segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

O ANO DE DOSTOIÉVSKY E OUTROS

 


Texto meu sobre efemérides de 2021 que acaba de sair na revista "As Artes entre as Letras" do Porto (não houve espaço para outras efemérides, como os 100 anos do Nobel de Einstein, os 200 ano da morte de Napoleão, e os 700 anos da morte de Dante) 

Se 2020 foi o ano Beethoven para assinalar os 250 anos do seu nascimento, 2021 é – vai ser – o ano do russo Fiodór Dostoiévsky, o autor de Crime e Castigo, O Jogador e Os Irmãos Karamazov, um gigante da literatura mundial. O escritor nasceu em 11 de Novembro de 1821 e morreu quase 60 anos depois. Entre nós a Presença vai reeditar uma dezena das suas obras, que vale a pena ler ou reler. Destaco a edição em dois volumes, na Presença, dos Irmãos Karamazov com tradução do russo de Nina Guerra e Filipe Guerra, tradutores premiados pela Associação Portuguesa de Escritores e pelo Pen Clube Português. Mas há edições de outras editoras como a Relógio d‘Água.


As comemorações literárias não se ficam, porém, por aqui. Passam os 400 anos do nascimento do francês Jean de la Fontaine (1621-1695), o autor das famosa Fábulas, escritas entre 1169 e 1694, e os 150 anos do nascimento de Marcel Proust (1871-1922), o autor de Em Busca do Tempo Perdido, escrito entre 1908 e 1922 e publicado em sete volumes entre 1913 e 1927.


Entre nós assinala-se o centenário de Carlos de Oliveira (1921-1981), nascido em Belém do Pará, no Brasil, de emigrantes portugueses, mas associado à Gândara, no concelho de Cantanhede. É o autor dos livros Uma Casa na Duna, Uma Abelha na Chuva e Finisterra, entre outros, além de um trabalho poético num só volume. E passa também o centenário de Rui Grácio (1921- 1991), nascido em Lourenço Marques (hoje Maputo), que foi pedagogo e estudioso de Ciências da Educação – a minha selecta de Filosofia do liceu foi organizada por ele.


Para Coimbra, 2021 é um ano marcante, embora a cidade permaneça culturalmente apática. Passam-se so 800 anos da Fundação do Mosteiro de Celas, uma casa da Ordem de Cister, que foi fundada pela beata D. Sancha, filha de D. Sancho I, em Vimaranes, no que eram então arredores de Coimbra, mas que hoje pertence à cidade. Recomendo uma visita ao claustro que é do início do século XIV e que tem belos capitéis com cenas da vida de Cristo. Sugiro sobre esse mosteiro o belo livro Santos, Heróis e Monstros. O Claustro da Abadia de Santa Maria de Celas, de Carla Varela Fernandes, Edições Colibri (2020).


Por outro lado, passam 750 anos do nascimento da  Rainha Santa Isabel ou Rainha Santa (1271-1336), a aragonesa que casou com D. Dinis e que foi canonizada em 1625, sendo hoje padroeira da cidade de Coimbra. Foi sepultada no mosteiro de Santa-Clara-a-Velha, que esteve muitos anos inundado pelo Mondego e que foi exemplarmente reconstruído (vale a pena a visita!), mas, devido à subida do nível das águas fluviais, foi transladada para o Mosteiro de Santa Clara-a-Nova, no alto de uma colina próxima, onde está hoje (a Igreja pode ser visitada, mas o gigantesco edifício do mosteiro não, ou melhor só pode em circunstâncias especiais, como têm sido as da Bienal de Arte Contemporânea de Coimbra).


Em 2021 passam, a 19 de Dezembro, os 500 anos da coroação de D. João III (1502 -1557), o filho mais velho de D. Manuel I, que se tornou um dos reis mais poderosos do mundo. Passam também os 500 anos da chegada, em 16 de Março, de Fernão de Magalhães (1480-1521) às Filipinas. O navegador português que empreendeu a primeira viagem de circum-navegação não a completou: morreu em Mactan, na ilha de Cebu, no arquipélago filipino, num confronto com os locais, no mês seguinte ao da chegada.


No ano seguinte aquele em se comemoraram os 200 anos da Revolução Liberal, há duas datas relevantes para a história da liberdade em Portugal: assinalam-se os 200 anos da extinção da Inquisição em Portugal. Instituído em Portugal por D, João III em 1536, esse tribunal só foi extinto em 31 de Março de 1821. Assinalam-se também os 200 anos da Liberdade de Imprensa em Portugal: com efeito, foi a 4 de Julho de 1821 que foi promulgada a primeira lei de liberdade de imprensa. Essa lei logo no seu primeiro artigo assegurava a qualquer pessoa a possibilidade de imprimir, publicar, comprar e vender em Portugal e nos Estados Portugueses quaisquer livros ou escritos sem censura prévia. Dez dias depois era criado o Tribunal Especial da Proteção da Liberdade de Imprensa.


Em 2021, comemoram-se os 150 anos do nascimento de Alfredo da Silva (1871-1042), o grande industrial que fundou a Companhia União Fabril - CUF, entre outras grandes empresas que deixaram marca no panorama económico e social português. É ainda o ano do centenário da revista Seara Nova, fundada em Lisboa em 1921 por iniciativa de Raul Proença, onde pontificaram intelectuais como Jaime Cortesão, António Sérgio, Raul Brandão e Aquilino Ribeiro. A revista, que foi um baluarte da luta contra o Estado Novo, ainda hoje existe. Acresce que passa o centenário do jornal vespertino Diário de Lisboa, cujo primeiro número saiu em 7 de Abril de 1921 (sendo primeiro director Joaquim Manso) e o último em 20 de Novembro de 1990. A integridade das edições esta disponível nas páginas web da Fundação Mário Soares. Lembro-me de ter mandado um artigo para o Diário de Lisboa Juvenil, mas não sei se saiu…


Do ponto de vista científico, 2021 é o ano do centenário do físico russo e activista político Andrei Sakharov (1921-1989), que foi prémio Nobel da Paz e que tem o nome num prémio da União Europeia. Entre nós é o centenário da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto, a mais antiga faculdade de Farmácia do país em funcionamento contínuo.


Uma vida humana pode abranger um século. Edgar Morin, o sociólogo francês que tive o gosto de conhecer pessoalmente e que é autor de numerosos livros traduzidos entre nós, nasceu em Paris em 8 de Julho de 1821. Daqui a cerca de seis meses vai soprar cem velas…

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