sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Como mentir a dizer a verdade

A actual ministra da educação tem prestado um serviço ao país inacreditavelmente mau. Não me lembro de um ministro da educação tão mau, nem mesmo Roberto Carneiro, que é responsável pelo começo das reformas que transformaram a escola gradualmente num videogame para iludir os pobres e mostrar ao mundo números felizes de sucesso escolar inventado. Pelo menos, Roberto Carneiro fez as reformas sem atropelos, dentro de prazos legítimos e sem a actual trapalhada. A sua pior herança foi ter enchido o ministério de especialistas em “eduquês” que continuaram a sua obra muito depois de ele se ter ido embora, e muitas vezes contra a vontade dos próprios ministros, impotentes para lidar com os pedagogos da casa.

Com esta ministra já ninguém sabe de nada; ora há exames ora não há, ora há manuais para seis anos ora não há, ora há novos programas ora não há, ora temos estas e aquelas disciplinas ora aqueloutras. Inventou mil burocracias para pôr os professores nas escolas a fingir que trabalham, quando deviam estar a estudar e a preparar aulas. Apregoa a formação de professores, mas cortou fundos e impediu a realização das mesmas — excepto, pasme-se, em bibliotecas, que como se sabe terá um impacto evidente na qualidade do ensino da física, por exemplo.

É a total incompetência, numa área em que a tranquilidade e as medidas atempadas e cuidadosamente preparadas deviam imperar. Pelo contrário, até parece que alguém está à pressa a legislar para fazer currículo e depois ir à vida que a morte é certa, depois de o sistema de ensino do país estar totalmente em cacos. E muitas vezes o que parece é.

Vem isto a propósito da mais recente tirada da nossa inenarrável ministra. Numa táctica que não esperava dela, pois não é uma política profissional, mas uma professora universitária que durante anos esteve à frente do Observatório de Ciência e Tecnologia a fazer o que sabe fazer, que é estatísticas, usou um recurso muito caro aos políticos: dizer mentiras com a verdade.

Uma das primeiras maluqueiras que esta ministra fez foi aprovar uma nova “lei dos manuais”. Nela, chorava-se sobre a instabilidade do ensino e culpava-se os manuais. Além disso chorava-se também sobre o preço dos manuais e culpava-se os editores. E vai daí faz-se dois em um: obriga-se as escolas a usar o mesmo manual durante seis anos no ensino secundário. Efeito imediato da medida: as editoras pequenas não sobrevivem porque não podem estar seis anos à espera de ter um ano com melhores vendas, se as coisas correrem mal. E portanto favorece a concentração dos editores escolares em grandes grupos, o que já está a ocorrer; por sua vez, isto significa menos concorrência de preços, pois haverá menos editoras reais no mercado, apesar de se manterem muitos selos editoriais, que todavia pertencem à mesma empresa. Ainda se lembram que a ideia era que o preço dos manuais é muito elevado? Adiante.

A história dos seis anos é particularmente interessante porque nos últimos 20 anos a instabilidade nunca foi provocada pelos editores, mas antes pelo ministério, que passa a vida a mudar programas, disciplinas, etc. E... continua a fazê-lo apesar da lei, claro. Essa foi uma das razões que me levaram a escrever contra a lei: é absurdo pensar que esta lei vai estabilizar o sistema, pois a própria lei declara, obviamente, que o ministério pode interromper os ciclos dos seis anos se for necessário. E, claro, sempre que os inefáveis anónimos ministeriais decidirem que é necessário é mesmo necessário.

Daí que a nossa ministra minta ao dizer a verdade. É verdade que ela fez a lei dos seis anos de vigência dos manuais. Mas esqueceu-se educadamente de referir que neste momento não só a Filosofia como outras disciplinas estão para ser alteradas e os editores e autores sabem que os manuais do 10.º ano que entram este mês em vigor e deveriam ficar por seis anos, segundo a lei, só ficarão em vigor por... três anos, segundo a mesma lei. E isto depois de uma dura negociação com os editores, pois o ministério nem três anos queria. Aí têm uma lição de honestidade da nossa senhora dos remédios santos na educação. Embrulhem e ponham um lacinho.

20 comentários:

Anónimo disse...

