"O mundo é um lugar perigoso para se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa daqueles que o observam e deixam o mal acontecer" (Albert Einstein).
Mesmo depois de ter sido noticiada a possibilidade de suicídio de uma criança vítima de bullying, em artigo assinado por Graça Barbosa Ribeiro, lia-se hoje no jornal Público que “Gina Tomé, psicóloga da equipa de investigação em Psicologia da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa, comentou apenas que os estudos feitos no seu departamento comprovam que o número de casos de bullying baixou entre 2002 e 2006, em Portugal pelo que não há qualquer razão para 'alarme social'”.
Em contrapartida, segundo a mesma fonte, um estudo realizado pela Universidade do Minho, a cargo da investigadora Maria Tomás de Almeida, sobre a violência nas escolas em 2008 e 2009 tem esta ocorrência como “um dado preocupante”, embora os casos tendam a diminuir, ainda são “13,5 por cento os jovens que se dizem vítimas do bullying”. E logo acrescenta o referido estudo, "com medo de represálias, muitas vezes nas escolas diz-se que não existe bullying. E isto porque esta forma de violência, de agressão física e/ou psicológica continuada, é exercida de maneira camuflada e os alunos que a sofrem não se queixam”.
Em notícia de Ana Fragoso, ibid., lia-se em título de página inteira: “Menino que se lançou ao rio Tua era há algum tempo agredido verbal e fisicamente”. E, em subtítulo: “Instaurado inquérito sobre o caso de suicídio de criança de 12 anos. Colegas e familiares afirmam que o aluno era uma vítima de outros estudantes e até já identificaram os agressores”.
Ou seja, mais uma vez se verifica o aforisma bem português: “Depois de casa roubada trancas na porta”. Talvez por preferir um outro que diz que “mais vale prevenir do que remediar”, foi publicado, em 11 de Março de 2008, neste blogue, um post da minha autoria, intitulado Sementes de violência. Trancrevo-o na íntegra pela sua actualidade em denunciar uma responsabilidade que não pode continuar a ser enjeitada ou escamoteada pela sociedade portuguesa como que a querer "sacudir a água do capote", servindo-me de uma linguagem militar:
"Portugal, na década de 50. Passava então na tela dos cinemas um filme norte-americano com o título de que me apropriei para este texto. Nele contracenavam Glenn Ford e Sidney Poittier. Aquele como professor e este como aluno de uma high school pobre e degradada em que os problemas de disciplina se agravavam num conflito de natureza racial.
Anos mais tarde, meados da década de 70, assistia Portugal à invasão dos liceus públicos por docentes com escassas habilitações académicas com a intenção política da lavagem ao cérebro de cabeças juvenis, num ataque ao poder paternal e a princípios morais transmitídos em casa. Do dia para a noite, os pais passaram a ser considerados ditadores por tentarem que a liberdade dos filhos se não transformasse em libertinagem. Depois, seguiu-se um período de euforia sem responsabilidade, em nome de uma sociedade que entoava hinos de louvor às pedagogias do 'eduquês' e remetia para as profundezas do inferno o conhecimento científico.
O terreno foi terraplanado por cabouqueiros que transformaram o ensino em tenda privilegiada de um circo de indisciplina, sendo destinado aos professores o papel de palhaços pobres. Com o aplauso e gáudio da pequenada, entrou-se num processo que conduziu à situação de haver professores que são agredidos por pirralhos do 1.º ciclo do ensino básico (antiga instrução primária). Em entreactos de um triste drama, um estudo de 2006 concluiu que o número de agressões a professores por alunos portugueses é o dobro do que ocorre na Inglaterra. E isto é tanto mais insólito quanto o número de professores da velha Albion é o triplo dos seus colegas lusitanos.
Tardiamente, ao apelar para 'a necessidade de reforçar a autoridade da escola com medidas disciplinares de carácter educativo, adaptando-as às circunstâncias actuais que comprometem a eficiência educativa' ('Público', 10.Março.2007), a ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues veio reconhecer publicamente que a Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro (Estatuto do Aluno do Ensino não Superior), não cumpria os desígnios de um combate eficaz contra a indisciplina.
Meses mais tarde, no jeito bem português de 'dar uma no cravo e outra na ferradura', noticiava a Agência Lusa (25.Outubro.2007) um autêntico sacrilégio na luta contra a indisciplina: 'A Comissão Parlamentar da Educação aprovou ontem a realização de uma prova de recuperação para os alunos que ultrapassem o limite de faltas, independentemente de serem justificadas ou não'. Todos os partidos da Oposição, ainda segundo a Lusa, 'se opuseram a esta medida com o argumento de que ela não promove a assiduidade, nem uma maior exigência e qualidade do ensino, já que o estudante transitará de ano lectivo, mesmo que não obtenha aproveitamento'.
