sexta-feira, 18 de julho de 2008

EU GOOGLO, TU GOOGLAS, ELE GOOGLA


Minha crónica no "Público" de hoje (na foto Larry Page e Sergey Brin, os fundadores da Google):

Sim, eu sei que o verbo não está no dicionário de português. Mas vai estar. Será dicionarizado em português, tal como já foi em inglês: to google entrou em 2006 no Oxford English Dictionary e no Merriam-Webster Collegiate Dictionary. Só não sei é se, com o acordo ortográfico, não vai ser grafado “guglar” e conjugado “eu guglo, tu guglas, ele gugla”. Espero que não, pois pareceria a voz de um perú.

A origem do termo é curiosa. Vem da palavra googol, que foi criada em 1938 por uma criança de oito anos quando o seu tio, matemático, lhe pediu para dar um nome ao número um seguido de cem zeros. A variante Google surgiu em 1998 quando um dos primeiros investidores num projecto de Larry Page e Sergey Brin, estudantes da Universidade de Stanford, na Califórnia, EUA, passou um cheque de cem mil dólares, por lapso, a Google Inc. Era mais fácil criar uma empresa com esse nome do que pedir a emissão de novo cheque (no burocrático Portugal, o cheque teria sido devolvido). A palavra googol era apropriada pois a nova empresa pretendia organizar a informação mundial tornando-a universalmente acessível e útil e o número de bits na Internet cresce desalmadamente, aproximando-se do googol...

A Google, que faz este ano dez anos, ao longo dos quais conheceu um crescimento vertiginoso, nasceu de uma ideia inovadora dos dois jovens: inventaram um algoritmo para classificar páginas da Net de acordo com os links para elas. Hoje quase não se pode viver sem a Google: não só se googla (o verbo surgiu pela primeira vez num “email” de Page na época do cheque: Have fun and keep googling) como também se enviam “emails” com o Gmail, se lêem “blogs” no Blogger, se vêem vídeos no You Tube, etc. O que era um mero exercício académico transformou-se de repente num negócio global. Os cem mil dólares foram um óptimo investimento.

Qual o papel das bibliotecas no mundo da informação dominado pela Internet e pelo Google? As bibliotecas de hoje e ainda mais as do futuro querem estar em todo o lado, à disposição de qualquer pessoa, a qualquer hora. Assim, não admira que algumas das melhores bibliotecas mundiais tenham assinado em 2006 um acordo com a Google para digitalizarem parte dos seus fundos históricos. É serviço público. Trata-se de colocar à disposição da humanidade o que é património da humanidade e espero que as instituições públicas não deixem essa tarefa apenas em mãos alheias.

Sobre o futuro das bibliotecas, Robert Darnton, director da Biblioteca da Universidade de Harvard, publicou em 12 de Junho de 2008 na The New York Review of Books um artigo com o qual me identifico:

Aumentem a biblioteca, encham-na de materiais impressos. Reforcem as salas de leitura. Mas não pensem que se trata de um armazém ou de um museu. Ao mesmo tempo que fornecem livros, a maioria das bibliotecas universitárias funcionam como centrais nervosas que emitem impulsos electrónicos. Adquirem bases de dados, mantêm repositórios digitais, dão acesso a jornais electrónicos e afinam sistemas de informação que chegam aos laboratórios e gabinetes. Muitas delas estão a partilhar a sua riqueza intelectual com o resto do mundo ao permitir que a Google digitalize as suas colecções impressas. Portanto, longa vida à Google, mas não contem que viva tanto que substitua o venerável edifício com as colunas coríntias. Como cidadela da aprendizagem e como plataforma de aventura na Internet, a biblioteca universitária merece ainda estar no centro do campus, preservando o passado e acumulando energia para o futuro.

Devo aqui fazer uma declaração de interesses: participei num acordo recente que a Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra celebrou com a Google para tornar acessíveis através do “Google Pesquisa de Livros” muitas edições próprias daquela biblioteca, como por exemplo edições da Crónica de D. Manuel de Damião de Góis, as Rimas de Luís de Camões e as Obras Médicas de Pedro Hispano (único papa português, sob o nome de João XXI). Pode ser pequeno, mas é mais um passo para aumentar a presença da língua e da cultura portuguesa na Net.

10 comentários:

Rui leprechaun disse...

Não se vê necessidade alguma desse termo, nem sequer em inglês quanto mais em português!

Net search e pesquisar na net chegam e sobram, e sempre soam algo melhor...do que o peru roncador! :)


PS: Ou então, porque não to yahoo? Sempre tem um sonoridade muitíssimo superior!!!

Lachlan Mackenzie disse...

E ela não googla?

Anónimo disse...

Isto é tão rdículo como dizer eu vou fordar at ao Porto porque a ford massificou a utilização do automovel.

Como o termo é completamente estúpido e a sua utilização vai ser decidida pelas massas é quase certo que vai ser adoptado.

Gux disse...

Creio que o sentido, seja como o artigo elucida distinguir a pesquisa generica, da pesquisa no google. São universos paralelos... não há nenhum motor que se equipare a este. Além disso é um termo que anda na boca do povo todos os dias. Pelo menos no meu pequeno universo ele circula. Para o senhor dos carros, nao se diz fordar porque as pessoas nao usam essa expressão. Nenhum carro se distinguiu o suficiente. Também há imensos molhos de tomate... mas ketchup é ketchup. ;)

Thank God for Google!

