quinta-feira, 24 de janeiro de 2008
LEV DAVIDOVITCH LANDAU (1908-1968) - CENTENÁRIO DE UM GÉNIO
No passado dia 22 de Janeiro assinalaram-se os cem anos do nascimento de um dos maiores físicos do século XX, Lev Davidovitch Landau. Inventou uma escala logarítmica para classificar os físicos, na qual colocava Newton no topo (com 0,0), Einstein quase no topo (com 0,5) e ex-aequo os “pais” da mecânica quântica Bohr, Heisenberg, Schroedinger e Dirac (com 0,1), aos quais acrescentou Wigner e Bose. E ele próprio se autoclassificou com 2,5, tendo-se promovido para a nota 2,0 após um artigo que achou particularmente importante. O físico norte-americano David Mermin, que estudou o hélio e fundamentos da física quântica, tinha 4,5 na escala de Landau. Escreveu um dia um artigo em que reconhecia a distância de mais de duas ordens de grandeza: “Homenagem de um 4,5 a um 2”.
Landau, descendente de judeus e natural de Baku, no Azerbeijão, formou-se e doutorou-se em física em Leninegrado quando a mecânica quântica já estava estabelecida. Teve a sorte de ter circulado pelos melhores centros de física do mundo quando era jovem. conheceu e trabalhou por exemplo com Bohr e Heisenberg. Desde muito novo e ao longo da sua vida aplicou-a com sucesso aos mais variados domínios: hoje há o diamagnetismo de Landau, as equações de Ginzburg-Landau da supercondutividade, o som zero de Landau no hélio líquido, o amortecimento de Landau na física dos plasmas, o pólo de Landau na electrodinâmica quântica, contribuições para a física de neutrinos, para a astrofísica, para a física nuclear, etc. Ganhou o Prémio Nobel da Física de 1962 pelos seus trabalhos sobre o hélio 4 a baixas temperaturas. Landau dominava, como praticamente ninguém, toda a física. É dele a teoria fenomenológica das transições de fase de segunda ordem que tantas vezes é usada na física estatística. Foi ele quem estabeleceu em Kharkov, na Ucrânia, os chamados “mínimos de Landau”: uma prova rigorosíssima para jovens físicos. E foi ele quem escreveu com Lifschitz e outros um Curso de Física Teórica em 10 volumes que é hoje ainda uma referência fundamental para quem está ou quer entrar para a profissão de físico (há alguns volumes, os primeiros, em português, na editora Mir). Os seus livros de física são em maior número do que os de Feynman, o norte-americano seu contemporâneo que, como ele, trabalhou em vários domínios da física (também no hélio superfluido).
Infelizmente, Landau não pôde receber o Prémio Nobel em Estocolmo porque em 1962 sofreu um terrível acidente de viação: o seu carro bateu violentamente contra um camião. A recuperação foi lenta e difícil, apesar da ajuda competentíssima prestada pelo melhor neurocirurgião norte-americano num tempo em que só a solidariedade científica ao mais alto nível conseguiu quebrar as barreiras da guerra fria (Landau era um físico do regime soviético, apesar de ter estado um ano injustamente preso no tempo de Estaline e Beria). E nunca chegou a ser completa, pois Landau nunca voltou a ser o superfísico de antigamente, teve até de reaprender partes da física que ele sabia muito bem. Quase morreu de paragem cardíaca em várias ocasiões (há uma biografia intitulada “O físico que morreu quatro vezes”, com edição brasileira da Bloch), até que, seis penosos anos depois do acidente, o seu coração parou mesmo de bater.
Hoje, passados cem anos, Landau é uma lenda. Ele foi o grande inspirador e impulsionador da famosa escola de física teórica soviética (o seu discípulo Abrikosov já foi premiado com o Nobel). A sua exigência era enorme. O seu humor era terrível, contando-se algumas anedotas que ilustram bem essa faceta. Uma das mais famosas refere-se a uma discussão na Academia de Ciências de Moscovo com o biólogo Lyssenko, o autor de teorias heterodoxas sobre a evolução. Perguntou-lhe Landau: “O senhor acredita que se cortarmos as orelhas a uma espécie animal ao longo de várias gerações os animais virão a nascer sem orelhas?”. Respondeu Lyssenko: “Sim, acredito”. Rematou Landau: “Então explique-me porque é que as raparigas continuam a nascer virgens?”.
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