Cada vez mais o nome do professor português do século XIX Adriano Paiva está a aparecer nas obras de história da ciência e tecnologia associado à invenção do conceito de televisão (ver, por exemplo, aqui, um sítio francês, ou aqui, um sítio australiano). Eis um resumo do seu trabalho escrito por António José Leonardo:
A invenção do telefone por Alexander Graham Bell, em 1876, veio a alargar as potencialidades da telegrafia eléctrica, de tal forma que o francês Alfred Bréguet afirmou que “a descoberta da telephonia veio preencher a única lacuna que ainda existia na correspondência rápida do telegrapho”. Em Novembro de 1877 iniciaram-se as primeiras experiências em Portugal com esta nova tecnologia. Esta descoberta conduziu à proposta de Adriano Paiva de associar à telegrafia a transmissão de imagens: telescopia. Adriano de Paiva de Faria Leite Brandão (1847-1907), após ter obtido bacharelato em Matemática e doutoramento em Filosofia na Universidade de Coimbra, foi nomeado, em 1872, professor da Academia Politécnica do Porto, onde assumiu a docência da cadeira de Química tendo transitado, posteriormente, para a cadeira de Física. Como sócio do Instituto de Coimbra, foi através da revista O Instituto que veio a propor um método que poderia revolucionar as comunicações telegráficas. No seu artigo de 1878, discorreu sobre as vantagens do telefone de Bell no âmbito da aplicação da electricidade para transmitir mensagens sonoras e concluiu que a evolução lógica seria aplicar uma tecnologia similar, capaz de converter imagens em impulsos eléctricos que seriam transmitidos pelos fios telegráficos. Não se limitou ao campo das suposições teóricas, sugerindo uma forma prática de conceber um aparelho transdutor das “vibrações luminosas, correspondentes às particularidades da forma e das cores” do objecto em correntes eléctricas. Foi pioneiro mundial na proposta da utilização do “selénio como placa sensível da câmara escura do telectroscopio” , baseado nas propriedades exibidas por esta substância. Experiências realizadas por Werner Siemens tinham revelado que o selénio, quando intercalado num circuito eléctrico, provocava o desvio da agulha de um galvanómetro sempre que iluminado por luz visível e que a condutividade eléctrica exibida dependia do comprimento de onda da radiação incidente. Assim, pela ligação de fios metálicos a uma placa de selénio e sendo esta exposta a um objecto iluminado, seria possível traduzir essa imagem em tantos impulsos eléctricos quantos os fios usados, podendo a mesma ser reproduzida num aparelho receptor deste sinal.
Tendo-se apercebido da originalidade da sua ideia, enviou uma carta ao editor da revista francesa La Nature (antecessora de La Recherche), que foi publicada nesse periódico em 23 de Agosto de 1879 (também publicada em O Instituto), onde reiterava a sua proposta de utilização de uma placa de selénio, referindo ter iniciado algumas experiências as quais, por razões que preferiu não indicar, não pôde continuar. Na mesma missiva, pedia a Gaston Tissandier (1843-1899) que lhe indicasse literatura que o pudesse guiar na sua investigação do tema. Tissandier respondeu-lhe por carta de 29 de Agosto de 1879, elogiando a ideia de Adriano Paiva, mas afirmando que não conhecia bibliografia sobre o assunto (o que parece estranho, pois a Nature, o conceituado jornal britânico que, fundado em 1869, ainda hoje se mantém, tinha publicado uma nota em 23 de Janeiro de 1879 anunciando o projecto francês do telectroscópio, um aparelho baseado no selénio para captar imagens) e que “l’innovateur se guide lui-même” ("o inovador guia-se a si próprio"). Infelizmente, apesar dos esforços de Adriano Paiva, este não viu na altura reconhecida a sua prioridade sobre esta invenção pelo simples facto de a revista O Instituto não ter o impacto internacional que a Nature ou mesmo La Nature tinham.
António José Leonardo
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3 comentários:
Fascinante. Nunca tinha ouvido referir isto.
Há uma série de pessoas que fizeram coisas notáveis no campo da Ciência e que são muito pouco conhecidas e divulgadas cá. Em universidades estrangeiras lembro-me do orgulho com que exibem as fotos ou quadros dos seus cientistas, ou contribuidores para a ciência, mais ilustres.
Cá isso não se pratica, deixando a ideia de que não seremos capazes de ter ideias próprias de valor, e isso impregna as pessoas e contribui para reforçar a ideia de que "santos da casa não fazem milagres". Talvez fosse importante começar a inventariar esse imaginativos antepassados... meia dúzia que fosse...
Pior defeito do que ter que combater a autêntica máfia saxónica que pretende, que apenas cientistas das suas origens são capazes de efectuarem descobertas, existe ainda o defeito "TUGA" de pela inveja achar que os Portugueses são incapazes de terem uma ideia de geito.
Somos autenticamente incapazes de reconhecer e manifestar por aqueles que neste cantinho da Europa foram efectuando algo.
É que, nem o retrato na parede dos locais aonde esse tipo de manifestações deviam estar sempre presentes, somos capazes de o colocar.
E quando se fala em citar Aqueles que Camões dizia que "Da Lei da Morte se Vão Libertando", então é melhor nem falar.
Como sempre, adoramos o Pobre e Mal agradecido.
Quem quiser:
http://paginas.fe.up.pt/histel/
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