Não me parece ser com medidas geradoras de mau ambiente escolar (por permitirem que os alunos gazeteiros se passeiem em plena impunidade pelos corredores da escola quando lhes dá na real gana em visita tumultuosa e provocadora a professores e colegas) que se combate eficazmente a agressão verbal, física ou psicológica, como esta aqui transcrita:'Recentemente [com total impunidade] duas professoras minhas conhecidas foram alvo de mimos de três adolescentes: uma foi ameaçada com uma faca e à outra entornaram-lhe um copo de água nas costas' (Editorial, 'O Primeiro de Janeiro', 4.Março.2008).
Esta forma de agressão, com tradições antigas em todo o mundo nas comunidades juvenis – cuja única novidade trazida a Portugal foi a adopção da palavra inglesa 'bullying', que se pode traduzir por amedrontar ou agredir os mais fracos -, muito se agrava no Agrupamento Vertical de Escolas, em que frequentam o mesmo estabelecimento de ensino alunos desde o início do 2.º ciclo do básico até ao final do secundário. Ou seja, com uma diferença de idades de oito ou mais anos! Quer isto dizer que não houve qualquer cuidado por parte da tutela em fazer publicar normas legislativas que diminuíssem os efeitos da indisciplina e, muito menos, de promoverem a sua pelo menos parcial erradicação. Bem pelo contrário!"
17 comentários:
É tal e qual.
O problema permanece e agrava-se, perante a indiferença de (quase) todos.
E tudo muda sempre e nada melhora nunca.
Apesar da resistência de uns quantos, que não pactuam com o "estado das coisas" (leia-se, bandalheira) e porfiam em trabalhar discreta, honesta e dedicadamente, apesar de mal tratados e mal pagos.
Quem avalia, responsabiliza (e pune) os que têm destruído o ensino (leia-se escola pública?)
Até um dia...
Excelente texto.
Caro Fartinho da Silva:
Agradeço todos os comentários que fez aos meus post's e que, não poucas vezes, me ajudaram a questionar-me sobre as minhas próprias posições. E a revê-las, até!
Cordialmente e até breve,
Rui Baptista
Caro José Batista da Ascenção:
Infelizmente, os que juram a pés juntos estarem contra a escola pública, muitas vezes, pregam mais um prego no seu caixão.
O meu Amigo sabe tanto como eu, segundo julgo, a acção funesta de certos sindicatos docentes nesse sentido, pese embora a sua necessidade em questões laborais.
Como acreditar numa acção sindical que igualiza desiguais premiando os medíocres e desacreditando os mais válidos? Ou seja, promovendo o demérito!
Fiquei chocada com o caso deste menino! Para mim, isto não ficava por aqui...O Estado português , a escola, os pais dos miúdos que praticaram bullying, os próprios, deveriam ser devidamente penalizados.A falta de respeito continua a prevalecer cada vez + na nossa sociedade.
É incrível o sofrimento deste miúdo e ninguém deu por nada...
Cumpts,
Madalena
Quantos de nós fomos vítimas... de situações congéneres e nunca superadas? JCN
Madalena
Perfilho o seu desabafo mas repare que o mais estranho é que nem os pais intuíram "o sofrimento" do filho., o que me intriga mais.
Boa tarde
Sou professora e faço parte da direcção de um Agrupamento de Escolas... O fenómeno de violência entre crianças e jovens não é de agora...O que se passa é que actualmente atinge porporções totalmente desmedidas e incontroláveis e por motivos nada fáceis de controlar e evitar...
Não querendo desresponsabilizar ninguém o facto concreto é que as Direcções não têm muito por onde agir: o máximo é a suspensão por 2 a 5 dias, (o que após o regresso continua...); comunicar à familia (que nada faz... aliás muitas vezes acha que o seu pequeno é a vitima e não o agressor), comunicar à Comissão Protecção de Menores (que pouco ou nada faz a curto prazo... os processos arrastam-se durante anos...), comunicar à Escola Segura/Policia (que sendo o jovem-agressor menor de 16 anos... nada pode fazer...) ,comunicar à sua Direcção Regional (que também nada faz...) ou seja: com o quadro legal que temos para estas situações o que é que afinal as Direcções das Escolas poderiam fazer que não fazem?
Todos se viram para as Direcções das Escolas que não fazem nada para acabar com o bulying... pois garanto-vos que aquilo que está ao seu alcance a maior parte faz... só que o alcance que a lei lhes dá é tão diminuto que nada resulta eficazmente!