Sem mais comentários relativamente à forma como o Governo tem tratado a educação. Para não falar da precariedade que o mesmo promove juntos dos jovens licenciados que entram em empresas de base tecnológica. Trabalho numa empresa de renome mundial, mas que promove a não-estabilidade do emprego, sobretudo em Portugal. Mais grave ainda, não aposta na alta qualificação dos seus quadros, proibindo, ou dificultando, mesmo os seus colaboradores de se especializar em cursos de pós-graduação, mestrado ou doutoramento, alegando que as pessoas têm de estar a tempo inteiro na empresa. Tratando-se duma multinacional, deveria incentivar o estudo e a cultura de outras línguas estrangeiras que não o inglês, para alargar horizontes e estar mais próximo dos clientes doutros mundos. Mas sob pena de que os seus súbditos os venham a superar, até nessa vertente o papel dos colaboradores é fortemente reprimido e mal visto junto das chefias superiores.

Bem-vindos a Portugal.

Ass: alguém a pensar seguir uma carreira académica no estrangeiro.

Anónimo disse...

lllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll

Anónimo disse...

Ora até que enfim que alguém tem a frontalidade de identificar e denunciar a responsabilidade de Roberto Carneiro no processo que conduziu o nosso ensino ao estado lamentável em que se encontra.
Jorge Oliveira

Fernando Dias disse...

Mesmo que o mundo fosse a preto e branco seria difícil dizer que estou a cem por cento em desacordo com a ministra e a cem por cento de acordo com o Desidério Murcho. É claro que o Desidério tem carradas de razão em relação a muitas coisas que diz. Os políticos passam a vida a dizer mentiras com a verdade.

Por exemplo, em relação ao caso de os manuais serem estáveis por seis anos, penso que o Desidério está por um lado a remar contra a maré e por outro lado a querer sol na eira e chuva no nabal, ou a querer resolver a quadratura do círculo. Está a remar contra a maré, contradizendo os sinais dos tempos da globalização económica e empresarial. Quer sol na eira e chuva no nabal com a concorrência de preços (penso que o Desidério é a favor do liberalismo político e de mercado) e ao mesmo tempo a sobrevivência dos pequenos editores sem prejudicar a estratégia para a qualidade da aprendizagem.

Isto levanta o outro grande problema de sabermos que tipo de aprendizagem queremos. Uma aprendizagem de problematizações inventivas ou apenas de solução de problemas? Uma aprendizagem semelhante à aprendizagem de tocar piano (em que há uma invenção recíproca e indissociável entre pianista, piano e música) ou uma aprendizagem de tipo adaptativo a um qualquer ponto de Arquimedes, pré-dado e fixo?

To be, or not to be: that is the question.

herbário disse...

Gostaria de acrescentar que no caso de disciplinas como a Biologia, seis anos é muito tempo, para actualizações científicas e melhoria das estratégias de aprendizagem contidas no manual. Passa-se de um extremo a outro.

gabriela silva

Anónimo disse...

O enorme investimento nas bibliotecas é deveras caricato: com as aulas de substituição, os alunos pura e simplesmente não têm tempo para as frequentar! Tal verificou-se no último ano e não creio que vá mudar...

Unknown disse...

Eu gosto mesmo é do programa MediaSmart :)

in Público:

Media Smart, que prevê que as crianças entre os seis e os 11 anos tenham no próximo ano aulas de publicidade dadas por formadores pagos por empresas como a Nestlé ou a Danone. O programa Media Smart (...) promovido pela Associação Portuguesa de Anunciantes (APAN). Os objectivos de aprendizagem e os conteúdos destas aulas vão ser definidos por um grupo de organismos públicos e associações de pais liderado pelo ex-ministro da Educação Roberto Carneiro, enquanto a implementação do projecto no terreno é financiada por patrocinadores como a Nestlé, a Danone, a Kellog's e o Modelo/Continente.

Fixe! Para além da televisão passa a haver publicidade massificada nas escolas públicas, disfarçada de "ensino".

Não sei se reparam mas o Roberto Carneiro está em todas :))

Anónimo disse...

