domingo, 23 de setembro de 2007
A COISA MAIS PRECIOSA
Minha crónica do último "Sol":
Apesar de a ciência se encontrar hoje por todo o lado, nem sempre é fácil transmiti-la. Alguns casos recentes ilustram bem essa dificuldade:
- No badaladísimo caso Madeleine McCann, como explicar ao grande público o significado de uma concordância de 80 por cento no DNA, passando a mensagem que a ciência não pode, em geral, oferecer certezas absolutas? A noção de probabilidade não é fácil e, de resto, o público não quer uma resposta baseada em percentagens mas sim uma resposta de sim ou não, para saber se os arguidos são culpados ou inocentes.
- No caso do ataque de um grupo ecológico radical a uma plantação de milho transgénico no Alentejo, como explicar ao grande público o que são organismos geneticamente modificados? E serão mesmo perigosos para a saúde pública? De facto, as pessoas têm dificuldades com a noção de risco, que se mede com probabilidades. Normalmente – e isso é normal - têm receio do invisível e do novo. De novo, querem da ciência certezas que não podem ser dadas.
- É também controversa a construção de uma nova barragem no Alto Sabor, para não falar já da construção da primeira central nuclear em Portugal. Será que as novas centrais de energia podem ser discutidas apenas numa perspectiva científica? Claro que há outros factores que devem ser considerados na tomada de uma decisão (políticos, económicos, etc.), sendo muito difícil destrinçá-los. Além disso, a comunidade científica discute entre si: algumas pessoas queriam uma resposta científica unânime, mas encontram afinal várias respostas, por vezes antagónicas.
Estes três exemplos mostram bem como a ciência pode ser incerta e controversa. Pois é precisamente a incerteza que alimenta a ciência. E é precisamente a controvérsia que faz avançar a ciência. A discussão científica serve para diminuir a incerteza. Da discussão há-de nascer a luz, se não a luz toda pelo menos alguma luz. A incerteza e a controvérsia em nada diminuem a ciência. Como disse Einstein: “A ciência pode ser primitiva e infantil, mas é a coisa mais preciosa que temos.”
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1 comentário:
Caro Carlos,
Há textos que são assim: pequenos, mas muito exactos, quando desejamos divulgar ao grande público um saber ou o que é a ciência. O seu texto podia figurar num bom manual de filosofia. Não é um bom princípio escrever comentários para, pura e simplesmente, elogiar, sem mais. Mas de quando em quando não resisto a fazê-lo, quando vejo que, de forma simples, se pode dar uma luz sobre o complexo. Isso tem tanto de nobre como genial.
Obrigado
Rolando Almeida
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