Muitas vezes... e agora perdoem-me a franqueza totalmente antipedagógica... o que é que uma bela bofetada não poderia resolver de imediato?
Há certas linguagens que são universalmente compreendidas!
"Olho por olho...dente por dente."
Mas se um professor actuar de imediato com um tabefe num caso de bulying entre alunos... "Aqui d'el-rei! Que é um agressor... coitadinho do rapaz...ou da rapariga que tem um problema de familia... os pais estão a separar-se...está traumatizado...tem de haver tolerância...os adultos têm de actuar pedagogicamente... etc etc etc...
MAs a União Europeia até decretou uma lei qualquer recentemente em que os pais não podem bater nos filhos! Então continuem! Já há é muita mãe e pai a apanhar dos ricos filhos... porque o bulying não é só dentro da escola... é também fora... e conheço muito filhinho de quem as mães e pais têm medo!
Bahh!!! Digam lá então o que é que é suposto ser feito afinal...que seja eficaz???
Por acaso até se agradece: um manual de actuação perante determinados casos de agressividade entre alunos!
Belos tempos em que até 1 continuo tinha autorização de dar 1 chapada a um aluno quando houvesse falta de respeito!
O problema é que deixam a criançada fazer o que quer e o que lhes apetece!
Vão para uma aula desestabilizar e o professor não os pode meter na rua, o professor não lhes pode levantar a voz, o professor não os pode castigar, fazem perder tempo, a eles e aos colegas e no fim à sociedade.
Não chumbam por faltas, não chubam de ano que já há passagens administrativas até ao 9º ano com mais de 6 negativas, que se estenderá até ao 12º ano quando este se tornar obrigatório.
Nas reuniões de professores continua a moda de coitadinho do aluno que é pra chumbar mas vá lá vamos passado e fica registado em acta, que diga-se que os professores também não se estão para se chatear e querem-se ver livre deles.
Estes cidadãos aberrantes que são esses alunos vão sair após 9 ou 12 anos de escola onde passaram o tempo, fizeram perder tempo e dinheiro a toda a sociedade e que proveito nos trazem?
As vezes 2 par de chapadas resolvem muitos casos, 1 par na criançada e outro nos país que também têm culpa!
Belos tempos em que existiam as colónias penais como a colónia penal agrícola de Vila Fernando!
Caro Rui Baptista,
Agradeço os seus elogios e espero continuar a meditar através da leitura dos seus textos.
Julgo que a Teresa Marques explicou de forma bastante bem detalhada o que se passa REALMENTE nas "escolas" públicas portuguesas.
Infelizmente, as "escolas" públicas, "professores", "alunos" e "encarregados de educação" não estão ao serviço do conhecimento, da ciência e da cultura; estão apenas a justificar o emprego de terceiros.
Quem sem os terceiros?
1. Os auto-denominados "cientistas" da educação. Estes senhores e senhoras confundem ciência com mitos e com ideologia;
2. Os "psicólogos" da "educação", seja lá o que isso for. Estes senhores e senhoras conseguem fazer acreditar a qualquer ser humano bem intencionado que é possível aprender sem esforço e trabalho. Não sei como se licenciaram, mas duvido que tenha sido sem esforço...;
3. Os "sociólogos" da "educação". Estes senhores e senhoras confundem sistematicamente ciência com ideologia;
4. Os burocratas que ao estilo mais soviético que se possa imaginar têm orgasmos de prazer ao criarem planos, projectos, sistemas, currículos, relatórios, formulários, reuniões, etc., etc., partindo do pressuposto que os alunos são todos seres angelicais de grandes olhos azuis e com umas grandes asas brancas nas costas com capacidades intelectuais próximas das de alguém com a mistura genética entre Einstein e Freud....;
5. Sindicalistas que sempre colocaram a ideologia e os interesses pessoais à frente dos interesses do país;
6. "Professores" que professaram a fé das "ciências" da educação e que hoje são claramente o grupo maioritários nas tais "escolas" públicas. Estes "professores" adoram tudo o que seja planos, projectos, reuniões, competências verticais, horizontais, diagonais, etc., etc. Tudo, desde que não tenham que estudar, preparar aulas, ensinar, corrigir testes,....
Toda esta gente é paga com o dinheiro do contribuinte, até um dia...
MAS ATENÇÃO: Grande parte do caos que foi instalado na "escola" pública de fora para dentro, teve a complacência da grande maioria dos intelectuais e das elites portuguesas. Estas pessoas sabiam muito bem o que estava a acontecer e nada fizeram para o evitar, salvo honrosas excepções. A população em geral também nada fez.