Houve recentemente outro exemplo de "Como Mentir Dizendo a Verdade".
Com a arrogância só possível de exibir por quem nada entende do que fala, a “sinistra” ministra dispara estatísticas estarrecedoras: afinal o rácio professor/aluno é em Portugal dos mais baixos da Europa, cerca de 9 alunos por professor. Escândalo, pensa o “povão”, tão ignorante nestas matérias quanto a “sinistra”, então que querem os malandros dos professores? Não contentes com os três meses de férias e só terem de trabalhar 14 ou 16 horas por semana, afinal só têm esses alunos? E depois ainda se queixam que não têm tempo para ver “tantos” testes… Deviam era de mandar mais umas dezenas de milhar para a rua!!
Bom, vamos lá ver se introduzimos alguns neurónios neste assunto. Para simplificar a compreensão do “fenómeno estatístico” consideremos uma escola somente com 4 turmas, cada turma com 25 alunos, frequentando 10 disciplinas, cada uma leccionada por um professor diferente, que leccionando às 4 turmas fica com horário completo. Assim, a escola tem 100 alunos e 10 professores, portanto o rácio é de 10 alunos por professor.
Significa isso que cada professor tem 10 alunos? Não, com 4 turmas de 25 alunos, cada professor tem 100 alunos! E com isto, penso que está feito o esclarecimento.
Mas será que a “senhora” não entende isto? Sabemos que a sua formação académica é na área de “letras” e que, portanto, deverá ter uma formação matemática deveras insuficiente, mas a isso teria de juntar grandes doses de estultice para não perceber a falácia da argumentação esgrimida. Assim, se não for isso, só resta a hipótese de, mais uma vez, procurar deliberadamente incentivar o ódio da população pelos professores, convencida que dessa forma a pode “ganhar”, “perdidos” que estão os seus tutelados.
Mas esse filão parece em vias de se esgotar, cada vez são mais as vozes que denunciam os dislates emanados desse ministério e, não fora as daninas consequências que prometem garantir a perenidade da memória da sua existência, dentro de não muito tempo já estaria a fazer companhia a outros ministros anónimos.
Infelizmente, não é só “por obras valorosas” que alguns “se vão da lei da morte libertando”.

Anónimo disse...

Voltando às contas matemáticas, só gostaria que me explicasse como é que um professor com 4 turmas de 25 alunos consegue preencher um horário semanal completo?
Segundo as minhas contas, imaginando que cada turma tem 3 a 4 horas da disciplina por semana, isto daria cerca de 12 a 16 horas de aulas por semana para cada professor. Não me parece ser a profissão com a carga horária mais extenuante.

Fernando Gouveia disse...

«[...] reformas que transformaram a escola gradualmente num videogame para iludir os pobres e mostrar ao mundo números felizes de sucesso escolar inventado

A suprema ironia é que nem com esse expediente se conseguiu dar um lustro de sucesso aos números da Educação nacional...

Anónimo disse...

Se mal estávamos então agora pior ficaremos!
E querem saber o que eu ouvi no passado dia 21 de Junho numa conferência na Gulbenkian na pessoa desse célebre professor da universidade católica??? Ler mais >>> AQUI

Anónimo disse...

O número de turmas necessárias para preencher um horário no ensino secundário depende das disciplinas leccionadas. Apesar das coisas não serem bem assim como vou passar a descrever, devido à introdução como unidade horária de blocos de hora e meia, o que levou a ter de introduzir nos horários dos professores horas supervenientes para compensar, vou simplificar utilizando como unidade a hora. Assim, as disciplinas de "Física e Química" e "Biologia e Geologia" têm, para os alunos, uma carga horária de três blocos, que corresponde, com os desdobramentos para as aulas experimentais, a uma carga horária de 8 horas para os professores. Este ano, com a introdução de mais meio bloco por turnos nos referidos desdobramentos, cada turma preenche 10 horas no horário do professor. Nestes casos, bastam 2 turmas para ter horário completo.
Claro que se forem turmas de 7º, 8º ou 9º anos, com carga horária de 3 horas semanais para o professor, serão necessárias 7 turmas para completar o horário.
Assim, o exemplo anterior apresentava situações médias, não pretendendo corresponder a nenhuma situação real, tão só servir para diferenciar entre "rácio professor/aluno" e "média de alunos por professor".

FRM

Anónimo disse...

Conclusão:
1.ª - A mentira diz-se az quem não é feliz com a verdade;
2.ª - Na ditadura imperava a censura, na democracia, a amanipulação;
3.º - "O Estado é um rei clandestino" (Simmel)
4.ª - Há-de haver sempre dominantes e dominados.

Jorge Carreira Maia disse...

Há um comentário de um anónimo que refere o «diminuto» tempo semanal de trabalho dos professores. Qual deveria ser o horário de um professor do ensino secundário (não confundir com os vários ciclos do básico)? Deveria ser de 20 horas. Dezasseis lectivas e quatro de apoio aos seus alunos. Mas isso não será muito pouco?

