Passaram-se vários decénios desde que escrevi, aqui no “De Rerum Natura”, o primeiro texto que fez de mim um desiludido sem esperança num ensino de excelência por ter sido tutelado na sombra por um sindicalismo com rosto político de esquerda que serviu, essencialmente, os desígnios pessoais de ascensão na carreira docente dos seus próceres.
Na minha idade e experiência de anos passados na docência de vários graus
de ensino, aposentado aos 70 anos de idade, já nada me devia desiludir Mas o que é certo é
que me desilude. Desilude-me que se possa ter ingressado
na universidade através das “Novas Oportunidades” (ou novos
oportunismos?) e, simultaneamente, se obrigue os jovens alunos a
fazer exigentes exames do 12.º ano (exames aliás da minha inteira
concordância). Desilude-me, ainda, que o sério “Exame AD-HOC” de
acesso ao ensino superior, para quem fosse um verdadeiro autodidacta (e não,
como escreveu o poeta brasileiro Mário Quintana, “um ignorante por
conta própria”) com exigentes provas, a nível nacional, de Português,
Cultura Geral e uma prova específica em função do curso superior de
candidatura, tenha sido substituído por uma "Prova de Acesso ao
Ensino Superior para maiores de 23 anos", a cargo dos próprios
cursos que precisam, como de pão para a boca, de angariar alunos para manterem
portas escancaradas que deviam estar, há muito tempo, fechadas a cadeado.
Prova essa crismada com a designação (por o nome de baptismo ser demasiado abreviado?) de “Provas especialmente destinadas a avaliar a capacidade para a frequência do ensino superior dos maiores de 23 anos” (Decreto-Lei n.º 64/2006, de 21 Março). Ufa!, receio bem que se fique mais cansado em pronunciar este majestático nome do que em cumprir as respectivas provas. Desilude-me, finalmente, haver pessoas que julguem poder endireitar a sombra torta de uma vara sem a tirar do sol de um descarado facilitismo. Mas que quer, meu caro leitor, acha que quem se tem batido contra todos estes atropelos, cometidos num ensino em que a mediocridade, pouco a pouco, e de forma insidiosa, se foi sobrepondo ao mérito, não tem motivos de sobra para comungar do desânimo do Poeta de “Orpheu”: “Já não me importo / Até com o que amo eu creio amar /Sou um navio que chegou a um porto / E cujo movimento é ali estar”.
Importemo-nos, portanto, para que o dia em que o prestígio do professor do ensino secundário seja recuperado. Aquele prestígio de que nos falou Clara Pinto Correia que, ao referir-se aos antigo professores do liceu, escreveu que “devíamos beijar-lhes as fímbrias do manto" (“O Render dos Heróis”, Diário de Notícias, 09.Julho.1995). Em nome de um prestígio perdido granjeado, por exemplo, pelo antigo Liceu Pedro Nunes de Lisboa por ter tido no seu corpo docente, entre outros, a figura muito respeitada do pedagogo Rómulo de Carvalho e ter diplomado gente de grande valor no domínio da vida científica, literária, artística, económica e social do país, não seria boa altura acabar com o nome de escola secundária devolvendo-lhe o nome de liceu proscrito em resquícios revolucionários? Ou terão sido, assim, tantos os maus serviços prestados pelo chamado liceu que justifique ter sido castigado com uma borracha que lhe apagou uma identidade secular? Ou, ainda, pior do que isso, matando dois coelhos de uma só cajadada cometendo idêntico e monstruoso agravo para com um ensino técnico industrial e comercial de muito prestígio pelos excelentes serviços prestados ao país e à sociedade portuguesa que se viu privada desses valiosos quadros técnicos.
Ora, quer se queira ou não, a tomada de medidas terapêuticas corajosas para a
educação passa, também, por um actividade docente com poderes de autoridade
sobre alunos indisciplinados que não se
compadeça com uma simples aspirina para acalmar uma sintomatologia dolorosa
deixando que as maleitas do sistema educativo prossigam o seu devastador
caminho. Enganam-se os seus detractores, de natureza sindical ou não, que, em
veredas de influências políticas ou em vielas esconsas de inconfessáveis
interesses pessoais ou institucionais, teimam em não ver que a criação de uma
Ordem dos Professores deixou de ser uma pequena bola de neve para se tornar
numa avalanche que nenhuma prepotência sindical em abuso de poder poderá deter
alegando desempenhar essas funções em acumulo de competências ao atropelo do
preceito da Roma Antiga, “ a César o que é de César”, nunca a César o que não é
de César.
Mas porque nada se resolve, segundo
a parábola de Marcos, com “remendo novo costurado em vestes velhas”, são
estas questões a merecerem uma resposta pronta e enérgica de quem de direito que
não deve ficar para a história por se acomodar aos erros do passado e do
presente, não dando aos vindouros um futuro sem ser erradicado em verdadeiros e
continuados crimes de uma educação nacional, em que se joga aos dados o destino
da própria sociedade portuguesa.
1 comentário:
O que escrevi neste texto e outros aqui por mim subscritos, quase diria premonitoriamente, ao que defende o professor Galopim de Carvalho, dá-me a certeza que embora em possível divergência de perspectivas políticas, há diversos pontos de contacto entre ambos porque um ensino de qualidade obedece a critérios sem ambiguidades nas suas finalidades rumo a um ensino de qualidade.Não podia deixar de registar um facto que muito me apraz dado estatuto deste docente universitário.
Enviar um comentário