Anónimo disse...

«Nenhum carro se distinguiu o suficiente.»

Só pode estar a gozar. Já ouviu falar do Drod Modelo T?

Sinédoques a este nível são relativamente recentes.

Anónimo disse...

Queria dizer Ford Modelo T.

Ondirect disse...

E o acordo ortográfico não é uma estupidez... sinceramente... e vivam as mentes (pouco) brilhantes deste universo cibernético!

Gostei do termo e tem lógica.. algo criado naturalmente em vez de forçosamente como o (des)acordo...

Rui leprechaun disse...

não há nenhum motor que se equipare a este.


Essa agora! Mas que tem de especial esse motor de busca em relação ao Yahoo! ou ao Ask.com ou ao MSN, por exemplo?! E isto já para nem falar nos motores mais específicos, mas só o marketing e o vulgar "maria vai com as outras" podem explicar tal preferência saloia!

Até hoje, ainda não encontrei nada melhor que o velhinho Altavista, o qua aliás, mesmo agora, remete ainda mais resultados numa vulgar pesquisa que o incensado Google.

Logo, quando apenas se fica pela rama, por certo qualquer vulgaridade serve. Mas quem é exigente, tem de cavar mais fundo!

Vitor Guerreiro disse...

Eis o que adoro nos anglo-saxónicos: nesse espaço linguístico não é preciso estar a discutir se "googlar" é um termo legítimo ou não. Só numa cultura como a nossa, cheia de pancadas místicas da "consagração" é que pode parecer razoável perder horas a discutir se é preciso ou não censurar quem escreve certas palavras.

Se um neologismos ou uma palavra invulgar surgem é porque há alguém que a usa. Se faz sentido usá-la, então os outros utentes vão usá-la por mais que se brade aos céus. Mas nós temos esta mania interessante de pensar em "consagrações": achamos que se uma palavra é debitada num computador, passa para uma máquina de offset e é impressa 100 000 vezes, ficou consagrada mesmo que as razões do seu autor em escrevê-la fossem as mais ininteligentes do mundo. Por outro lado, uma palavra inteligente, que não esteja sancionada pelos dicionários ou pelas mentecaptas autoridades linguísticas (mas quem são estes afinal?) parte-se do princípio dogmático e sumamente estúpido de que "soa mal" só porque sim.

Contudo, a razão de "soar mal" é a mesma que nos faz encolher os ombros ao ler a palavra "infísico" que corresponde exactamente ao inglês "nonphysical". No entanto, o inglês soa-nos "bem" e o português soa-nos "mal". Por que temos a sensação de que os ingleses usam o prefixo natural de negação como quem usa o operador lógico "não-" (com hífen).

Ou seja: mande-se para o lixo todos os dicionários de português-português e traduza-se os melhores dicionários de inglês-inglês. Não para encher a língua com anglicismos mas para aprender com eles a inteligência de duas coisas inseparáveis: a liberdade e a coerência, que estão na relação inversa do atavismo e da estupidez lusitana.

Dito isto, é-me completamente indiferente que se use a palavra "googlar". Seguramente que não me passa pela cabeça de proibir seja quem for de o fazer. Até porque seria ridículo. Apesar da estupidez autoritária, as palavras usam-se na mesma.

AEJS disse...

Prof. Carlos Fiolhais

Felicito-o pela iniciativa da digitalização dos livros da BGUC.

E felicito-o também pelo facto de a BGUC permitir aos seus leitores fazerem fotografias digitais dos livros. Infelizmente poucas são as bibliotecas que o permitem.

Não há diferença nenhuma entre os meus olhos estarem a olhar para um livro ou o óculo da minha máquina capturar para uma pastilha esse mesmo livro que depois leio em casa no meu computador, com a vantagem de manusear menos o livro e estar menos tempo a ocupar espaço da biblioteca.

No meu caso que vivo a 60 Km da BGUC permite-me ir a Coimbra e em poucos minutos ter vários livros memorizados para leitura posterior, evitando passar dias inteiros em Coimbra e ir lá várias vezes (gasto de combustível, poluição, gasto da viatura, portagens).

Pena é que nos Reservados vá acabar a possibilidade de os investigadores fotografarem os documentos.

Além do grande ganho em tempo (transcrever uma página manuscrita pode demorar horas), há a questão do custo.
Os investigadores em História investigam com o dinheiro do seu salário como professores. Exigir reproduções a 50 cêntimos ou mais como sucede em alguns arquivos é o mesmo que proibir a investigação.

A investigação em História pode ser pouco relevante para a Humanidade. Mas ao menos que deixem os investigadores fazer o que gostam sem lhes imporem a obrigação de passar meses num arquivo quando bastaria lá estarem alguns minutos, e sem lhes absorverem o pouco que ganham com custos de dezenas de contos mensais em fotocópias.

Será um grande retrocesso se a BGUC proibir os leitores de fotografarem reservados e manuscritos, quando o fazem apenas para fins de leitura domiciliária dos documentos com fins de estudo e investigação.


Mário Rodrigues

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