Para responder à questão é necessário perceber o que faz um professor para além de «dar aulas». Um trabalho sério implica preparação cuidada das aulas (todos os anos), preparação cuidada dos instrumentos de avaliação (todos os anos), correcção e classificação das avaliações (não se pense que são apenas 2 testes trimestrais). Só este trabalho implica mais de 35 horas semanais. Se tiver alunos em exame (e os alunos deveriam ter exames nacionais em todas as disciplinas "sérias") as suas preocupações aumentam. Há que cuidar que os alunos estudem para as provas. Muitas vezes quase que se estuda por eles…

Mas um professor que queira ensinar deverá estudar todos os dias. Este estudo deve versar a sua área científica, mas alargar-se a outras áreas de forma a apresentar perante os alunos uma cultura geral sólida. Este é o espírito fundamental que deve presidir ao trabalho de um docente. Sou professor de Filosofia e não faço outra coisa que me dê proventos. Se leio, por exemplo, a biografia de D. Carlos, de Rui Ramos, isso tem a finalidade de ter uma visão global de um período da História de Portugal para poder falar num qualquer momento numa aula em que isso venha ao caso. Se vou à Gulbenkian ver os quadros de Arte Moderna ou se vou ao Guggenheim a Bilbau ou ao Museu d’Orsay ver os impressionistas, isso não tem apenas a ver com o meu prazer estético. Permite-me, nas aulas de Filosofia falar do que vi, abrir horizontes, levar os alunos a amar a pintura, ou o cinema, ou transmitir-lhes o meu gosto pelos livros que vou lendo, pelos filmes que vejo, pela música que oiço. E nunca transijo propondo-lhes facilidades ou lixo. Para os meus alunos quero, mesmo que eles ainda não o percebam, o melhor que humanidade dá. Sempre que vou ao cinema ou leio um livro, pergunto-me: o que poderei tirar para as minhas aulas. Sinto-me também obrigado a estar a par da divulgação científica. Há alturas que deverei falar aos alunos da importância da mecânica quântica, da astrofísica, ou da genética. Sei muito pouco de tudo isto, mas tenho continuamente de estudar, porque, como muitos dos meus colegas, sinto o dever ético e deontológico de abrir horizontes.

Um professor sério, e há muitos em Portugal, que dê 16 horas de aulas não trabalha, naquilo que é o trabalho de professor e educador, menos de 50 horas semanais. E fá-lo com paixão e continuamente. O que se passa é que desde Roberto Carneiro, passando pela dupla Grilo/Benavente, acabando na actual ministra, vigora a ideia de que um professor é um burocrata, que deverá passar a vida em reuniões inúteis, a elaborar projectos e planos de coisa nenhuma, a criar regimentos, a escrever actas, fazer avaliações de escolas, a projector trabalhos em equipa, como se isso fosse uma virtude, e toda uma panóplia de actividades que mata qualquer espírito de investigação e de amor ao saber. Como pode alguém estudar se chega a casa estoirado com actividades absolutamente irracionais? A burocratização das escolas e a desvalorização do saber científico e da alta cultura por parte do Ministério são os principais cancros do ensino em Portugal. Há outros, mas estes que atacam os princípios reguladores do sistema educativo são letais. Os professores deveriam explicar isto aos portugueses…

Peço desculpa pelo espaço ocupado. Remeter-me-ei de novo para o meu lugar, o silêncio. Jorge Carreira Maia

Fernando Martins disse...

"Voltando às contas matemáticas, só gostaria que me explicasse como é que um professor com 4 turmas de 25 alunos consegue preencher um horário semanal completo?
Segundo as minhas contas, imaginando que cada turma tem 3 a 4 horas da disciplina por semana, isto daria cerca de 12 a 16 horas de aulas por semana para cada professor. Não me parece ser a profissão com a carga horária mais extenuante."

Quem fala do que não sabe diz asneira...

O horário de um professor é de 35 horas, como o de qualquer funcionário público.

Um exemplo na minha Escola: a professora A dá aulas de Físico-Químicas e tem 5 turmas (3 de 7º e 2 de 8ª) com 4 horas cada (as turmas, por causa do ensino experimental de ciências, desdobram...). Depois dá 2 horas de Área de Projecto, tem 2 horas de Sala de Estudo e duas de um Clube de Ciências., ficando com 9 horas para Reuniões e Trabalho em casa (o que NUNCA chega...).

lino disse...

Só quatro meses e o humor "mineiro" já é fogo!
Abraço.

Anónimo disse...