Agora que começamos, todos, a perceber que falhámos como país e como sociedade; agora que começamos a perceber que a "escola" não nos preparou para o mercado fortemente concorrencial em que vivemos; agora que percebemos que é quase certo não termos reformas, sistema de saúde nem de educação; agora que percebemos que estamos a empobrecer a uma velocidade próxima da do final da primeira república começamos a estar assustados. Mas, julgo que o susto maior ainda está para vir e virá muito mais cedo do que se pensa...
E que dizer da manifestação mais socialmente aceite de Bullying no nosso sistema de educação e a níveis mais elevados, as PRAXES ditas académicas?
Quem não se deixar "praxar" é ostracizado, humilhado e excluido de eventos académicos...e muito mais !!!
Sempre fui contra prácticas humilhantes na minha faculdade e alinhei em eventos que achei dignos e de manifestação genuína de jovens cheios de boas intenções: queríamos mudar o mundo ... e até conseguimos qualquer coisinha!!!
Agora acho que tudo isto é fruto da falta de autoridade dos agentes educativos e da falta políticas de educação do chamado " Ministério de Educação"!!!
Este enxameado de gente sem ideias e apenas a gerir o seu futuro imediato: veja-se a composição das Direcções Regionais de Educação...
Criminalização o fenómeno não vai resolver nada!
Dê-se autoridade ao professor ...
Caro fartinho da silva
Falou que estamos numa situação de fim de 1ª republica..
Repare nisto: desde que temos o liberalismo se têm verificado este ciclo, este rotativismo:
com a monarquia constitucional eram progressistas e regeneradores, e o que deu? ditadura de João Franco, seguida de uma revolução e um novo regime.
Com a republica passou-se o mesmo, o rotativismo levou a um golpe e à ditadura, depois veio o 25 de abril e andamos neste ps e psd há décadas!
Qualquer dia temos outro 28 de maio de 1926 e nem nos apercebemos, porque está tudo numa apatia geral, querem é bola e novelas!
O povo desinteressou-se da res publica!
Concordo plenamente que esses cientistas da educação estragaram a escola, essa gente vêm com essas teorias da treta, do aprender a aprender e outras banalidades, metem muita pompa nas formulas, nos métodos e nada no conteúdo!
Um professor pode saber usar o material escolar, os métodos pedagógicos mais americanizados possíveis, mas surpresas das surpresas, não saber nada da matéria que vai leccionar!
Essa gente foi-se infiltrando com a complacência dos professores e aproveitando a progressiva retirada desses professores mais velhos que foram sendo substituídos pela malta das escolas superiores de educação ou mesmo das universidades já num período em que as mesmas estavam contagiadas com esses pós modernismos!
Agora a única maneira é purgar a escola de todos os elementos nocivos, será introduzir um clister no ministério da educação para evacuar toda a porcaria que dele depende, mas para isso teríamos que fazer o mesmo no governo e na política, está a ver a dificuldade? quem se quer meter em problemas?
Eu gostaria de saber a solução..
Partilho inteiramente o texto e as ideias de Fartinho da Silva.
O problema parece-me de (quase) impossível resolução.
A gente do eduquês, nas suas diferentes versões e "especializações" cresceu, multiplicou-se e preencheu todos os espaços disponíveis no tecido sócio-educativo português. Acresce que talvez não haja família alguma no país que não conte no seu seio algum especialista em educação de qualquer coisa, daqueles que muito provavelmente fazem tudo menos dar aulas e lidar com alunos (crianças e jovens), em especial os mais difíceis. E assim como como nos podemos ver livres da desgraça? Um meu amigo de tertúlia diz que de tal modo estão tais indivíduos agarrados aos lugares que funcionam como lapas impossíveis de arrancar, mesmo com pé-de-cabra.
E no entanto, temos que fazer qualquer coisa, nem que seja começar por desmascarar (embora correndo riscos) as situações que, de resto, já só não vê quem não quer ver...
O que, neste domínio, se passa nos semináioos e congregações religiosas masculinas é simplesmente inimagínável. JCN
Corrijo a gralha "semináioos" por "seminários". Falta de atenção, seguramente. JCN
ESTOU CHOCADA AB UNS DIAS QUE SOU VITIMA DE TAL COISA MAS TENHO TANTO MEDO DESAS PESSOAS QUE ME TENHO CALADO E AGENTADO TUDO A NOITE TENHO MEDO DO DIA SEGUINTE QUE SO PENSO QUE VOU LEVAR PORRADA DELA.. ATE ANDO NA LUTA PARA ME PODER DEFENDER
Enviar um comentário