade do desequilíbrio no comércio externo (e consequente dívida externa) é do petróleo importado, cuja maior parte vai para o sector dos transportes. Se quiserem resolver o problema orçamental interno, taxem o sector bancário em IRC (25% em vez dos efectivos 12 ou 13), como o resto das empresas, e verão como já há dinheiro para tudo.

Manuel Tão

manueltao@gmail.com

maria disse...

área prioritária é o sector primário . não tarda não há divisas para importar comida. e sim , as escolas de agricultura/pesca tinham obrigação de apresentar projectos/soluções de modo a conseguir a autonomia alimentar e a rentabilização do sector.
o homem não vive só de pão , mas sem ele também não vive muitos dias.

José Roque disse...

Caro Prof. Norberto, desculpe voltar à carga, mas n encontro qq relação entre o mundo do seu artigo e a realidade, por mais q a torça. Aponta o que deveria ser feito se houvesse dinheiro mas não diz como o fazer, sem dinheiro.
1. como é q obriga o estado a pagar a tempo e horas? de livre vontade n o faz. com legislação? e q legislação?feita por quem?
2 a 7. incentivar, incentivar, fomentar, apoiar de forma efectiva...e por aí fora....como? subsídios dados de acordo com critérios claros q nunca se conseguiram definir. reduzir impostos, reduzir importos e reduzir impostos? aumentando o consumo e as importações e diminuindo a capacidade do estado pagar a dívida?
E como é que planeia?
Parece-me q a coisa é muito mais simples, mas ninguem quer acreditar.

NO AUGE DA CRISE

Por A. Galopim de Carvalho Julgo ser evidente que Portugal atravessa uma deplorável crise, não do foro económico, financeiro ou social, mas...