"
Mas um professor que queira ensinar deverá estudar todos os dias. Este estudo deve versar a sua área científica, mas alargar-se a outras áreas de forma a apresentar perante os alunos uma cultura geral sólida. Este é o espírito fundamental que deve presidir ao trabalho de um docente. Sou professor de Filosofia e não faço outra coisa que me dê proventos. Se leio, por exemplo, a biografia de D. Carlos, de Rui Ramos, isso tem a finalidade de ter uma visão global de um período da História de Portugal para poder falar num qualquer momento numa aula em que isso venha ao caso. Se vou à Gulbenkian ver os quadros de Arte Moderna ou se vou ao Guggenheim a Bilbau ou ao Museu d’Orsay ver os impressionistas, isso não tem apenas a ver com o meu prazer estético. Permite-me, nas aulas de Filosofia falar do que vi, abrir horizontes, levar os alunos a amar a pintura, ou o cinema, ou transmitir-lhes o meu gosto pelos livros que vou lendo, pelos filmes que vejo, pela música que oiço. E nunca transijo propondo-lhes facilidades ou lixo. Para os meus alunos quero, mesmo que eles ainda não o percebam, o melhor que humanidade dá. Sempre que vou ao cinema ou leio um livro, pergunto-me: o que poderei tirar para as minhas aulas. Sinto-me também obrigado a estar a par da divulgação científica. Há alturas que deverei falar aos alunos da importância da mecânica quântica, da astrofísica, ou da genética. Sei muito pouco de tudo isto, mas tenho continuamente de estudar, porque, como muitos dos meus colegas, sinto o dever ético e deontológico de abrir horizontes."

Pedindo desculpa pela longa citação do comentador acima, disparo: não será um dever de cidadania, mais que mera ética profissional? Eu leio, vejo, ouço, busco, aprendo, e tudo isto irá de algum modo transparecer na minha actividade profissional, directa e indirectamente. Mas tal não significa que me arrogue o direito de contabilizar este tempo como horário laboral (nem tal me é, obviamente, permitido).

Ademais, todas estas actividades são opcionais e impossíveis de contabilizar: não poderia o mesmo argumento servir para justificar um aumento salarial, com base no número acrescido de páginas do romance, ou quadros da galeria?

Por último, e como aluno pós-Carneiral e colaborador da meu antigo liceu, posso afiançar que os "muitos colegas" que partilham a justa sede de saber do comentador são largamente ultrapassados pelos imensos docentes que investem tanto na sua valorização pessoal ou profissional como eu na Bolsa de Valores.

Parece-me que discutir os horários é um pouco fugir à questão: a função de professor foi desvalorizada e esvaziada nos tempos recentes, e essa injustiça patente tornou-se, para muitos, numa profecia auto-concretizável. A espiral não será interrompida com maior controlo de horários ou discursos auto-congratulatórios, mas com uma aposta séria na formação dos professores (que ainda não existe, permitindo que muitos sejam apenas licenciados sem escapatória) e uma avaliação justa e circunstanciada dos resultados.

Pedro Galvão disse...

«O horário de um professor é de 35 horas, como o de qualquer funcionário público.

Um exemplo na minha Escola: [..] ficando com 9 horas para Reuniões e Trabalho em casa (o que NUNCA chega...).»

Exacto. Em muitas semanas do ano lectivo, pode mesmo ser necessário trabalhar mais de 50 horas para garantir um trabalho competente. Nestas circunstâncias, o ME tem beneficiado de muitas e muitas horas de trabalho não remunerado dos professores. Importa não esquecer que muito desse trabalho é invisível, já que, dada a ausência de condições, não pode ser realizado na própria escola.

Anónimo disse...

Hmmmm... Desta vez concordo com o Desidério. De facto, qual a necessidade de formar bibliotecários em ambiente escolar? E não seriam dispensáveis as próprias bibliotecas? Concentremo-nos no que é importante: abrir caminho ao Desidério até à 5 de Outubro. E senão de imediato, talvez mais perto das próximas eleições.

Q. Rico

Anónimo disse...

A Ministra da Educação tem razão: manuais escolares diferentes todos os anos ? para quê tanto desperdício ? Milhões de livros que de um dia para o outra de nada servem ? A não ser para compor as contas de editoras que vivem da "subsido-dependência".
A maioria dos professores do secundário que conheci, nos anos 80, eram seres desinteressantes que se limitavam a despejar matéria nas aulas. Não gostavam da profissão, alguns eram engenheiros sem engenharia, outros matemáticos sem gosto pelo ofício dos números, as ciências eram tediosas (a arte de decorar...), as aulas práticas eram teóricas ...etc. Passávamos as aulas a dormitar....Espero que hoje seja diferente !

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião   Cristiana Gaspar, Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação,...